A Vida passeia no Arco do Cego: Quisemos saber mais sobre ela

Autoria: Ângela Rodrigues (LEFT), Margarida Almeida (MEBiol)

Nota introdutória:
Antes de passarmos para o artigo, a pedido do Agostinho, companheiro da Vida Rosinha, gostaríamos de sensibilizar os leitores para a postura perante um avistamento da Vida. Filmar ou fotografar sem pedir autorização não é aceitável, especialmente considerando que frequentemente há crianças perto da Vida e do Agostinho, cuja captação e exploração da imagem é particularmente problemática. Ao tirar fotografias/vídeos, foquem-se na porquinha, evitando captar imagens de outros.  

Todos os dias, por volta das 19h, é tradição de vários estudantes do Campus da Alameda do Instituto Superior Técnico, passar pelo jardim do Arco do Cego e avistar um senhor a passear a sua porca de estimação. O Diferencial, em sintonia com uma crescente comunidade de observadores e admiradores “da porca do Arco do Cego”, entrevistou o Agostinho, responsável pela mesma, com o intuito de saber mais sobre o ícone.

A porca chama-se Vida Rosinha. “Vida” porque “[Ela terá] direito a todos os minutos da sua vida. Aquilo que eu conseguir dar, ela vai conseguir” e “Rosinha” pela descoberta, após um primeiro banho, de que a sua pele era cor-de-rosa e não castanha, como inicialmente aparentava. 

É uma porca anã da raça Juliana, com 3 anos de idade e 47 kg. Os porcos domésticos vivem entre 15 e 20 anos, o que garante alguns anos de relevância a este artigo. São animais de rebanho, bastante sociáveis com os demais animais que costumam estar no jardim do Arco do Cego, mas o Agostinho conta-nos: Na rua, é super sociável, em casa não. É o nosso espaço”.

Foi em 2020, no início da pandemia de Covid-19, que o Agostinho encontrou a Vida (com 1 mês e 2 kg): “Já sabia várias coisas acerca de porcos. Pensava eu que sabia muito, mas não, isto é um mundo.”

Higiene e Beleza

Contrariamente ao que se poderia pensar, os porcos não suam e não emitem qualquer tipo de cheiro [1]. Mesmo assim, a Vida toma banho uma vez por mês, as suas orelhas são limpas de 15 em 15 dias e as patas são lavadas quando vem da rua.

De acordo com o Agostinho, também em termos de pelagem, a Vida se diferencia de outros animais domésticos que já teve: “Os pelos caem todos em julho. Não ficam presos em lado nenhum, não é como o pêlo dos gatos.

À semelhança dos humanos, os porcos mudam de dentição, fazendo-o três vezes. A Vida já mudou uma vez, a segunda está para breve, e o processo é semelhante ao dos humanos: “[Ela] já mudou uma vez, estou à espera da segunda. Têm dentinhos de leite, e é como nós, humanos, que temos febres.

Ter um porco fora de uma quinta requer cuidados de higiene adicionais, por exemplo, com as unhas: “Tem que se cortar as unhas da frente, porque elas crescem e depois, como eles ficam muito tempo a dormir e não estão na quinta, não gastam as unhas. De 6 em 6 meses, quando ela está refastelada, corto-lhe as unhas e dou-lhe uma escovadela todos os dias.

 “Sim, é verniz, eu pinto-lhe as unhas de vez em quando”. Fonte: Agostinho

Saúde e Alimentação

Apesar de não ser um animal exótico, de um ponto de vista veterinário, a Vida é tratada como tal, não podendo ser acompanhada por um veterinário normal: “Tem de ser [veterinário de] exóticos. Os outros veterinários não estão especializados.”

Em termos de vacinação, uma vez que não está com outros animais numa quinta, tomou as mesmas vacinas que os cães. A Vida foi também castrada para evitar o desenvolvimento de quistos.

A Vida é alimentada, não de ração, mas de frutas e vegetais que o Agostinho traz sobretudo da feira. Tem preferência por bananas e morangos, mas acaba por comer toda a comida a que tem acesso: “Está sempre com fome. Parece que nunca comeu na vida.

Necessidades fisiológicas 

Os porcos são animais inteligentes [2], com facilidade de aprendizagem, e a Rosinha não é exceção: Ela aprende muito rápido. Uma, duas, três ações e ela faz. Com as necessidades fisiológicas, o Agostinho habituou-a a ir à rua após o pequeno almoço e é isso que acontece. “Eu acabava de lhe dar de comer, trazia à rua, ela fazia o xixi. A seguir, reforço positivo, muito miminho, um pãozinho, uma frutinha. Então, ela fixou que ir à rua é para fazer o xixi; quando o faz, recebe mimos, recebe frutinhas e não faz nada em casa. E, se eu me atrasar, ela espera.

A vida com a Vida Rosinha

A Vida “é amorosa, obstinada, ressabiada. Não se faz mal a animal nenhum, especialmente a porcos, eles guardam. […] Se me puder pregar uma partida, ela vai pregar uma partida. Ela vai passar e vai mordiscar-me os pés. E eu não fiz nada. Eu sei que isto foi de há dias, quando lhe ralhei. Mas é uma companhia. […] Ela foi o melhor que me aconteceu em termos de companhia. Nunca mais me senti sozinho.

Vida feliz no pasto. Fonte: Agostinho

Segundo o Agostinho, “há muitos porcos por resgatar”. Uma das maiores organizações de resgate animal do país [3], afirmou ao Diferencial ter, à sua responsabilidade, cerca de meia centena de porcos à procura de padrinhos. 

Tudo, quando é pequenino, é fofinho. As coisas crescem, dão trabalho. Faz barulho, guincha. [As pessoas] não sabem, não se informaram primeiro. Ela não pode ter uma caixa de areia, eles comem areia e serradura. Se quiser fazer [as necessidades]  em casa, vai encher a casa de serradura. É ter paciência, eles [os animais] requerem muita atenção e muita paciência. [O que por vezes acontece é:] o porco cresceu e abandona-se o porco. Por isso, há muitos [para adotar]. Mas quem é que depois quer um porco grande?

O Agostinho costuma participar em ações de sensibilização para os direitos dos animais e conservação do meio ambiente: Acho que toda a gente devia participar um bocadinho em ativismo. […] Acho que ser passivo é a mesma coisa que ser quase que conivente com as coisas.”

“Eu moro aqui ao lado, para mim é uma vergonha se eu não for ali ao Campo Pequeno. Vamos ver se este ano nos deixam em paz, se este ano é o último ano que a gente está lá. Mas, sempre que há uma tourada, a gente está ali. […] Sou muito cidadão, cumpridor da lei, não sou um maluco que vai para ali. Ali somos todos malucos. Isso deixa-me um bocado revoltado. Qualquer manifestação que se faça em Portugal, são os malucos. […] Não tenhas vergonha de ir para a frente de uma manifestação e de levantar o braço. Nunca tenhas vergonha disso, de aparecer num sítio, de aparecer num jornal, de ser criticado por estar a fazer uma coisa certa.

Referências:

[1] – INGRAM, D. Evaporative Cooling in the Pig. Nature 207, 415–416 (1965) [Acedido a 27 de abril de 2024]

[2] – A incrível inteligência dos porcos [Acedido a 1 de maio de 2024]

[3] – Animal Save & Care Portugal [Acedido a 1 de maio de 2024]

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