Autoria: Beatriz Gavilan (LEIC-A)
Nos QUC do curso Engenharia Informática e de Computadores, na Alameda (LEIC-A), raramente se vê um resultado abaixo de regular, apesar de algumas UC terem tido graves problemas – Cálculo Diferencial e Integral III e Bases de Dados em 21/22, Análise e Modelação de Sistemas em 22/23. Embora este seja um curso que se encontra, no geral, bem organizado, a sua análise mostra que os QUC, cujo papel é importantíssimo para manter um ensino de excelência, requerem algumas reformas.
Todos nós estamos já habituados a preencher os QUC, após cada semestre. É um processo entediante e moroso que consiste em estimar as nossas horas de trabalho semanais – algo, por vezes, muito difícil de fazer – e em classificar cada unidade curricular (UC) em vários aspetos. Mas será que os QUC têm realmente refletido, com precisão, a realidade estudantil?
Irei, com esse objetivo, sumarizar neste artigo os resultados dos QUC de LEIC-A disponíveis para os anos letivos 2021/2022 e 2022/2023, e ressaltar as situações mais problemáticas com que me deparei.
Mas antes disso, venho brevemente recordar alguns aspetos sobre os QUC:
Este Inquérito aos Alunos (IA) faz parte de um Subsistema de Garantia da Qualidade das Unidades Curriculares do IST (QUC), e classifica cada UC quanto à Carga de Trabalho, Organização, Avaliação e Docência. Este inquérito anónimo permite também avaliar cada membro do corpo docente de cada UC, quanto aos seguintes parâmetros: Assiduidade às aulas, Proveito da aprendizagem presencial, Capacidade pedagógica e Interação com os alunos.
À exceção da Carga de Trabalho no inquérito relativo à UC, e da Assiduidade às aulas no inquérito relativo ao docente, todos os parâmetros das várias categorias dos QUC são avaliados numa escala de 1 a 9, consoante a concordância com uma dada afirmação ou a importância de um certo meio de estudo. Porém, esta escala não é tão clara como parece, pois, segundo o regulamento dos QUC ([3]), um Resultado Inadequado corresponde a uma mediana menor ou igual a 3 e um Resultado A Melhorar corresponde a uma mediana superior a 3 e inferior a 5. Ou seja, quando algo necessita realmente de ser melhorado, a escolha certa para que tal seja refletido nos QUC seria o valor 4, que para muitos pode parecer demasiado baixo. Como uma quantidade ainda significativa de alunos tem tendência para escolher um valor como 5 ou até superior, não tendo noção plena desta métrica, os QUC podem acabar por não revelar a verdade, até porque um valor muito baixo pode ser equilibrado por outros mais altos na mesma categoria.
Análise dos QUC:
Vamos então analisar os QUC de 2021/2022 e 2022/2023, os 2 primeiros anos do Modelo de Ensino e Práticas Pedagógicas do IST (MEPP). Relativamente ao ano 2022/2023 só foram publicados, até à data de escrita deste artigo, os QUC de 1º semestre.
Vou utilizar, nesta análise, os Resultados dos QUC disponíveis na página de cada UC, as tabelas [1] e [2] que reúnem os resultados dos QUC por curso, para o 1º e 2º semestre de 2021/2022, respetivamente, e também alguma informação do Relatório do Delegado (outra componente do QUC) de cada ano, à qual o Diferencial teve acesso.
É importante esclarecer que, embora o Relatório do Delegado possa colmatar a falha do Inquérito aos Alunos em refletir a realidade das cadeiras nas avaliações internas dos anos letivos, pois resume e comunica através dos delegados a opinião dos alunos relativamente a cada UC, no geral, um estudante curioso sobre a avaliação de uma cadeira irá apenas ter acesso aos Resultados dos QUC apresentada na página de cada UC, sem ter o contexto conferido por este relatório.
À primeira vista, LEIC-A aparenta ser um curso muito pouco problemático.
As tabelas de resultados de 2021/2022 apresentam uma Carga de Trabalho que varia entre regular e abaixo do previsto, e todas as categorias para todas as UCs estão classificadas como regulares, com uma única exceção: no 2º semestre, a componente Organização da UC para a cadeira Base de Dados encontra-se a amarelo, isto é, encontra-se classificada como A Melhorar.
Porém, numa análise mais atenta, podemos ver que, embora apresente resultados regulares (verde), Cálculo Diferencial e Integral III obteve uma taxa de aprovação de apenas 51%. Ora, como é possível que numa UC onde tudo se encontra regular e livre de problemas, apenas metade dos alunos tenha obtido aprovação?
Mantém-se como verdadeiro que, à exceção dos episódios pontuais que serão a seguir tratados, LEIC-A é um curso relativamente bem organizado e com poucos problemas. Algumas das situações que irei descrever até já foram resolvidas nos anos seguintes, como é o caso de Bases de Dados e CDI-III. Já quanto a Análise e Modelação de Sistemas, só será possível saber no próximo período.
Cálculo Diferencial e Integral III – 2021/2022:
Em 2021/2022, com a taxa de aprovação já mencionada (51%), CDI-III obteve classificação 5 no que toca à importância das aulas teóricas e de problemas, assim como na importância dos “Apontamentos e outros documentos do professor”. Este foi um ano com aulas teórico-práticas de 2h, sem intervalos, que se traduziram em alunos exaustos, muitos dos quais desistiram de ir às aulas, nomeadamente porque algumas destas consistiam apenas em teoria, sem qualquer componente prática.
Isto é apoiado pela informação da assiduidade dos alunos que passa despercebida, dentro dos resultados específicos dos docentes, e que neste caso varia entre Inadequada (vermelho) e A Melhorar (amarelo), como podem ver na imagem abaixo.
Resultados gerais dos Docentes de CDI-III, em 2021/2022
A UC obteve classificação final 6 na categoria “A UC encontrava-se bem estruturada”, e para a afirmação “Os materiais de apoio foram adequados”, a sua classificação final foi 4, isto é, “a melhorar”, tendo tido 23% dos alunos a classificá-la com 1, 11% com 2, 11% com 3 e 11% com 4. Ou seja, os materiais de apoio disponibilizados parecem ter sido Inadequados aos olhos de pelo menos 45% dos alunos.
Porém estes detalhes que tornam clara a insatisfação dos alunos na altura, não aparecem refletidos na classificação global da organização da UC, que, tal como as outras categorias, aparece como regular (verde).
Para que o descontentamento dos alunos se traduzisse nos Resultados gerais acima apresentados, teria de haver mais uma componente da Organização da UC cuja mediana fosse inferior a 5 ([4]). Ou seja, como só houve uma componente a requerer melhoria, a avaliação final traduz-se numa organização regular, independentemente de quão crítica a falta de materiais de apoio tenha sido.
Outro aspeto a mencionar, ainda sobre esta UC, é que a componente Docência da UC é apresentada também como regular. Porém, nos QUC específicos dos membros do Corpo Docente, podemos ver uma Capacidade pedagógica classificada como A melhorar (amarela), e uma Interação com os alunos classificada como A melhorar (amarela), além de a Assiduidade às aulas variar entre Inadequada (vermelha) e A melhorar (amarela).
Por fim, sabemos, através do Relatório do Delegado, que os alunos consideraram a avaliação por 3 MAP45 e um exame obrigatório excessiva e injusta na dificuldade entre turnos, mas, possivelmente porque os alunos têm tendência a não utilizar valores muito baixos, essa realidade não é clara nos resultados dos QUC, que classificam o método de avaliação com 6 e a sua justiça e equidade com 5, que já é um valor baixo, muito perto da classificação A Melhorar.
Bases de Dados – 2021/2022:
Esta UC obteve classificação 4 na importância das aulas teóricas, 6 nas aulas de problemas e 4 na bibliografia sugerida.
Isto deve-se ao facto de que esta UC, que possuía 600 alunos na altura (devido à mudança de ano curricular causada pela introdução do MEPP), apresentou aos alunos 4 turnos teóricos, onde para cada par de turnos simultâneos, que ocorreria em salas distintas, havia sido atribuído o mesmo professor. Como consequência, metade dos alunos não teve aulas, e para resolver o assunto, estas passaram a ser gravadas. Porém, ao adotarem estas gravações, que eram de má qualidade e eram apenas publicadas 2 a 3 dias depois de cada aula, deixou de ser lecionado o 2º turno que ainda restava, passando a existir apenas um único turno teórico para 600 alunos.
Esta UC ficou também classificada com 2 na categoria “A UC encontrava-se bem estruturada”, com 43% dos alunos a classificá-la com 1. Porém, como apenas uma das 4 componentes da Organização da UC foi considerada Inadequada, uma UC marcada pela desorganização total aparece nos QUC como meramente uma necessidade de melhoria.
Ambas as componentes relativas ao método de avaliação (ser adequado e ser justo/equitativo) obtiveram classificação 5 nos QUC, tendo tido 40% dos alunos a classificar ambas as componentes com valores inferiores a 5. Isto enquadra-se no contexto da existência de projetos com enunciados confusos e contraditórios, publicados com atraso, e de discussões de projeto marcadas e executadas sem uniformização entre docentes e turnos, assim como da não publicação dos enunciados dos exames (algo pouco pedagógico que não mudou no ano seguinte) e da insuficiência de docentes presentes na revisão de prova, para a qual havia longas filas.
Esta UC possui também docentes com classificações Inadequadas em Proveito da aprendizagem presencial, a Capacidade pedagógica e a Interação com os alunos, mas a classificação da Docência da UC é também regular. A elevada extensão do Corpo Docente desta UC talvez tenha contribuído para dispersar esta classificação.
Análise e Modelação de Sistemas – 2022/2023:
Esta UC apresenta, tal como CDI-III, resultados gerais regulares nos QUC. Destacam-se, porém, as classificações 4 e 3 na importância dada às aulas teóricas e à bibliografia sugerida, respetivamente. Os alunos, na sua maioria, acharam as aulas difíceis de acompanhar.
Todas as componentes da Organização da UC possuem classificações regulares, porém 3 delas, apesar de terem classificação 6, tiveram cerca de 30% dos alunos a atribuírem classificações inferiores a 5, ou seja, consideraram que melhorias eram necessárias.
É nesses 30% que se esconde a experiência dos alunos nesta UC: receberam indicações distintas e contraditórias sobre o projeto, a solução de referência fornecida para o projeto apresentava vários erros, não foi publicada uma proposta de solução do exame e para cada MAP30 foi disponibilizada apenas uma resolução, quando as várias versões eram muito distintas. Adicionalmente, a revisão conjunta dos MAP30 e do exame foi marcada para um período de apenas 1h, insuficiente para a revisão de 3 provas por parte de 201 alunos. O pior aspeto da revisão, porém, foi a ausência de justificação dos critérios usados e não ter sido atribuída importância às questões dos alunos sobre como formalizar um pedido de reapreciação da prova.
Apesar destes problemas, os QUC relativos ao método de avaliação mostram resultados positivos: classificação 7 na sua adequação e 6 na sua justiça e equidade. Mais uma vez, fica claro que os QUC não evidenciam a experiência dos alunos fielmente, pois tudo parece “regular”.
Em 2021/2022, os QUC de AMS apresentavam classificações um pouco superiores, à exceção da importância das aulas teóricas e da bibliografia, que ficaram avaliadas com 3 e 4, respetivamente. Todas as componentes da Organização da UC possuíam classificações regulares e superiores às que surgiram no ano seguinte. Com exceção das aulas teóricas e da bibliografia, tudo parece ter corrido normalmente, nesse ano. Porém, novamente, os QUC não refletem a falta de material de estudo autónomo, a publicação muito tardia dos detalhes das discussões de projeto (2 dias) e a pouca utilidade das aulas teóricas e práticas na preparação do projeto.
Como é expectável, a maioria das cadeiras possui algumas queixas, desde materiais de apoio que precisam de ser melhorados a avisos tardios na marcação de provas orais, mas, em geral, foram bem organizadas e apresentaram um ensino adequado.
Um exemplo positivo é Física-II. O método de avaliação desta UC foi alvo de crítica por parte dos alunos em 2021/2022 e em 2022/2023, pois não só consistia em 2 momentos de avaliação à base de escolha múltipla, sem ter em conta o raciocínio dos alunos, como também eram realizados durante as aulas teóricas, o que resultava em turnos com horários diferentes a responderem a testes muito semelhantes, colocando os alunos em desigualdade. Porém, existiram alterações – os MAP45 passaram a ser realizados fora do horário de aulas, à mesma hora para todos os alunos, e tornou-se possível submeter a resolução dos exercícios para consulta na revisão de prova, para poder ser atribuída alguma cotação a raciocínios corretos com erros de cálculo. Ou seja, houve efetivamente atenção ao desagrado dos alunos e melhoria.
Como é que isto se reflete nos QUC? Em 2021/2022 o método de avaliação estava classificado com 7 na adequação e 6 na justiça e equidade do processo, e com 5 e 6, respetivamente, no ano seguinte. Embora nenhum destes valores seja muito representativo, visto que aparecem como regulares, podem ter contribuído, apoiados pelos Relatórios do Delegado, para esta mudança positiva.
Recomendações:
Concluo esta análise dos QUC com um conjunto de sugestões que poderiam contribuir positivamente para aumentar a sua exatidão na classificação das UCs:
- Sempre que um aluno inicia o preenchimento dos QUC deveria aparecer uma breve explicação que indique o que cada intervalo de valores significa: [1,3] – Inadequado, ]3,5[ ou [4] – A Melhorar, [5, 8[ – Regular, [8, 9[ – Muito Bom e [9] – Excelente. Esta clarificação da escala (de 1 a 9) parece-me extremamente necessária. Em afirmações ao Diferencial, a maioria dos alunos de LEIC-A inquiridos (42 em 62 – 67%), quando questionados sobre que valores utilizariam nos QUC para classificar algo que “precisa de ser melhorado”, optou pelo valor 5 ou incluiu-o na sua resposta. Este resultado apoia a ideia de que os alunos podem não estar familiarizados com a escala de valores.
- Uma vez que o MEPP divide os semestres em períodos, faria sentido que os QUC também fossem preenchidos no fim de cada período. Desta forma, a avaliação das UCs de P1 e P3 seria mais justa, pois evitar-se-ia a perda de contacto com estas e a consequente diminuição do conhecimento sobre aquilo que ocorreu, pois já não terá sido meio semestre antes. Adicionalmente, seria benéfico permitir o preenchimento gradual dos QUC ao longo de cada período, para que os alunos possam ir registando aspetos positivos ou negativos que verifiquem durante a experiência das UC.
- Por fim, aumentar a transparência do IST na forma como lida com as queixas dos alunos seria certamente uma forma de provar que o preenchimento dos QUC tem alguma utilidade e que o IST está empenhado em melhorar o seu ensino. Uma forma de o fazer seria o fornecimento de algum tipo de resposta relativamente a como as situações foram avaliadas e corrigidas, através, por exemplo, de um e-mail dirigido aos delegados, o que mostraria preocupação e liderança por parte dos órgãos responsáveis.
Considerações finais:
Os QUC são um elemento muito relevante para garantir um ensino de excelência e devem ser mantidos. No entanto, para poderem ter um verdadeiro impacto e este ser visível, é necessário que o seu processo seja melhorado. Neste momento, os QUC não representam fielmente a realidade dos alunos, como foi demonstrado pelas UC analisadas. Assim, ao compreender plenamente a escala de avaliação, avaliaria o próprios QUC com 4 – A Melhorar, garantindo que não figuraria incorretamente como regular na eventual pauta de avaliação, como é frequentemente o caso.
Referências:
[1] Tabela de Resultados dos QUC por Curso de Licenciatura Bolonha para 1º semestre de 2021/2022 [Acedido pela última vez a 22/10/2023]
[2] Tabela de Resultados dos QUC por Curso de Licenciatura Bolonha para 2º semestre de 2021/2022 [Acedido pela última vez a 22/10/2023]
[3] Regulamento dos QUC [Acedido pela última vez a 22/10/2023]
[4] Resultados dos Inquéritos aos Alunos (QUC) de 2021/2022: Cálculo Diferencial e Integral III [Acedido pela última vez a 22/10/2023]
[5] Resultados dos Inquéritos aos Alunos (QUC) de 2021/2022: Bases de Dados [Acedido pela última vez a 22/10/2023]