Autoria: Margarida Jardim (MEBiom)
Nos dias 11 a 16 de março realizou-se o Outsiders, um ciclo de cinema independente americano, no Cinema São Jorge. Esta 4ª edição organizada pela FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento) contou para filmes de todos os gostos e de diferentes registos cinematográficos.
Um filme é considerado independente ou indie quando é produzido, distribuído e exibido fora das estruturas dos grandes estúdios de Hollywood ou em oposição ao cinema comercial convencional [1]. Com 12 filmes em exibição, inéditos em Portugal, o cinema independente retira-nos das nossas vidas durante umas horas e obriga-nos a viver outras. Novas vidas com novas questões sociais, vidas que nos tiram da nossa zona de conforto, e esse é exatamente o tema deste ciclo, que teve a curadoria de Carlos Nogueira: “a alteridade, o outro.”
A alteridade e “o outro” é um tema muito abrangente e bastante expresso em diversas explorações artísticas. Desde o início dos estudos antropológicos que há registo do receio do outro [2], seja esta divergência física, cultural, social, … Temos “outros” em relação às nossas fronteiras que causam estranheza, rejeição e guerras. Existem pessoas de “outras” cores de pele e “outras” orientações sexuais. Mas existem também “outros” mais próximos, que nos causam distância por incompreensão da nossa parte, por exemplo dentro do seio familiar, ou o preconceito com “outras” idades, que nos fazem distanciar deste “outro”. Apesar desta alteridade ter estado sempre presente na nossa história enquanto humanos, parece ser uma tendência na última década e especialmente (apesar de não exclusivamente) nos EUA a polarização de posições e proliferação de temas fraturantes, como foi dito por Carlos Nogueira: “Sem querer transformar uma pequena e despretensiosa mostra de filmes numa tese académica ou descurar o seu carácter lúdico, pareceu-nos que a questão do «outro», ou se quisermos, a alteridade, seria uma das chaves da crispação que tem alastrado a todos os setores da sociedade americana. (…) Os doze filmes incluídos no programa deste ano levantam mais questões do que as respostas que dão, mas permitem, estamos certos, enriquecer o olhar sobre os vários “outros” que preocupam a sociedade americana de hoje ”
Este ano, esteve presente o cineasta, professor e programador Paul Harril, no contexto de masterclass com o título “Notes on Regional Filmmaking”. Residente no Tennessee, Harril tem vindo a dedicar a sua atividade como docente, curador e idealizador à rica tradição do cinema regional nos Estados Unidos, com recurso a pequenas equipas e sobre pessoas “normais” não representadas por filmes de Hollywood.
Uma vantagem deste tipo de ciclos é poder ter uma relação de maior proximidade e entendimento dos filmes. Por exemplo, antes do início do filme Ghostlight foi dada uma breve contextualização com explicação da significado da palavra Ghostlight: luz de presença; luz colocada no palco para evitar que o teatro fique em escuridão total depois de todos irem embora; luz para iluminar os “fantasmas do teatro” [3]. Isto permitiu ao público aguçar a sua curiosidade acerca do filme antes do começo deste e analisá-lo entre amigos no final. Adicionalmente, e para surpresa dos espectadores, foi também apresentado um vídeo gravado pelos realizadores Kelly O’Sullivan, Alex Thompson e o seu filho bebé (que até se despediu no final do vídeo), a dizer quão entusiasmados estavam por poder apresentar o filme em Portugal e quão tristes estavam por não estarem presentes. Outra vantagem é o preço, sendo quase metade do que um bilhete comprado num cinema comercial, um bilhete estudante é 4€ e sem desconto 4,5€.
Na Cerimónia de Encerramento foram feitos três agradecimentos: primeiro ao público, que foi descrito como tendo dado um salto numérico quantitativo relativamente à edição passada; em segundo ao cinema São Jorge e toda a sua equipa que tornou as projeções possíveis; e por último à FLAD. Esta instituição tem vindo a acarinhar o ciclo pois as suas visões alinham-se. Como foi dito por Nuno Pinheiro Torres, membro do Conselho Executivo da FLAD: “Com o Outsiders, a FLAD continua a ter como missão dar a conhecer ao público em Portugal alguma da produção cinematográfica norte-americana contemporânea menos conhecida. Este ciclo de cinema integra um conjunto de iniciativas de promoção da arte e cultura entre os dois lados do Atlântico que a FLAD desenvolve ou apoia há 40 anos.”
Por último, foi feito o anúncio que o Outsider 2026 está confirmado e vem aí, por isso se gostam de cinema, e se tiverem 5€ para gastar (se o preço for igual a este ano), lá vos esperam no próximo ano!
[1]-https://researchguides.dartmouth.edu/filmgenres/independents
[2]- https://nautil.us/why-your-brain-hates-other-people-236659/
[3]- https://wp.behindthescenescharity.org/what-is-a-ghostlight/