Sétima Legião – A Um Deus Desconhecido

“Pois que Deus assim o quis”

Autoria: Pedro Fonseca (MMAC)

É para mim um dos aspetos mais curiosos da música que o pop-rock dos anos 80 português é melhor do que o pop-rock dos anos 80 americano ou britânico. A minha teoria está relacionada com o facto de que para bandas que cantavam em inglês havia público suficiente para cada um dos géneros musicais dominantes dessa época, como o pop exagerado, extravagante e ensurdecedor de bandas como os A-ha, Duran Duran ou os Wham; ou o rock alternativo genuíno e apaixonante de bandas como os The Smiths e os R.E.M.. Em Portugal, no entanto, uma população menor “obrigava” as bandas e os artistas a servirem tantos gostos quanto possível, combinando vários estilos; e em muitos casos, incrivelmente, isso funcionou espetacularmente bem. António Variações, Rádio Macau, Sétima Legião e GNR são para mim os artistas mais notáveis do pop-rock da época, tendo havido muitos outros que produziram várias músicas excelentes. 

Vale a pena salientar o caráter político da época em Portugal, marcado por uma forte divisão entre a direita e a esquerda, que se refletiu bastante na música. Naturalmente que este aspeto não tinha muito a ver com as temáticas das músicas, mas mais com o estilo e a visão geral das bandas. Os Heróis do Mar eram essencialmente os porta-estandarte dos artistas de direita, enquanto na esquerda seriam talvez os Trovante os mais representativos. Noto que eu nasci em 2000, e isto vem tudo em segunda mão de fontes não inteiramente fiáveis, portanto obviamente que muito do que eu estou a dizer aqui é altamente discutível.

Mas de toda a música produzida nessa época, o melhor e mais completo álbum que eu encontrei até agora é “A Um Deus Desconhecido”, dos Sétima Legião. Da banda formada por Rodrigo Leão et al (sem ofensa aos al), e com letras na sua maioria de Miguel Esteves Cardoso, o álbum combina êxitos como ‘O canto e o gelo’ e ‘Glória’ com faixas mais melancólicas e experimentais como ‘Manto branco’ e ‘Mar d’Outubro’. O álbum é muito diverso, tanto que dificilmente se apontam duas músicas com estilo semelhante.

O maior hit: ‘Glória’. Muito rítmico e muito constante, o primeiro single gravado pela banda faz lembrar bastante os Joy Division, mas com um subtil toque de pop.

A minha favorita: ‘Aguarela’. Excelente melodia, excelente letra. Uma menção honrosa também para ‘Porta do Sol’, que tem uma linha de teclado maravilhosa.

O que ouvir a seguir: para quaisquer das bandas que eu mencionei acima, uma compilação Best of é uma hipótese perfeitamente apropriada para ficar a conhecer melhor a banda. Fora destes artistas (e deste género de música, aliás) sou grande fã de José Afonso e de Sérgio Godinho. É praticamente criminoso mencionar tão ao de leve estes dois artistas, como se fossem um afterthought; especialmente Sérgio Godinho, que é praticamente o equivalente aos New Order de Portugal, na medida em que foi o artista que mais música produziu, ao longo de maior tempo, e com maior qualidade. No entanto, não estou particularmente familiarizado com nenhum dos seus álbuns, portanto eu começaria pelo seu primeiro álbum, “Os Sobreviventes”. De José Afonso, absolutamente revolucionário, recomendo as “Baladas e Canções”. 

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