Autoria: Pedro Sousa (Medicina, FMUL)
O Grupo de Teatro do IST (GTIST) conta com uma longa, aclamada e atribulada história. No dia do último ensaio geral antes da estreia da antecipada peça “Bagatela em Lá Menor”, o Diferencial reuniu-se com alguns membros do grupo para conversar um pouco sobre o coletivo, o teatro e o que o futuro lhes reserva.
Não foi preciso muito tempo à conversa com Adriano Mendes, Francisca Gaspar Vieira e Inês Gomes da Silva para perceber que a história do GTIST e a do Técnico andaram sempre de mão dada, mas que este “nem sempre foi um casamento muito amistoso”, como revelou Adriano, membro do GTIST há 10 anos.
Inês começou por contar ao Diferencial que “o primeiro registo que temos [do GTIST]é do ano letivo de 59-60”, com a primeira edição do Curso de Expressão Dramática (CED), formação obrigatória para todos os membros do Grupo. Confessou-nos também que os primórdios do GTIST estão um pouco perdidos nas areias do tempo, até porque o Grupo foi “proibido em ’71 pelo Regime e depois só voltou em ’92”. No entanto, nem assim o Grupo desapareceu, mantendo-se ativo na clandestinidade: “Do que nós sabemos, parece que era muito uma coisa contra o poder, daí também o desejo de extinguir o Grupo”. Inês revelou que a sala do GTIST era “uma antiga tipografia ilegal”, onde se imprimiam folhetos e livros censurados. Nas palavras dela: “Nós éramos malucos!”. Esta contou ainda ao Diferencial que “a peça que acabou com o GTIST, na altura, foi a “Ir ou Não Ir”, porque se achava que era sobre a questão da guerra colonial. Também já tinha sido encenada a peça “O Racismo Não Existe”, que tinha sido uma crítica ao colonialismo”. Adriano terminou a retrospetiva histórica salientando a vertente reivindicativa antissistema do Grupo da altura, e referindo que os membros atuais sentem “um bocadinho essa responsabilidade”.
Passando à atualidade do GTIST, é notório o sentimento de orgulho e dedicação dos membros. Parte dessa dedicação, segundo Francisca, atribui-se ao facto de todos os membros e atores completarem o CED, uma jornada totalmente organizada pelo Grupo, que se prolonga durante 1 ano inteiro, com a ajuda de vários formadores da área, e que culmina sempre na apresentação de um espetáculo no final de março ou em abril. Francisca acrescentou ainda que o CED “prepara [os formandos] um bocado para o estilo do GTIST. Por exemplo, se alguma pessoa vier fazer o curso a pensar num teatro mais clássico, percebe que se calhar este não é o grupo ideal”. Quando questionada se o CED poderia ser uma barreira de entrada ao GTIST, Inês revela acreditar no oposto, mencionando que “normalmente o feedback que temos tido é que as pessoas, como nunca fizeram teatro, à partida nunca fariam uma audição para um grupo de teatro. Sendo um curso aberto, parece-me que as pessoas se arriscam mais e forma uma alavanca de entrada mais suave”. Em relação a este tópico, Inês aponta também que “tudo é assim [no mundo do] espetáculo, tens as audições, que às vezes me parece um bocado mais injusto…”, e termina dizendo que “todas as coisas têm os seus prós e contras”.
Em relação às dificuldades atuais do GTIST, Inês destaca a falta de financiamento e cortes orçamentais sentidos ao longo dos anos. A escassez de apoios por parte da Universidade de Lisboa, da AEIST e de outras instituições como a Fundação Calouste Gulbenkian, segundo Francisca, “diminuiu muito a nossa atividade”. Sobre este tema, Adriano revelou que, quando entrou no Grupo, podia anualmente “contar praticamente com 6 mil euros”, mas que isso desapareceu: “agora é mais difícil de gerir”. Inês salientou, no entanto, que “as coisas agora têm estado mais tranquilas, porque no ano passado ganhámos dois prémios monetários”, mas sublinhou que “não podemos contar que todos os anos vamos ganhar”.
Perante questões sobre o futuro, sentiu-se um otimismo cauteloso por parte dos membros, marcado por um sentimento de fragilidade em relação ao Grupo. Adriano começou por descrever o GTIST como “uma pedra preciosa, rara, que é preciso cuidar”, acrescentando rapidamente que “num instante isto se pode evaporar”. De seguida, revelou ao Diferencial que “há sempre uns conflitozinhos” entre o GTIST e a AEIST, e que “nuns anos foi mais grave que outros”. Quando questionado em relação à maior ameaça à sobrevivência do GTIST, Adriano respondeu: “Acho que ficar sem um espaço”, e acrescentou que “há sempre essa tentativa, ao longo dos anos, [da AEIST] nos tirar a sala, por várias vezes, para usá-la como arrecadação. Isso, obviamente, faz com que, por exemplo, outros grupos desapareçam porque não têm espaço para ensaiar”.
Em suma, desde os tempos clandestinos até os prémios atuais e um futuro empolgante, mas incerto, uma coisa é certa: há um enorme carinho dentro do Grupo, que contagia atores e plateia.