No berço do Montijo surgiu o Indieota: um festival puramente alternativo projectado pelo Luís D’Alva Teixeira, um rapaz com a ideia de trazer e reunir as bandas que aprazem a um fiel nicho da população. De 9 a 11 de Setembro passaram pelo TimeOut Bar e pelo Bot’Abaixo bandas que representam o contexto underground do distrito de Lisboa e arredores. Desde bandas locais como Postcards from Wonderland até nomes mais sonantes como Pista; o festival animou-se ao longo de três dias.
Dia 9 começou com um anúncio agridoce: Mighty Sands não iriam tocar. Para os substituir? Cave Story que, já presentes como Eternal Champions, tiveram a graciosidade de actuar também sob o nome do projecto principal. As reacções foram mistas, mas o festival prosseguiu com optimismo.
As actuações de destaque do dia foram diversas. This Attic’s Home, o projecto solo de Alex Domingos, cantautor local, presenteou-nos com uma íntima (e ansiosa) demonstração de vulnerabilidade nas suas canções entoadas com um timbre “Dylanesco”. Outra surpresa agradável foi Odyssey Os Argonautas, outfit psicadélico lisboeta, que nos levaram numa jornada sensorial por uma versão possível do deserto da Arábia.
A jóia da coroa do primeirodo Indieota Festaval, no entanto, estava sem dúvida entre linhas de uma Cave Story. Os filhos das Caldas, meninos dos olhos do indie português, subiram ao palco: foi um deleite ver todos os rostos na sala do TimeOut iluminados com os seus quando se apresentaram como “banda de rock profissional”. O concerto começa descerimoniosamente com ‘Cleaner’; a audiência recita, de pulmões cheios e em coro, os versos cíclicos de ‘Richman’ e dança em êxtase ao som de ‘Southern Hype’. ‘Prime Time’, do novo EP ‘Garden Exit’ é uma nova favorita do público, que aplaude em antecipação ao ouvir as quatro notas iniciais. Apresentam uma faixa nova, sem revelar o título; uma música da repetitivadade característica do”quase-krautrock” da banda e que foi muito bem recebida. Falta o resto do álbum! Um precalço relacionado com crowdsurfing interrompe o concerto por momentos, mas depressa recomeçam com ‘Hair’, melancólica, de explosão emocional, pontuada por solos de guitarra esquizofrénicos e provocadores. O concertotermina ao som de ‘Fantasy Football’ e a banda despede-se tão depressa quanto chegou.
No segundo dia os repórteres ficaram na conversa fiada até ouvirem os sons de Morning Coffee pelo canto do ouvido. Este concerto transmitiu uma energia única, será pelo trompete, pela desorganização aparente dos instrumentos ou do peito do vocalista exposto, renegando a t-shirt? Não sabemos, mas foi um som bem elaborado. Por vezes escapavam para o seu registo mais melancólico, instrumental – abusando do trompete ou do baixo – não tiveram medo de se expor através da melodia.
Ditch Days começaram algo apreensivos. As poucas pessoas presentes pareciam pouco; talvez lhes tenha passado este pensamento na mente. No entanto logo que se puseram confortáveis tocaram o seu som. A guitarra complexa, emboramuito semelhante a outras bandas que por ali passaram. Mas no geral a música era catchy: atiravaos ouvintes à viagem lenta pelamelodia e agarrava-os de volta com os seus solos impressionantes. ‘Melbourne’ foi tocado perto do fim, puxando a sua veia do dream pop e atraindo a audiência para a sua música mais em voga. No fim uma voz do público ressoa “Toca lá mais uma, vocês são do caralho!”. Ditch Days acabam com uma bateria a la Green Day, seguida do seu piano característico, em conjunto com a guitarra a emitir um solo imundo que pontuou o concerto que roubaria o protagonismo do dia.
Grand sun, vindos de Alfragide, vieram animar outras bandas sem receio. António nos teclados mostrou-se à vontade para comunicar entre as músicas que tocava profusamente. Impressionaram pelo arranjo sonoro, os teclados que sempre estiverem fortes integraram-se com a bateria que muito capaz de seguir qualquer registo musical. Em ‘Lev Yashin’ e ‘Ludovic’ notaram-se mais as notas do baixo, lowkey noutras músicas. Tocaram ‘Timekeeper’ como sempre: um começo de piano e bateria que embriaga os ouvintes no seu ritmo. Segue-se o grito da guitarra que junta todos os instrumentos. Despedem-se do Montijo com um concerto que revela a sua evolução ao longo deste ano.
Quando chegámos ao terceiro dia já interiorizávamos o Indieota de forma diferente. Nem espaço, nem as bandas nem o festival no todo representava o mesmo. Nesse sentido o festival cresceu como uma ideia no fundo da mente o que é sempre positivo porque a personalidade de um festival é o que faz as pessoas voltar. Contudo, o Indieota teve os seus problemas. A falta de organização em horários, de atenção dada às bandas, ou o facto de não apelar a uma população indecisa com o seu passe geral de cinco euros.
Cada pequeno pormenor pesou; isso viu-se na pessoa para quem este festival representava o culminar de trabalho e sacrífico, o Luís Teixeira. O que retemos do festival não foram as coisas más que eram evidentes mas aquilo que o Indieota tornou possível e que não é realçado o suficiente: expressão. Ver uma banda como Postcards from Wonderland não é um deleite melódico mas ver três jovens a divertirem-se como nunca, dando a uma audiência uma janela parao seu mundo privado é aquilo que o Indieota representa. É por ver cervejas a serem pagas pelo público, por haver meia dúzia de almas na pista a dançarem com toda a sua vitalidade pela música que fomos ao Indieota e é daí que vem o afecto pelo festival.
Texto: Francisco de Azevedo & Francisco Carvalho