Autoria: António Luciano (MEMec)
Eis a devassa por uma ideia,
Que se apresenta esparsa,
Arrebata à medida que enlaça,
Incita a escrever uma epopeia
Decerto que uma falha no decorum é coisa feia,
No crime e pecado de enlevar pela piada,
E acabar a olhar um espelho à gargalhada,
A perguntar “Porquê tão sério?”
Ainda que a resposta não seja mistério,
Tampouco paradoxo desconexo,
Quando o espaço e tempo são apenas aproximações
Termos vãos, vãs definições,
De algo muito mais complexo,
Haja gosto pela incerteza,
Oferecendo um sorriso ao que se sorteia,
Pois a índole dessa epopeia,
Não se desenha com clareza.
Talvez venha numa onda entrançada na areia
Em rajadas de bege e azul-turquesa,
Redemoinhando uma floral espuma,
Parecendo rosas brancas em pluma,
Numa dança que silva e serpenteia,
São os traços de arminho desta paleta,
Fios de alvor que fazem suma,
Com uma insígnia alada gris,
Num voo rapino de cometa,
O pequeno açor voa feliz,
Sob o céu outrora azul, agora violeta,
E sente-se nos lábios o sabor a sal e a canela,
Sente-se no ar o odor a lilás e a groselha,
Por entre um pôr do sol que se avermelha,
Fica a recordação dos tons que compuseram esta tela,
E talvez essa epopeia pudesse ser uma aguarela.
Sinto-me sujo de luz à sombra da candeia,
Porque não percebo como se traduzem as pistas desta ideia,
Assento a acentuar o que cada traço induz,
Um novo arquétipo,
Uma nova geometria,
Uma nova estética,
Sem razão, com fantasia proponho-me a não ser cético
Para com essa quimera, ainda que hipotética,
Enleada de melodia, à ilusão ritmada,
A sentir a batida a cada repercussão,
Do reverberar das cordas da guitarra,
Que canta canora sob tensão,
Impelindo-me a evocar,
Aquilo que em falsete se conjura,
E talvez dessa epopeia se fizesse uma partitura,
É a procura por uma continuidade,
Além da escuridão que a noite do sexto dia tinha,
Cantando em étimos da saudade
Por nenhum dia sem uma linha.
Porém em verdade,
Ainda não percebi qual é a ideia,
Mas juro que quando perceber,
Hei de escrever essa epopeia.