Autoria: Ângela Rodrigues (LEFT)
No dia 10 de maio, os fetos do hardcore punk Knocked Loose lançaram o seu terceiro álbum, “You Won’t Go Before You’re Supposed To”, gravado pela Pure Noise Records (barulho, o costume, já percebemos) e produzido por Drew Fulk.
Para os sortudos que nunca ouviram Knocked Loose, como é que eu explicaria o que é este grupo musical? Se o Mickey Mouse se fartasse da exploração da Disney, assumisse uma forma humana e decidisse formar uma banda, da qual é vocalista, para libertar as suas frustrações, teria criado os Knocked Loose. Está bem, talvez esta redação não seja a mais aconselhável, tendo em conta a sua falta de conhecimentos relativamente aos álbuns e EPs anteriores, e que precisei de várias tentativas, para conseguir ouvir “Deep In The Willow”, a música que os atirou para a ribalta, do princípio ao fim. Peço desculpa aos fãs, mas isto é agressivo para os ouvidos, do género, unhas a riscar um quadro de giz.
De qualquer modo, decidi dar uma oportunidade a Knocked Loose, escutei este álbum e agora tenho umas coisas a dizer. Esta é aquela crítica caótica sobre uma banda que eu nem gosto assim muito.
As duas primeiras faixas, “Thirst” e “Piece By Piece”, são quase indissociáveis; das primeiras vezes que ouvi este álbum, só reparei que já estava na terceira música porque já conhecia “Suffocate”.
Há uma construção instrumental que funciona e é mantida como um fio condutor ao longo do álbum, não há transições bruscas entre músicas (fazer transições entre berros iguais não é difícil também), tudo encaixa para formar o puzzle que é “You Won’t Go Before You’re Supposed To”. (Aqui até quase parece que sei o que estou a dizer, ler a Kerrang! está a dar frutos). A conjugação destas faixas culmina numa sensação de fuga, como se estivéssemos a ser perseguidos, que é transmitida ao ouvinte tanto através de versos como “Searching for comfort/ That I can never attain” ou “Can’t hide from the truth”, como pelo instrumental que parece ativar o nosso sistema simpático.
Segue-se “Suffocate”. A colaboração com a norte-americana Poppy, que, este ano, tem dado cartas no mundo do metal (ela gosta de cartas em geral, de Pokémon em particular*), parece apresentar algumas diferenças face às duas faixas anteriores, na medida em que parece haver uma transição de “perseguido” para “perseguidor”. Além disso, temos aquele momento inesperado de reggaeton que soa mais ou menos assim: grito da Poppy – “SUFFOCATE”- seguindo-se um “Tum, turum tum tum, turum tum tum, turum tum tum tum”, até ser interrompido por um grito do nosso esganiçado do Kentucky (chama-se Bryan Garris já agora).
“Don’t reach for me” e “Moss Covers All” formam outra parelha indissociável, em que esta fuga parece começar a ganhar um sentido mais sombrio, havendo referências a divindades e necessidade de fé, que talvez possam estar associadas de algum modo à cruz luminosa da capa do álbum. É também neste momento que a composição instrumental é ligeiramente alterada, passando a introduzir alguns elementos que remetem a Slipknot e Gojira (são assim mais underground, provavelmente não conhecem, isto é só para os mais edgy).
E por falar em Gojira, “Take me home” pediu inspiração à “Art of Dying” dos franceses, sendo depois remisturada pelos também já referidos Slipknot. Espero que tenham pago os devidos direitos de autor, se bem que, se eu fosse membro dessas bandas, preferia não ser associada ao bando de palhacinhos do Kentucky. Porquê palhacinhos? Basta ouvir os últimos segundos da música para percebermos que passamos para um cenário de circo.
É neste cenário de circo que chegam os mimos góticos dos Motionless In White para a sequela de “Slaughterhouse” que, como a criatividade era pouca, decidem chamar à segunda colaboração “Slaughterhouse 2”. Mais do mesmo, não é? Uns gritos para aqui, uns esganiçados para ali, e uma faixa que vem comprovar que raramente as sequelas são melhores que as originais.
Estamos nas últimas três faixas e lá voltamos às influências de Slipknot, apesar de parecer que entrámos num local de culto cujo mantra é “(It’s) The calm that keeps you awake”. Talvez fosse este o destino da fuga…
Agora que chegámos ao destino, “Blinding Faith” carrega o peso de uma vida levada em torno de uma crença que deixou de fazer sentido para quem estava a fugir, “A life consumed by faith/ From inside I can hear their call/ Offering the blood of God”. Num ato de rebeldia, que culmina com o breakdown, “I deny the church”, a vida deixa de ser comandada pela fé/igreja (“The word becomes the law”). “Sit & Mourn” é a aceitação desta nova realidade, “Finding my own time to sit and mourn”, em que o fugitivo se questiona se valerá a pena viver quando a realidade que conhecemos é destruída: “Brought back by a voice unknown/ You won’t go before you’re supposed to”. (Eu tentei falar mal sobre estas últimas músicas, fazer piadas com os espíritos e rituais referidos nas letras, mas não consegui. Tal como referem no último verso do álbum, “I feel like I’ve failed”, também eu admito que falhei. )
Bem, isto até foi bom.
PS: Mais uma vez, deixo também outro álbum digno de audição: Like Moths To Flames – The Cycles Of Trying To Cope (ouvi “Over the Garden Wall” demasiadas vezes).
* Fonte: Vozes