Autoria: André Santos (MEEC)
João é um aluno do segundo ano de LEIC que passa os seus dias a estudar e a trabalhar no IST. Um dia, as distrações do telemóvel tornam-se demasiado insuportáveis para este aluno aplicado.
Imaginemos um ambiente de sala de estudo. Um aluno – chamar-lhe-emos João – não consegue resolver uma penosa equação diferencial e, como o astuto aluno de engenharia que é, decide utilizar uma aplicação que tem no seu telemóvel que resolve a equação e mostra os passos necessários (um verdadeiro salva-vidas). Contudo, ao pegar no telemóvel, João vê que o seu amigo Sebastião (de todos os seus amigos, este é o que tem o melhor sentido de humor) lhe enviou um novo e hilariante meme. Sendo esta uma excelente oportunidade para ver o que há de mais engraçado, o nosso aluno toca na notificação para ver o que recebeu. É, de facto, hilariante. Tão hilariante que a vontade de ver mais memes consome a vontade de resolver a equação, que, entretanto, ficou esquecida. João olha para o relógio. São 17:56 e esqueceu-se de almoçar, mas o seu conhecimento sobre teorias de conspiração está maior do que nunca.
João levanta-se repentinamente da cadeira e fecha o punho direito, apertando a caneta que não tinha largado durante as últimas seis horas. Outros alunos presentes na sala de estudo relatam ter ouvido “Maldito parkour do Minecraft…” antes de João arrumar as suas coisas e se dirigir para o barbeiro, onde tinha uma marcação para as 15:00.
Ao chegar a casa, com a cabeça fresca e o cabelo igualmente comprido, João sente-se determinado a encontrar uma solução. Não para a equação diferencial, mas sim para as distrações provocadas pelo abominável “parkour do Minecraft”. Após uma sessão de 45 minutos de TikTok para limpar a mente, João decide desinstalar todas as aplicações problemáticas do seu telemóvel. Restou apenas apenas o YouTube, já que, de acordo com João, “é impossível comer sem ver YouTube”.
No dia seguinte, de volta à faculdade, João passa a sua tarde a ver um vídeo de três horas sobre um filme obscuro de Adam Sandler que começou durante a sua hora de almoço. Esta sessão foi apenas interrompida por uma chamada do barbeiro a informar que após faltar a uma segunda marcação nesse mesmo dia, João está proibido por lei de cortar o cabelo.
Ao regressar a casa, João decide que tomará medidas extremas: vai vender o seu smartphone e comprar um telemóvel “de teclas”. Acabaram-se os memes, os vídeos de longa duração, acabou-se o Sebastião. Após a chegada do seu novo telemóvel, João voltará à idade da pedra.
Ao longo das semanas seguintes, a vida do nosso protagonista mudou consideravelmente. Após lutar contra a difícil equação diferencial durante vários dias, João chegou a uma solução sem recurso à tecnologia. Esta conquista tornou João arrogante: os seus colegas (inferiores) não conseguiam resolver equações sem o telemóvel, já que não tinham o intelecto de João (superior). “Antigamente é que era!”, diz João aos seus colegas, que trocam olhares preocupados. Pouco a pouco, João troca as sweatshirts por polos, os brincos por um forte bigode, rapa o seu forte cabelo para fingir calvície e, para finalizar a sua transformação, adquire um Walkman.
A preocupação entre os amigos de João chega a um limite quando este vai para o exame de Cálculo III equipado com um ábaco e uma caneta de tinta permanente. Decidem então fazer uma intervenção. De modo a não criar suspeitas da parte de João, decidem apenas convidá-lo para beber uma cerveja. João aceita, mas define como hora limite as 21:30.
Ao chegar ao bar, João pendura o seu pesado casaco de pele e dirige-se para a mesa dos amigos, sentados com cara séria. João senta-se e, com sede de uma cerveja, chama o empregado. É neste momento que a tragédia o golpeia: a caixa registadora está estragada e o bar não aceita dinheiro. Evidentemente, João tinha levantado todo o seu dinheiro para colocar dentro do colchão, destruindo de seguida todos os seus cartões bancários. Torna-se então visível o pânico de uma alma velha quando as coisas não acontecem como era esperado. Os amigos de João dizem “Eu pago e envias-me por MBWay”, palavras que João ouve apenas em eco, mas que certamente o irritariam se estivesse atento. Em quem é que ele se tinha tornado, incapaz de pagar uma cerveja? Por baixo do couro cabeludo rapado encontrava-se um cérebro com saudades de apodrecer e da relação ódio-amor com “parkour de Minecraft”. De que serve tirar 18 a Cálculo III com um ábaco se nem pode beber uma cerveja com os amigos para comemorar? Já para não falar das inúmeras coisas que podia ter encomendado diretamente de países com mão de obra barata por preços ridiculamente baixos. João vira então costas aos amigos e sai do bar, com lágrimas nos olhos, determinado desta vez a encontrar um meio-termo.