Autoria: Leonor Costa (LEFT)
Os Call Me Again Tomorrow (CMAT) são uma banda de indie rock composta por quatro músicos – André Nabais, Francisco Alegrio, Filipa Ferreira e Vasco Tinoco – formada em Lisboa, em meados de 2023. Agora que lançaram o seu EP de estreia, intitulado “What’s Happening?”, André e Francisco estiveram à conversa com o Diferencial para partilhar a sua trajetória, planos futuros e visão artística – desde Capitão Fausto aos Red Hot Chilli Peppers, com discussões acerca da sustentabilidade de uma Nissan Vanette à mistura.
André Nabais e Francisco Alegrio conheceram-se bastante cedo: “Foi engraçado […], nós andámos no infantário juntos. Tenho uma foto com ele [André] na garagem onde nós ensaiamos agora, quando nós tínhamos dois anos”, menciona Francisco, quando lhe perguntamos sobre os primeiros dias da jornada musical dos quatro – “[seria] a melhor album cover de sempre”, garante. “Andámos desencontrados por mais ou menos dez anos […] e depois começamos a tocar”. Anos mais tarde, foi por causa do Instituto Superior Técnico e de uma t-shirt dos Red Hot Chilli Peppers que Vasco Tinoco surgiu em cena. “Eu conheci o Vasco no meu primeiro dia do Técnico” – disse André, que atualmente está no segundo ano da Licenciatura em Engenharia Física Tecnológica – “não conhecia ninguém, vi-o [Vasco] com uma t-shirt dos Red Hot Chilli Peppers e pensei, vou falar com este gajo”. André, Vasco e Francisco juntaram, naturalmente, forças, apesar de nunca terem ouvido Vasco a tocar. Foi um voto de confiança.
Finalmente, e quando a história não podia ficar mais invulgar, foi através do OLX que Filipa Ferreira conheceu Francisco e, posteriormente, os seus futuros colegas de banda: “Eu tinha num anúncio no OLX que dava aulas de guitarra” – que ainda mantém no ar, sublinha Francisco – “e um dia […] recebo uma chamada de um senhor a dizer que [apesar de não estar à procura de aulas de guitarra] a [sua] filha canta e precisa de um guitarrista para tocar em cafés”. Ainda naquele dia, estava Francisco a tocar com Filipa pela primeira vez. Tocaram Creep, dos Radiohead. “Assim que ela começou a cantar foi tipo […] tu és a minha nova vocalista”. Naturalmente, Francisco apresentou Filipa (Pipa) a todos, e foi a partir daí que os quatro criaram este projeto.
Sobre o EP recentemente lançado, tudo começa com o single Moonchild: “Foi a primeira música que escrevemos […] e quando a Pipa nos mostrou a ideia de ter uma banda, ela mostrou-nos a letra do Moonchild”; Filipa trouxe a letra, da sua autoria, e pediu que tocassem o que lhes apetecesse. Em quinze minutos, estava feito o primeiro single da banda.
“[Moonchild] representa melhor a banda” – tal como é retratado metaforicamente no videoclipe, a procura por uma sensação de pertença e “casa”, algo que seja autêntico, real para com o nosso interior, enquanto em transição para a vida adulta: “Sobre a situação de passarmos de jovens para adultos […] e as dificuldades que temos de passar”. É esta ideia que motiva também o título do EP – “What’s Happening?” – que reflete mais uma vez a confusão interior sentida enquanto se procura ser o mais fiel possível a si próprio.
Já a primeira faixa do EP, Don’t Wanna, é especial pelo seu riff. É a favorita de André e de Francisco, por ser “a mais divertida de tocar”. Perguntou-se: “é aquela parte, não é?”, a que se seguiu imitações de guitarra em voz e sorrisos. “Eu acho que a partir da Don’t Wanna, começamos a escrever as músicas não tanto para serem catchy ou a pensar no que é que as pessoas vão achar, mas mais para […] que nós, quando estivéssemos a tocar, nos estivéssemos a divertir imenso.” Don’t Wanna é sobre ir contra o que nos é imposto pelo exterior – “não deixar que as pessoas [à nossa volta] decidam por nós, decidirmos por nós mesmos”. No caso dos CMAT, “tocar a nossa música” e ir assim criando uma base de apoio, sem terem de mudar a sua sonoridade e quem são.
Quando questionados sobre o processo criativo: “Ultimamente […] dou as minhas notas do telemóvel desbloqueadas à Pipa [que] é a única pessoa [com quem] eu faço isto” referiu Francisco. Ela vai escolhendo, cantando e a banda acompanha, cada um à sua maneira. “Nós fazemos uma jam por aí de 10 minutos, e depois a Pipa pega no minuto que gostou e nós, a partir daí, construímos a música”. Escrever surge naturalmente para Francisco, tal como a música surge naturalmente para os Call Me Again Tomorrow: “O que eu estou a gostar [neste projeto] é que está tudo a ser super natural, o processo de escrita, de composição […] é mais por isso que está a ser tão divertido”.
Perguntam-se influências e sonhos, e André responde: “Acima de tudo queremos fazer o nosso percurso […] eu tenho muitos role models, mas não me quero tornar alguém em específico”, e Francisco adiciona: “quero estar numa carrinha pela Europa a dar concertos”. André concorda rapidamente: “começamos a andar por Lisboa, depois por Portugal […] sempre numa carrinha”. A carrinha em questão é uma Nissan Vanette, de 1994, vermelha, de nove lugares – a “carrinha de sonho”.
À conversa surgem nomes como os Black Keys, os Capitão Fausto, os Não Mates o Mandarim e os Guns & Roses como influências musicais, passadas e presentes. Ao passo que Filipa tem um background mais forte em pop, os restantes três puxam mais para o rock, e juntos encontram um equilíbrio no indie pop-rock que os Call Me Again Tomorrow protagonizam neste EP. Filipa acrescentou, uns dias após ter ocorrido a entrevista, que se há uns meses atrás lhe dissessem que iria fazer parte de uma banda de rock, “jamais acreditaria”: “Ainda é tudo muito novo para mim, nunca fui muito de ouvir este estilo […] sinto sim que me estou a reinventar.” Vasco, especificamente sobre a influência que viver em Cabo Verde durante a sua adolescência teve na sua música, afirmou que “é […] misturando estilos que se faz música nova”, reiterando o seu gosto pela música e cultura cabo-verdiana.
André e Francisco encontravam-se entusiasmados pelo seu primeiro concerto desde o lançamento do EP, que ia ocorrer naquela sexta-feira. Depois de informados que esta entrevista seria publicada após o concerto, disseram, em tom de brincadeira: “Os quatro concordam [que o concerto] foi incrível, [o resto] é relativo”. “Se um produtor ou alguém [que fosse] grande na música” pedisse a André para alterar o core da sua música de modo a passar na rádio, ele dizia que não. Ambos acrescentam: “A rádio no fundo vende o que as pessoas querem comprar em massa […] a maior parte das músicas que têm um bilhão [de streams], são músicas que passam na rádio, em anúncios, vezes e vezes sem contas; [músicas que] quase que és forçado a gostar”.
O que procuram fazer com este projeto é, no fundo, forjar o seu próprio caminho e identidade como banda, reiteram André e Francisco. “E divertirem-se?”, perguntamos: “principalmente isso”, respondem. Despedindo-se do Diferencial para colar posters que anunciem o seu concerto, os “Call Me Again Tomorrow” destacam-se nos fortes vocais e riffs, bem como na vontade de criar sem presunções – música como fim em si mesma, não como um produto descartável e certamente não como meio para obter a aprovação de outrem.