Testemunho 1: Anónimo
Tinha 15 anos e a típica paixoneta de adolescente por um dos meus melhores amigos. Nunca pensei que fosse acontecer nada porque ele não demonstrava interesse. Fazia comentários sobre o meu peito e sobre o meu rabo, mas dizia que nunca estaria comigo porque eu era feia. Até que, um dia, mudou de ideias. Era uma sexta-feira normal de aulas, sendo que na semana seguinte tínhamos um teste importante. Então, nesse dia, eu, ele (a quem doravante nos vamos referir como M) e outro amigo combinámos ir para casa do M estudar. Tudo normal até aqui. Às tantas, a mãe dele, que nos tinha ido buscar os 3 à escola, teve de sair de casa. Ficámos os 3 e a empregada. O M então convenceu o outro amigo a ir-se embora, para que ficássemos os 2 sozinhos (a empregada estava na varanda da cozinha, pelo que era como se nem lá estivesse). E assim foi. Estávamos na sala a ver um filme e ele às tantas sugeriu que fôssemos para o quarto dele, para estarmos “mais à vontade”. Eu, ingénua e inocente, achei que ele queria uma “curte” e que efetivamente estaríamos mais à vontade no quarto dele do que na sala. Estava radiante por sentir que ele finalmente tinha reparado em mim. A “curte” realmente aconteceu. Tal e qual como estão a imaginar. Mas, de repente a mão que o M tinha na minha cintura desceu para o botão das minhas calças e começou a tentar abri-las. Eu disse-lhe que não ia avançar nada além do que já estava a acontecer naquele momento, que eu não queria mais nada. Ele sorriu, pôs-se em cima de mim, prendeu-me as duas mãos com uma das dele e disse “não tenhas medo, és a minha menina, nunca te faria mal” (ainda hoje oiço esta frase com a voz dele e ainda me arrepio), “vais ver que vais gostar”. Olhei de relance para ele e vi que já tinha as calças abertas e um pouco puxadas para baixo. Disse repetidamente que não queria que nada acontecesse, que não me sentia preparada, que não queria nada assim, nada com ele. Ele ignorou-me, conseguiu abrir-me as calças, pôs a mão dentro das minhas cuecas e tocou-me demoradamente como eu nunca quisera ser tocada por ele. E como lhe disse que não queria. Várias vezes. Nesse momento, enchi-me de raiva e, ainda hoje não sei como, ganhei força para o atirar ao chão e me levantar dali. O M estava a olhar para mim, meio confuso, a tentar perceber o que se tinha passado. Disse-lhe que me ia embora e que não é não. Ele não me deixou ir sozinha e fez questão de me acompanhar a casa. Nessa noite, mandou-me uma mensagem a dizer que tinha pensado melhor e que afinal não queria nada comigo. Nesse momento, fiquei aliviada por não ter deixado que ele levasse as intenções dele até ao fim. O outro amigo que também tinha ido lá para casa no dia seguinte veio falar comigo e disse-me “eu sabia o que ele queria fazer contigo, sabia que ele só queria sexo e sabia que o M te ia magoar, mas tinhas de ser tu a enfrentar a situação e a aprender com os teus erros”. Demorei algum tempo a entender o que aconteceu. Demorei 4 anos a conseguir contar a história. E, sem ser aqui, contei-a uma vez. Não falei com a minha família porque, honestamente, achei que teriam vergonha de mim. Não fui educada a falar de sexo, até hoje não houve nenhuma conversa sobre o tema. Sempre senti que qualquer instinto de índole sexual deveria ser reprimido ao máximo, porque “as meninas não devem ter desejo, não devem ter experiências antes do casamento, devem manter-se “puras” e “inocentes””, então aquele dia seria motivo de nojo e de vergonha para a minha família. Durante esses 4 anos passei por diferentes fases. Primeiro, não entendi mesmo que algo tinha acontecido, depois achei que era culpa minha por ter dito que não e não ter correspondido às expectativas dele, depois tive vergonha por ter deixado que aquilo tivesse acontecido, só muito mais tarde percebi que não foi culpa minha. Que ele realmente era maior e mais forte do que eu, que eu disse que não e ele escolheu não respeitar isso. Ainda hoje é algo que me afeta, mesmo nas relações mais corriqueiras. Fechei-me bastante para o mundo e tenho dificuldade em entregar-me ao outro. Por isso, mesmo aqui, não dou a cara, não dou o nome, porque tenho receio de ver a história associada a mim e de ser julgada por ser a minha história. Mas quis partilhar na mesma, porque pode haver alguém a precisar de ler isto.
Testemunho 2: Miguel
Eu estava no metro, na linha Amarela, a viajar em pé. Apesar de a carruagem estar relativamente vazia, um homem veio pôr-se mesmo ao pé de mim, não havia necessidade de estar tão perto. Achei estranho mas ignorei. Eis quando o metro dá um solavanco e a mão dele, aberta, toca nos meus genitais. Percebi que estava a fazer aquilo de propósito. Esperei que o metro chegasse à estação seguinte e saí imediatamente. Não fiz nada, fiquei só ali sem reação, sem ser capaz de encarar o homem, e nunca contei isto a ninguém. Isto já foi há uns anos, mas ainda hoje penso nesse episódio sempre que se fala de assédio e sinto-me mal por não ter reagido logo na altura, sabendo que esse homem provavelmente ainda anda por aí a fazer o mesmo a outras pessoas.
Testemunho 3: Anónimo
Estava numa discoteca com uma amiga e um “amigo” nosso conseguiu pôr-nos na zona VIP. Pensei que o tinha feito porque era meu amigo, mas afinal queria algo em troca. Passou a noite a atirar-se a mim e a oferecer-me bebidas. Tentei ignorá-lo, mas, quando estava a ir em direção ao wc, agarrou-me e pediu para me beijar. Disse “não” pelo menos 5 vezes. Tentei “fugir” mas ele continuava a agarrar-me o braço e a puxar-me. Havia várias pessoas à nossa volta, ninguém fez nada. Acabou por conseguir beijar-me. Na altura não me apercebi da gravidade da situação. Fui assediada, coagida, manipulada. “Não” é “não”. “Não” é sempre “não”.
Não é sempre não. Talvez os educadores portugueses possam rever o que motivou a primeira médica de Roma a fixar-se nos Países Baixos.
E avaliar o impacto da sua educação, ao longo das últimas 8 décadas: https://montessori-ami.org/training-programmes