Autoria: João Carriço (LEQ)
A candidatura ao ensino superior raramente é fácil: é expectável que surjam diversas incertezas por parte dos estudantes, muitos chegando a concluir o ensino secundário na carência de uma ideia concisa do que desejam vir a estudar. Para um número considerável de alunos, o primeiro ano pode vir a servir como um test-drive para descobrirem se tomaram, ou não, a decisão certa. Ao fim deste, alguns optam por se (re)candidatar ao ensino superior, desta vez num curso ou instituição diferente. Este artigo visa, contudo, analisar a mudança de curso dentro do Instituto Superior Técnico (IST).
Mudança de Par Instituição/Curso
A Mudança de Par Instituição/Curso é uma modalidade de mudança de instituição de ensino superior ou de curso frequentados, disponível para alunos já ingressados no ensino superior.
Este processo possui algumas semelhanças e diferenças relativamente ao Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior (CNAES). De um ponto de vista mais superficial, estas duas modalidades de ingresso em pouco diferem: os candidatos são selecionados com base numa nota de candidatura, de entre um número limitado de candidatos consoante as vagas para o curso selecionado. Contudo, o número de vagas, e também o número de candidatos, é consideravelmente inferior aos valores do CNAES.
A nota de candidatura também é calculada de modo diferente: ao invés de apenas contemplar as classificações obtidas ao longo do ensino secundário e nas provas de ingresso, são também tidas em conta as classificações obtidas ao longo do seu percurso no ensino superior. No caso dos cursos do Técnico, a nota de candidatura resulta de um média ponderada entre a média interna do ensino secundário (20%), a média das classificações obtidas nas provas de ingresso (30%) e a média do aluno no curso frequentado no ensino superior (40%).
Em oposição ao ingresso pelo CNAES, nesta modalidade a candidatura implica o pagamento de uma taxa de entrada de 100€ (não incluída na propina), à exceção de alunos e ex-alunos da ULisboa, para os quais apenas são necessários 50€, no caso do Técnico. [1]
As classificações dos últimos colocados por esta via são também substancialmente inferiores às verificadas nos colocados pelo CNAES: por exemplo, no caso de Aeroespacial (LEAer), um curso notório pelas notas dos colocados serem globalmente elevadas, as médias dos últimos colocados por mudança de instituição/curso em 2023 e 2024 rondaram os 170 pontos. [2]
Fluxo de alunos entre cursos dentro do Técnico
Deve ser expectável que a saída e o reingresso sejam díspares para os diferentes cursos. Os gráficos seguintes, elaborados com base em valores feitos públicos pelo Ministério da Educação [3], permitem uma análise dos fluxos entre cursos no IST.
Conforme se ilustra, a desistência afeta de modo bastante desigual os vários cursos de 1º ciclo. No caso de Física Tecnológica (LEFT), ao longo de dois anos letivos consecutivos, não se registou qualquer mudança de curso dentro do IST por parte dos alunos ingressados no 1º ano, enquanto que em Ambiente (LEAmb) 27,3% dos alunos viram-se inscritos noutro curso um ano após terem ingressado nele. Embora este último seja um extremo, não é o único curso onde se verifica uma elevada desistência: Materiais (LEMat), Naval (LEAN) e Minas (LEGM) apresentam também valores elevados, ao passo que em cursos como Arquitetura (MA), LEAer e Engenharia e Gestão Industrial (LEGI), muito poucos alunos trocaram de curso no IST.
Contudo, estes valores apenas indicam quais são os cursos com maior e menor aderência pelos alunos neles ingressados pela primeira vez. É também importante observar as taxas de reingresso nos mesmos.
De modo análogo, o reingresso em diferentes cursos não é, de modo algum, monótono. Neste caso dominam os cursos de LEFT, Mecânica (LEMec) e Informática na Alameda (LEIC-A), enquanto que Civil (LEC) e Eletrónica (LEE) apresentam taxas bastante baixas e o curso de LEGM não apresenta, de todo, ingresso por mudança de instituição/curso.
Conquanto a coerência entre os dados não seja totalmente conclusiva, uma vez que os dados relativos à mudança de instituição/curso não se cingem a alunos do IST, a comparação entre ambos permite alcançar conclusões interessantes.
Em primeiro lugar, alguns dos cursos que revelam menores taxas de desistência são também cursos onde o ingresso por mudança de instituição/curso é elevado. Tomando o caso de LEFT e LEMec, cursos com taxas de desistência muito reduzidas, são estes que dominam no reingresso por mudança de instituição/curso. Curiosamente, estes cursos apresentam também números bastante elevados de vagas (acima de 150), e uma parte considerável (no caso de LEFT, acima dos 80%) dos alunos ingressaram pela 1ª opção do CNAES, o que reflete a sua alta procura por parte dos alunos[4]. Já no caso de LEMec, nos últimos dois anos os números de candidaturas por esta via foram anómalos no sentido em que ultrapassaram os 25, em comparação aos restantes cursos, onde o número de candidaturas raramente atinge 10 (excetuando LEIC-A e LEIC-T que mantêm também valores elevados). [2]
O contrário não é necessariamente verdadeiro. O curso de LEGM, um dos líderes na taxa de desistência, não apresentou, ao longo de dois anos letivos, qualquer ingresso por mudança de instituição/curso. No entanto, LEAN e LEAmb, outros dois líderes na desistência, ainda mantêm uma posição mediana quanto ao ingresso por mudança de instituição/curso.
Ainda assim, o número de ingressos por mudança de instituição/curso é influenciado ainda por outro fator: o número de vagas para esta modalidade, conforme mencionado anteriormente. O número de vagas é não só uma pequena fração do número total de vagas, como é também desigual ao longo dos diversos cursos do IST, representando entre 2%, como é o caso de LEAer, e 12%, como em LEAN, das vagas totais de cada curso. As possibilidades para quem está disposto a ingressar por via desta modalidade estão, portanto, bastante condicionadas aos valores estipulados para cada curso, limitando bastante a taxa de ingresso desta forma.
Evolução ao longo do tempo
Ainda que a adesão à mudança de par instituição/curso tenha sido reduzida nos últimos dois anos, esta realidade é recente. Em 2020 e 2021, as vagas estipuladas para esta modalidade apresentavam valores evidentemente superiores aos atuais na maioria dos cursos, chegando, em alguns casos, a ultrapassar os 40. Contudo, estas vagas não eram, frequentemente, preenchidas na sua íntegra, o que pode ter conduzido à sua redução.
Por outro lado, o número de candidaturas tem também vindo a diminuir. Enquanto que nos últimos dois anos estas são quase integralmente inferiores a 10, o oposto verificava-se em 2021 e 2022: na maioria dos cursos rondavam as 10 e chegaram a atingir um máximo de 65. O declínio da adesão não se deve, portanto, inteiramente a menores números de vagas, pois não o número de candidaturas acompanhou a mesma tendência. [2]
Fontes:
[1] Ténico Lisboa – Mudança de Par Instituição/Curso: https://tecnico.ulisboa.pt/pt/ensino/estudar-no-tecnico/concursos-de-acesso/mudanca-de-par-instituicao-curso/
[2] NEP – Núcleo de Estatística e Prospectiva do IST
[3] Ministério da Educação- Infocursos: https://infocursos.medu.pt/
[4] Direção Geral do Ensino Superior – Guia de Cursos: https://www.dges.gov.pt/guias/