Texto: Miguel Ferreira*
Portugal juntou-se à Comunidade Económica Europeia (CEE) no dia 1 de Janeiro de 1986. Nessa data, também Espanha aderiu a esse grupo que passou a ser constituído por 10 países. A CEE começou com um nome ligeiramente diferente – Comunidade Europeia do Carvão e do Aço – quando 6 países decidiram, em 1951, organizar de forma comum o acesso a estas duas mercadorias essenciais. Desde essa altura, o grupo foi crescendo e, consequentemente, as suas regras de funcionamento foram mudando. Ao contrário do que acontece hoje, em 1986 todos os países da CEE tinham uma moeda própria e a livre circulação de pessoas só existia entre os países do Benelux[1], a França e a Alemanha (uma circunstância que resultou da assinatura do Tratado de Schengen, entre estes países, em 1985). Nessa altura, um cidadão português que quisesse viajar em direcção ao norte da Europa teria que perder algum tempo em vários postos fronteiriços.
Pouco mais de três anos após a entrada de Portugal na CEE, em Novembro de 1989, cai o muro de Berlim. Este é um acontecimento marcante para a época: por um lado, simbolizou o início de um processo que culminaria no desmembramento da União Soviética; por outro, veio acelerar a integração europeia, ou seja, veio agilizar as negociações que conduziriam os países da CEE a uma maior aproximação em termos políticos. Esta aceleração do processo de integração e as ambições europeístas que a motivavam estão patentes na grande quantidade de movimentações diplomáticas que marcaram os anos 1990 e a primeira década dos anos 2000.
É neste espírito de integração que se assina o Tratado de Maastricht, a 7 de Fevereiro de 1992, pelos 12 membros da CEE. Com este tratado, a CEE passa a chamar-se “União Europeia” (UE) e cria-se assim a “Cidadania Europeia”, concedendo aos cidadãos dos estados-membros da UE o direito a viver, trabalhar e circular livremente por todos os países-membros. Neste tratado, também ficaram estabelecidos a Política Exterior e de Segurança Comum (PESC) e o projecto de criar uma moeda única, o Euro. Entretanto, a 1 de Janeiro de 1995, Áustria, Finlândia e Suécia juntam-se à União Europeia e o grupo passa a ser constituído por 15 países.
A ideia de estreitar as relações entre os membros da CEE continuou com a assinatura, a 2 de Outubro de 1997, do Tratado de Amesterdão. Embora as conversações em torno deste tratado não tenham sido tão bem-sucedidas quanto o esperado, os estados-membros aceitaram transferir alguns poderes dos governos nacionais para o Parlamento Europeu em várias áreas, particularmente no domínio da imigração. Por outro lado, este tratado também aprofundou, entre outras coisas, o compromisso dos membros da UE para com os direitos humanos.
Uma questão que não ficou completamente esclarecida durante a sua elaboração foi a reforma institucional necessária caso houvesse novas adesões à UE. Assim, os líderes europeus voltaram à mesa de negociações e, a 26 de Fevereiro de 2001, assina-se o Tratado de Nice. Este documento estabelecia as condições necessárias para facilitar o processo de tomada de decisão no seio das instituições europeias, uma característica que era considerada fundamental para que a UE estivesse preparada para acolher novos membros. Mais uma vez, e à semelhança do Tratado de Amesterdão, fica no ar, após a assinatura do Tratado de Nice, uma sensação de insatisfação. Muitos líderes da altura consideraram que mais mudanças eram necessárias à estrutura da União para que o seu papel pudesse ser mais eficiente e democrático. Por exemplo, uma das grandes celeumas tinha que ver com o peso dos votos de cada país na deliberação das decisões tomadas no Concelho da União Europeia – enquanto que a Alemanha queria ter mais peso que a França, por ter uma maior população após a reunificação, a França dizia que não, querendo manter simbolicamente o mesmo peso que a Alemanha. Entre outros, este assunto ficou num impasse.
Pouco tempo depois, a 1 de Janeiro de 2002, e tratando-se do culminar de um projecto iniciado aquando da assinatura do Tratado de Maastricht, o Euro entra em circulação em 12 dos 15 países membros da UE. Menos de dois anos depois, a 1 de Maio de 2004, dez novos membros juntam-se à UE: para além das ilhas mediterrânicas de Chipre e Malta, também a Estónia, a Hungria, a Letónia, a Lituânia, a Polónia, a República Checa, a Eslováquia e a Eslovénia se juntam. É o maior alargamento da UE e constitui um teste aos melhoramentos institucionais trazidos pelo Tratado de Nice. Mesmo assim, ainda paira sobre as instituições o descontentamento relativamente aos diferendos sobre o seu funcionamento que ficaram pendentes. Com este alargamento, torna-se claro que esses assuntos não podem ser evitados e começa-se assim um novo processo de negociações para reformar o funcionamento da União. Desta vez, e depois da experiência das negociações difíceis dos dois últimos tratados, o Conselho Europeu convoca uma assembleia especial constituída por parlamentares europeus e nacionais, assim como por representantes da Comissão Europeia. Esta convenção redige um projecto de Constituição Europeia – que tinha por objectivo substituir todos os tratados anteriores – cujo texto final é assinado pelos chefes de estado e de governo no dia 29 de Outubro de 2004. Para que este texto entre em vigor, é necessário que seja ratificado por todos os estados-membros. Dezoito estados membros ratificam-no, incluindo a Espanha e o Luxemburgo, que o fazem por referendo. Contudo, tanto os cidadãos franceses como os holandeses, que também ajuizaram o texto por referendo, votam contra a 29 de Maio de 2005 e a 1 de Junho de 2005, respectivamente. Estes dois votos desfavoráveis colocaram um ponto final no processo de ratificação (ainda faltavam 7 países) e conduziram ao abandono deste texto. As dificuldades institucionais que se arrastavam desde o Tratado de Nice mantinham-se. No meio deste rebuliço institucional, a Roménia e a Bulgária juntam-se à UE em 2007 e, no mesmo ano, a Eslovénia adopta o Euro como moeda oficial.
A União continuava a crescer, e as preocupações relacionadas com a reforma institucional considerada necessária não se podiam ignorar. Assim, no movimento de fuga para a frente após o processo de ratificação falhado da Constituição Europeia, os chefes dos estados-membros da UE aprovam, durante a reunião informal do Concelho Europeu de 18 e 19 de Outubro de 2007, uma versão simplificada do texto rejeitado da Constituição Europeia. É este novo texto que vai ser assinado no Mosteiro dos Jerónimos a 13 de Dezembro de 2007 pelos 27 países e que terá o nome de Tratado de Lisboa. Uma das previsões deste tratado é a extensão dos poderes do Parlamento Europeu, assim como a alteração no modo de voto em alguns domínios; enquanto que antes se passavam propostas apenas por unanimidade, passa a ser possível passarem-se propostas por maioria qualificada. De notar também que o Tratado de Lisboa cria, pela primeira vez, os meios legais e protocolares para que um estado-membro abandone a UE. Mas, como se viu com o texto da Constituição Europeia, ter um documento assinado pelos líderes dos estados-membros não significa nada se este não for ratificado individualmente em cada país. Esta última fase de ratificação tinha sido o momento onde a Constituição Europeia tinha sido rejeitada e o método de ratificação por referendo tinha sido particularmente problemático. Assim, assombrados pela rejeição em referendo dos franceses e dos holandeses em 2005, a maioria dos estados decidiu ratificar o texto do Tratado de Lisboa nos parlamentos, ou seja, seriam os deputados de cada parlamento nacional a votar a ratificação. Todos, excepto um, a Irlanda. A constituição irlandesa obriga à organização de uma consulta popular para a ratificação de documentos desta natureza. Após a ratificação por 18 dos 27 membros, a Irlanda rejeita o tratado por referendo a 12 de Junho de 2008. Começam os receios de que o processo de ratificação do Tratado de Lisboa siga pelo mesmo caminho de insucesso da Constituição Europeia em 2005. No sentido de evitar um impasse semelhante, uma maioria de estados afirma, durante o Concelho Europeu de 18 e 19 de Junho de 2008, a sua vontade de continuar com o processo de ratificação, apesar da rejeição irlandesa. O Reino Unido dá o exemplo, ratificando o Tratado de Lisboa a 19 de Junho de 2008. Seguiram-se-lhe outros países e, entretanto, a 2 de Outubro de 2009, com um novo referendo organizado na Irlanda, o texto é finalmente ratificado neste país. Após a ratificação por parte da República Checa, o último país a fazê-lo, a 13 de novembro de 2009, o Tratado de Lisboa entra em vigor a 1 de Dezembro de 2009. Ainda nesse ano, a Eslováquia entra para a Zona Euro.
O Tratado de Lisboa foi a última grande reforma ao funcionamento das instituições europeias, mas devido às consequências da crise financeira de 2008, foram criados novos instrumentos de acção para responder aos desafios que se foram materializando, como por exemplo a crise das dívidas públicas na Zona Euro. Entretanto, a Croácia juntou-se à UE e a Estónia, Letónia e Lituânia juntaram-se à Zona Euro. Trata-se agora de um grupo de 28 países, 19 dos quais partilham a mesma moeda, que estão a braços com a possibilidade de ver sair um dos seus membros: através de um referendo realizado a 28 de junho de 2016, o Reino Unido decidiu que quer abandonar a UE. Para os outros membros que ficam, as próximas eleições para o Parlamento Europeu, que se vão realizar no dia 26 de maio de 2019, constituirão um teste de legitimidade para este projecto. As últimas eleições para o dito parlamento aconteceram em 2014, com uma taxa de participação de 42,54%, a mais baixa registada até então.
[1] Organização económica inicialmente constituída por a Bélgica, os Países Baixos e o Luxemburgo.