Autoria: Filipa Rio (MEEC), Sofia Calado (MEEC)
O Diferencial entrevistou o Rúben Almeida, aluno do Mestrado de Engenharia de Minas e Recursos Energéticos (MEMRE), acerca da sua participação na 7ª edição do concurso televisivo do Masterchef Portugal. Como foi a experiência de um aluno do Instituto Superior Técnico (IST) num dos programas de cozinha mais populares da televisão portuguesa?
Rúben Almeida tem 24 anos e é de Santo Estevão, em Benavente, tendo-se mudado para Lisboa, aquando da sua entrada no curso de MEME, no ano letivo de 2017/2018. Enquanto estudante deslocado que reside numa república na capital, ganhou o hábito de começar a cozinhar, começando a desenvolver uma paixão pela comida, o que o fez querer participar no programa Masterchef Portugal, cujo primeiro episódio estreou no dia 18 de novembro de 2023.
Na entrevista com Rúben, ficámos a saber mais sobre a sua jornada, enquanto um dos 16 concorrentes do Masterchef, assim como das suas experiências no mundo da culinária e as motivações que o levaram a cozinhar. Rúben participou também no workshop “Cozinha para Universitários” organizado pelo Núcleo de Apoio ao Estudante (NAPE), realizado no dia 21 de fevereiro. De seguida, apresentamos a conversa com o concorrente:
Questão: Houve algo que despertou o teu interesse inicial na cozinha?
Resposta: Eu sempre gostei de cozinha. Em casa, os meus pais tinham preferência por serem eles a cozinhar, então acabava por não o fazer muito quando era mais novo, mas via muitos programas de cozinha. Também ajudava a minha avó, principalmente no Natal, a fazer as sobremesas, pataniscas, pastéis de bacalhau e pratos tradicionais. Sempre gostei de fazer esse trabalho com ela. Quando vim para o Técnico é que comecei mesmo a cozinhar e percebi que gosto bastante disto […] e, como vivo numa república, acabo sempre por ter mais pessoas para quem cozinhar, então fui desenvolvendo esse gosto e começaram a dizer-me que tinha jeito.
Questão: Como dividem as tarefas de cozinha na república?
Resposta: Em cada semana do semestre, organizamos uma pessoa da república a fazer o menu e a cozinhar, […] mas sempre que há algum evento maior, por exemplo, o Natal ou a passagem de ano, sou sempre eu a cozinhar para cerca de 20 a 30 pessoas.
Questão: O que achas da experiência de cozinhar para muitas pessoas?
Resposta: Adoro, mas ao início é difícil, principalmente em termos de doses […] acho que toda a gente tem um perfil do que gosta e do que não gosta de comer, e eu também tenho um gosto muito específico, então quando estou a cozinhar para as outras pessoas, acabo por adaptar um bocadinho a minha cozinha para as preferências da maioria. Cozinhar para muitas pessoas naquela casa, deu para perceber que, mesmo não estando a cozinhar a 100% para mim, acabo por transmitir esse gosto às pessoas.
Questão: Que dicas é que tens para pessoas que não gostam muito de cozinhar, mas que acabam por ser obrigadas enquanto estudantes deslocadas?
Resposta: Atualmente, é muito fácil ir a um supermercado e comprar tudo pré-feito, mas nota-se completamente a diferença, quando se faz em casa. As melhores dicas que eu posso dar são uma base de ingredientes sempre em casa, por exemplo, limão, especiarias, molho de soja, de natas […] uma das maiores dicas que eu dou é investir em bons ingredientes.
Questão: Quais são os pratos que mais gostas de cozinhar?
Resposta: Eu adoro cozinha italiana, é o que eu mais faço e o que eu mais gosto de cozinhar. Faço massa fresca praticamente todos os dias, fiz ontem e vou fazer amanhã […] adoro carbonara, é mesmo o prato que está em primeiro lugar para mim. Também gosto muito de comida oriental […] tudo o que envolva massa, guiozas, noodles, ramen.
Questão: O que te fez querer candidatar ao Masterchef?
Resposta: Tenho de começar a história há 2 anos, porque a minha ex-namorada disse-me que me ia candidatar ao Masterchef, e eu sabia que se me candidatasse eu tinha mais probabilidades de entrar porque há um vídeo de inscrição que se pode anexar à candidatura […] então acabei por escolher enviar um vídeo meu a cozinhar e fui chamado para o pré-casting, mas não passei e fiquei de costas voltadas para o programa, […] mas no ano passado fui a Itália e isso reviveu-me o gosto pela cozinha e pensei em tentar outra vez entrar no programa. […] Inscrevi-me e correu bem, fiz todas as fases, desde o pré-casting, casting e top 50, até finalmente ser um dos 16 concorrentes do Masterchef.
Questão: Como funcionam as várias fases antes de entrar no programa?
Resposta: Em junho de 2023, foi a fase inicial de inscrição, onde preenchi um formulário online e enviei um vídeo a cozinhar. Passei à fase do pré-casting que é presencial e fui a um centro de formação na Pontinha, […] apresentei um prato que já vai confecionado e eles fazem questões durante cerca de 15 minutos. A diferença entre 2023 e 2022 é que me chamaram para uma sala à parte e gravaram uma entrevista de 40 minutos comigo […] e depois recebi um mail a dizer que passei à fase seguinte do casting, onde fui a um armazém em Alcântara cozinhar durante 45 minutos um prato, eles provaram, fizeram-me perguntas e tiraram-me uma fotografia para o meu perfil. A meio de agosto, recebi um mail a dizer que estava no top 50 e que tinha de preparar 3 pratos […] e esta fase é o que aparece no primeiro episódio do programa.
Questão: Como foi a sensação de seres o primeiro selecionado do top 50?
Resposta: Não estava mesmo nada à espera! Os três júris estavam a distribuir as colheres aos concorrentes que tinham passado e eu não recebi uma colher e fiquei a pensar logo que fui eliminado de novo. Entretanto, a chefe Noélia deu-me o avental e passei diretamente ao top 16, […] eu levei uma grande claque e fui invadido pelas pessoas que foram lá apoiar-me, foi espetacular e uma confirmação do que eu estava lá a fazer.
Questão: Durante quanto tempo vivem na casa do programa e como era o ambiente?
Resposta: Este ano, não criaram a obrigatoriedade de viver na casa do programa, mas nos anos anteriores era obrigatório […] porque facilita transportes tanto para o estúdio das gravações como para outras cidades onde tivemos desafios. Tivemos uma semana e meia de formação e quem quisesse podia logo começar a viver na casa e podíamos utilizá-la como se fosse nossa casa. Basicamente, tínhamos de cozinhar para nós todos: cada um cozinhava o que gostava, a Bruna cozinhava o vegetariano, a Célia cozinhava pratos mais caseiros, o Domingues ajudava com pastelaria, eu cheguei a fazer massa fresca […] e acabava sempre por ser um trabalho de equipa, aprendemos muito uns com os outros, especialmente com essa convivência. Na casa, percebi que existem muitas maneiras de ver a cozinha e acho que foi a maior aprendizagem. O ambiente foi muito bom para mim.
Questão: Como é que conciliaste o Masterchef com a faculdade?
Resposta: A gravação do primeiro episódio foi no início de setembro, depois entrámos na casa na altura da formação e começámos as gravações dos restantes episódios entre setembro e outubro. Tive de congelar a matrícula no 1º semestre […] agora o Técnico dá para fazer meia propina e não sabia como ia ser a minha vida se eventualmente ganhasse porque teria de fazer uma formação fora e, se não ganhasse, inscrevia-me no 2º semestre, que foi o que aconteceu.
Questão: Gostavas de voltar a participar noutra edição do Masterchef?
Resposta: Adorava! Infelizmente, eles têm uma política de não recorrerem a antigos concorrentes. No entanto, como já há muitas temporadas do programa em Portugal, se calhar à semelhança do Masterchef Austrália fazem uma edição de antigos concorrentes, mas isto sou eu a sonhar. Adorava voltar, porque é uma cozinha com tudo disponível para ti, tanto no tipo de ingredientes como nos desafios de criatividade […] eu gostei mesmo muito de cozinhar lá e adorava voltar.
Questão: Consideras a cozinha um hobbie ou queres ter uma carreira na área?
Resposta: Antes do Masterchef, só via isto como um hobbie e quero garantir que o Técnico está feito e concluído primeiro, mas com o programa tive um incentivo maior dos chefes a seguir este caminho na minha vida. […] Por agora, vou fazendo eventos de cozinha, workshops e showcookings, […] o que sinto quando estou a cozinhar faz-me querer fazer a transição para o mundo da cozinha o mais rápido possível.
Questão: Qual foi a sensação de estares na televisão a viver o programa?
Resposta: Eu continuo ainda sem acreditar que fiz parte do Masterchef. Para mim, ver o programa e ter estado lá são duas coisas completamente diferentes, foi surreal e acho que todos lá sentimos isso. Quando estávamos lá, não percecionávamos que depois iria sair na televisão, nem a visibilidade que íamos ter. Muitas pessoas acham que o programa está a decorrer à medida que gravamos, […] mas quando o primeiro episódio sai, o programa já está praticamente todo gravado, e isso não é segredo, pois os chefes também já dizem isso, mas grande parte da população acha que as gravações acontecem enquanto estamos lá e é muito engraçado ver as pessoas a apoiarem-nos e a darem “boa sorte” nas redes sociais e tu já sabes que saíste. Foi uma experiência incrível, mas não associo aos outros Masterchef que tinha visto […] há quem diga que perde a magia saber o por trás das câmaras, mas para mim ganhou um outro tipo de magia.
Questão: As pessoas reconhecem-te na rua?
Resposta: Na minha terrinha sim, já nem me chamam Rúben, dizem “então Masterchef”, por exemplo no evento no IST do Tagustoso fui muito reconhecido, fui abordado cerca de 7 vezes. Eu gosto disso, porque mostra que as pessoas também vêem esses programas e que têm este gosto pela cozinha como eu, então fico feliz que me reconheçam.
Questão: Quais os teus momentos favoritos durante as gravações?
Resposta: As gravações eram muito intensas, acordávamos muito cedo e chegávamos muito tarde a casa. Muitas das vezes, a gente cozinhava, mas por vezes recebíamos comida do catering […] conseguia ser muito stressante gravar cerca de 10 horas por dia. Então, o que fazíamos era pegar em garrafas de vinho e cervejas e íamos para o alpendre da casa […] então começámos a criar o gang do alpendre, onde nos juntávamos um bocado antes de nos irmos deitar para desanuviar porque conseguia ser muito exigente. Fora da parte das provas, destaco a parte do convívio e da aprendizagem e a necessidade de todos nos apoiarmos.
Questão: Vocês tinham gravações todos os dias?
Resposta: Só não havia gravações nos dias em que fazíamos viagens. As gravações eram cansativas, era preciso maquilhagem sempre, o guarda-roupa era o nosso, mas eles garantiam que não existiam os mesmos tons por toda a gente, lembro-me duma vez engraçada que estávamos todos de azul ou branco e eles começaram a apresentar peças de roupa do programa para usarmos ou a sugerir trocarmos entre nós. Nós, muitas vezes, saímos de casa às 7h30 e, entre chegar ao armazém e ir para o estúdio, era chegarmos tipo às 8h, depois entre maquilhagem, roupa, cabelos, colocar e testar microfones para todos, já eram 10h. Havia dias que só começávamos a cozinhar de tarde e outras que cozinhávamos duas vezes por dia […] por vezes era uma eliminação de manhã e tínhamos de voltar à tarde outra vez como se tivéssemos numa semana completamente diferente, com novas roupas e com os chefs a perguntar “e esta semana nova estão bons?” e era literalmente o mesmo dia […] é muito estranho e pesado, mas fomo-nos habituando. Os depoimentos acontecem todos depois das provas, temos alguém a falar connosco a fazer questões acerca do nosso prato e dura cerca de 30 minutos por pessoa […] é muito imersivo porque estamos sempre a cozinhar ou a falar disso, e todas as pessoas à nossa volta estão na mesma experiência, por isso acabava por não ir a casa, porque, senão, iria estar a preocupar-me a falar mais do mesmo com os meus pais, para eles também estarem a par […] era cozinhar, gravações, depoimentos, viajar, mas era giro porque estávamos todos para o mesmo.
Questão: Vocês têm acordos de confidencialidade?
Resposta: A maior preocupação deles, do programa, era divulgarmos coisas nas redes sociais antes do tempo e reconhecia-se isso no contrato assinado com a produção […] eles dão-nos a experiência, a formação, e temos de honrar esse contrato. Mas obviamente que se eu estou a gravar um programa de televisão e ainda não fui para casa, é sinal de que ainda não fui eliminado.
Questão: Tens alguma prova que tenha sido a tua favorita?
Resposta: A prova do Bife Wellington em que faço dupla com o António Miguel. Ele alinhou naquela loucura comigo porque era 1h15 e os chefs não gostaram muito da ideia, porque era pouco tempo, mas eu disse aos chefs que ia correr bem. Antes de cozinharmos, brincámos um pouco a misturar as outras equipas porque eu tinha uma vantagem do episódio anterior, por isso é que eu gostei tanto […] era uma prova que não iria levar a eliminações, mas alguns ficaram chateados […] eu fiz aquilo mesmo de maneira aleatória, então foi giro ver as pessoas a reagirem, e depois a prova correu-nos super bem aos dois.
Questão: Houve alguma coisa numa prova que não tenhas gostado?
Resposta: Gostei de todas, mas se calhar digo as provas de equipa de exterior por ser muitas horas a fio a trabalhar e era muito exigente. Eu associo o facto das provas de equipa me terem corrido tão bem devido ao Técnico, que acaba por nos habituar a sentir sempre pressão. A pressão que eu senti no programa é a mesma pressão que eu sentia na faculdade […] então, eu entrava nas provas de equipa, passavam-se 5 horas, e eu não dava por nada, mas a exigência sentia-se, até porque a Célia sentiu-se mal algumas vezes, as pessoas estavam tão no momento que acabámos todos por apanhar escaldões com o sol […] as condições do exterior são muito mais exigentes e temos menos recursos do que em estúdio, o que acaba por nos dar outro tipo de experiência na cozinha.
Questão: O que retiras como principais ensinamentos desta experiência?
Resposta: Trabalhar em equipa numa cozinha é das coisas mais fundamentais que aprendi, assim como gestão de tempo, porque eu fui para lá e não tinha muita noção de como gerir o tempo numa cozinha […] também retiro como ensinamentos as técnicas que aprendi e a oportunidade de ganhar uma grande rede de contactos. Foi tudo incrível, foi uma experiência muito enriquecedora.
Questão: Gostastes da experiência do workshop do NAPE que fizeste?
Resposta: Gostei muito mesmo e voltarei a repetir, acho que eles também gostaram muito da adesão porque esgotou as vagas muito rapidamente, fico muito feliz que tenha sido assim. Surgiu interesse de voltar a fazer mais vezes, mas é difícil conciliar isso pro bono porque envolve mesmo muita organização, desde a logística do espaço aos ingredientes e recursos limitados […] tudo isso envolve tempo livre meu, para também preparar as receitas e as fichas técnicas, e tenho de saber para quantas pessoas vou cozinhar. Correu muito bem, improvisei algumas coisas, era a primeira vez que estava a fazer um workshop naquelas condições, mas foi muito giro, cozinhei um prato de risotto de cogumelos e um de massa fresca com molho de tomate.
Questão: Quais são os teus próximos passos e objetivos na cozinha?
Resposta: Eu era das pessoas mais novas lá e dos que provavelmente tinha menos experiência em cozinhar, então tenho noção que a minha credibilidade para entrar logo no mundo da cozinha não é a maior […] o programa é uma porta muito boa, mas preciso de experiências numa cozinha profissional e de mostrar realmente que é isto que eu quero fazer. De momento, o meu objetivo é conciliar isto com o Técnico, mas queria arranjar um estágio part time […] os chefs também nos ajudam muito com isso e oferecem-se para nos ajudar depois de nos conhecerem no programa. Entretanto, estou a dar workshops e showcookings, tal como fiz com o workshop do NAPE, para ganhar mais experiência e, eventualmente, num futuro mesmo muito longínquo, tipo daqui a 15 anos abrir o meu restaurante. Agora, quero experiência em cozinhas profissionais para perceber se é mesmo isso que eu quero fazer ou se me fico pelos showcookings, workshops e consultoria. O futuro logo o dirá.