40 detenções e 1 ferido: duas semanas de Ocupa

Autoria: Beatriz Dinis (LEAer)

As duas semanas da 3ª onda de ações e ocupações do movimento “Fim ao Fóssil” terminaram sexta-feira, dia 24 de novembro, culminando em cerca de 40 detenções e um ferido.

Sob o lema “Não há paz até ao último inverno de gás”, a Greve Climática Estudantil iniciou, pela terceira vez, ocupações e ações de desobediência civil com o objetivo de pressionar o governo e as instituições para que Portugal tenha “energia 100% renovável e acessível até 2025” e o “fim ao fóssil até 2030” . Dia 13 de novembro, segunda-feira, os ativistas estudantis anunciaram a sua presença através de “banner drops” com mensagens como “Ouçam a ciência, há uma emergência” em faculdades como ESTC, ISCTE E FCUL. Na FCSH, estudantes montam tendas e acionam alarmes de incêndio, convocando uma aula dada pelo docente Daniel Cardoso de “Comunicação e Ciências Sociais”, enquanto que na Faculdade de Psicologia, três estudantes bloqueiam brevemente uma das entradas.

Graffiti na FCSH

Seria na noite de 13 para 14 que as primeiras detenções ocorreriam: 6 estudantes que ocupavam a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) acabaram por ser detidas e à saída da faculdade, um dos carros da polícia, que levava uma das estudantes, acabaria por causar um acidente com um civil. Para além das mostras de solidariedade por estas 6 estudantes, na terça-feira, dia 14, um estudante pintou a loja da Galp que se encontra no Jardim Norte do Instituto Superior Técnico.

Graffiti no IST

A segunda vaga de detenções ocorreu quarta-feira, dia 15, pelas 14h da tarde: 3 estudantes foram detidas enquanto duas davam uma palestra, estando a terceira a assistir. A primeira onda de descontentamento por pessoas externas do movimento inicia-se aqui, devido ao excesso de força policial mobilizada para deter estudantes que se manifestaram de forma pacífica. Ainda nessa noite, a polícia é chamada à Faculdade de Belas Artes, retirando-se sem proceder a qualquer tipo de detenções enquanto que na FCSH, os portões são fechados às 20h30, duas horas antes do previsto, isolando as ocupantes e originando uma onda de revolta por parte de uma professora e alunos que, quando saiam de uma aula, se depararam com a situação.

Seria nesta faculdade que, no dia seguinte, decorreria um confronto entre os alunos e militantes do partido Chega. O partido, que se deslocou à faculdade com panfletos que “ridicularizavam a luta climática e os seus ativistas”, foi confrontado com um mar de estudantes descontentes com a sua presença na instituição, exigindo a sua saída imediata. A polícia compareceu na faculdade, após ser chamada por parte da deputada Rita Matias, do partido Chega, que acabou por se retirar das instalações.  Na fachada da faculdade, estudantes grafitaram “Valores de Abril só na fachada” e “Lutar pelo clima não é crime”, fazendo referência à renovação do mural de Salgueiro Maia que “contrasta com a forma como os estudantes foram tratados, mostrando a hipocrisia da direção da faculdade”.

Graffiti na FCSH

A primeira semana terminaria com a ocupação inesperada da reitoria da Universidade de Lisboa. Aquilo que começou como uma concentração contra a detenção de estudantes, tornou-se numa ocupação quando o vice-reitor, confrontado pelas ativistas, não condenou a intervenção da polícia nas faculdades. Duas jovens conseguiram entrar na reitoria, quando o vice-reitor tentava retornar ao edifício, depois de se dirigir ao exterior para falar com os manifestantes. No entanto, a saída das duas estudantes foi impedida a menos que o grupo se desmobilizasse, resultando na revolta dos jovens que conseguiram entrar e ocupar o edifício, sentando-se no interior e entoando cânticos como “Ai ai ai, se empurrar o sistema cai”. O protesto terminou com a intervenção da polícia e a detenção de 7 jovens.

O movimento não teve apenas adesão em Lisboa: em Coimbra, os estudantes colocaram faixas em diversos polos da universidade e atiraram tinta a um banner da universidade.

A segunda semana começou com um bloqueio do Departamento de Matemática na Universidade de Coimbra. Já em Lisboa, na terça-feira, dia 21, os alvos das ações foram as sedes de vários partidos (PAN, BE, PS, Livre, PCP e PSD), nas quais vários ativistas se colaram acompanhados do relatório “Empoderar o Futuro” da campanha “Empregos para o Clima” que visa “mostrar como criar um Serviço Público de Energias Renováveis que produza energia elétrica apenas a partir de fontes renováveis, coordene uma transição justa e assegure o direito à energia”, como mencionado no website da campanha. No entanto, a abordagem na sede do Chega foi figurativa: em resposta à ridicularização da luta climática, o movimento colocou brinquedos caninos pois “o Chega é o cãozinho de guarda do sistema fóssil”, como referido por um ativista num vídeo publicado nas redes sociais.

Marcha no dia 24 de novembro

O último dia do “Outono das Ocupas” terminaria com um ferido e 24 detenções, resultando num total de 40 detenções ao longo das duas semanas. A “Visita de Estudo” (denominação que o movimento deu à ocupação do Ministério do Ambiente) começou com uma marcha que saiu do Largo Camões por volta das 11h30 a manhã de dia 24, na qual três menores de idade foram abordados e revistados pela polícia, tendo sido apreendidos aparelhos pirotécnicos de fumo semelhantes aos que se utilizaram na marcha, ao que a assessora de imprensa, Catarina Bio, da Greve questionou a legitimidade e foi algemada e levada para a esquadra por alegada “injúria às autoridades”. ”Estava a tentar evitar que bens de estudantes fossem novamente apreendidos ilegalmente. Nos últimos dias, a polícia tinha já apreendido ilegalmente 7 telemóveis, entre outros bens. Disse a 2 estudantes que estavam a ser revistados: “se eles [os polícias] vos roubarem algo avisem”. Quando dei por mim, estava a ser atirada contra um carro da polícia e a ser algemada por injúria”, adianta a jovem ao Diferencial. Já na Rua do Século, os manifestantes foram recebidos com uma barreira policial que tentaram transpor, levando a momentos de tensão e três detenções de manifestantes que conseguiram passar o cordão. Momentos depois, agentes da Equipa de Prevenção e Reação Imediata (EPRI) assumiram as primeiras linhas da barreira, mantendo-se a tensão e resultando num jovem de 16 anos, José Borges, ser vítima de um ferimento na cabeça causado pela pancada de um cassetete. O jovem foi transportado para o hospital Dona Estefânia depois de cerca de 45 minutos.

Confrontos policiais na Rua do Século 

No entanto, num comunicado feito através da Associação de Estudantes do Liceu Camões, escola frequentada pelo ferido, afirma que “não houve nenhum polícia que se responsabilizasse ou pedisse desculpas pelo ocorrido, apenas demonstraram um certo orgulho no sucedido”. Adianta também que, quando foi atingido enquanto se tentava proteger da investida policial, perdeu momentaneamente o equilíbrio, recuando para a retaguarda do protesto, apercebendo-se que estava a sangrar, sendo que um policia que observava o decorrer lhe afirmou que chamaria uma ambulância, mas quando não o foi possível por problemas técnicos, não avisou ninguém, sendo esta chamada por civis algum tempo depois. No mesmo comunicado, outra estudante do mesmo liceu, afirma que também foi atingida com cassetetes e que “um polícia apontou uma caçadeira à [sua] cabeça e disse que não tinha medo de a usar”. 

Jovem ferido pela polícia na Rua do Século

No entanto, quando o foco se encontrava no Ministério do Ambiente, outro grupo pertencente à Greve Climática Estudantil dirigiu-se para o Ministério das Infra-Estruturas, bloqueando a porta com cadeados e ocupando com o auxílio de tubos que ligavam todos os ocupantes. A ocupação durou cerca de 3 horas, até os 19 jovens serem retirados pelo corpo de intervenção, por volta das 15h, sendo levados para a esquadra de Penha de França, na qual 11 foram obrigados a passar a noite.

O movimento acabou esta onda de ações anunciando o seu sucesso nas redes sociais afirmando que cumpriram o prometido: “Fizemos o que prometemos, parámos o normal funcionamento das instituições que nos encaminham cegamente ao colapso” e termina o post reforçando que “ [estão] determinadas a ganhar a luta pelo nosso futuro”.

Banner na FCSH

Referências:

[1] https://greveclimaticaestudantil.pt/

[2]https://www.instagram.com/gcelisboa/

[3]https://www.empregos-clima.pt/

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