Autoria: Carolina Bento, MEBiom (IST)
A indústria farmacêutica é um mercado em constante crescimento. Segundo uma análise pela The Business Research Company, este poderá valer 1170 biliões de dólares em 2021, crescendo a um ritmo de 5,8% a partir de 2017. No entanto, a confiança nesta indústria não aumenta na mesma proporção. À medida que a população envelhece e o consumo de medicamentos aumenta, a crença de que estes têm, efetivamente, o efeito desejado diminui, enquanto as queixas relativas a efeitos secundários adversos fazem o caminho inverso. Contudo, a responsabilidade não é dos medicamentos, mas da forma como são prescritos.
Neste momento, a indicação de tratamentos, bem como a dosagem dos mesmos, é realizada quase em série. Um medicamento para aquela doença e não para aquele paciente. Se resultar, ótimo. Se, pelo contrário, não for eficaz, passa-se para a segunda opção e, se necessário, para uma terceira, quarta, quinta… Este processo não é a melhor solução, dado que, tendo em conta as nossas diferentes características genéticas (que dão origem a polimorfismos, isto é, alterações de enzimas, recetores e transportadores) e diferentes ambientes, a metabolização de fármacos não é feita de forma igual em todos os organismos.
A medicina personalizada pode ser ideal para contornar todas estas questões. A definição deste conceito, de acordo com a Personalized Medicine Coalition, é a seguinte: A medicina personalizada é um campo em evolução, no qual médicos usam testes para determinar que tratamentos funcionarão melhor em cada paciente. Combinando a informação obtida a partir desses testes, com o historial médico de um paciente e ambiente, os profissionais de saúde podem desenvolver tratamentos e planos de prevenção que melhor se adaptem a cada paciente. Para concretizar este objetivo, são utilizadas ferramentas como a sequenciação do genoma, o registo do historial clínico familiar do paciente, o conhecimento do ambiente que o rodeia e a utilização de bioinformática para o tratamento de toda esta informação.
Este novo método de exercer medicina pode contribuir para o diagnóstico precoce e prevenção de doenças, como cancro ou doenças neurodegenerativas, através do conhecimento da informação genética de cada indivíduo. Para além disso, pode contribuir para uma melhoria no desenvolvimento de fármacos e, consequentemente, melhor prescrição dos mesmos, tendo em conta subgrupos de pacientes com expressões genéticas semelhantes. Pode, ainda, contribuir para uma diminuição das despesas dos serviços nacionais de saúde, bem como, das seguradoras, já que a medicina estaria em primeira instância focada na prevenção e não na reação a uma condição. Por fim, a diminuição dos riscos de efeitos secundários e um aumento da eficácia dos medicamentos contribui para a diminuição de admissões em urgências hospitalares e internamentos.
Há, porém, questões que podem impedir ou abrandar o desenvolvimento desta área. Atualmente, já existe uma exploração dos nossos dados pessoais por grandes empresas. É importante questionar a proteção da privacidade do genoma de cada indivíduo, que, se conhecido por entidades sem o seu melhor interesse em mente, pode ser utilizado para efeitos de marketing ou até de monitorização e segmentação de cidadãos por regimes autoritários, por exemplo, em processos eugénicos ou de limpezas raciais. Além disso, dado que grande parte dos responsáveis por análise genómica se localizam nos países desenvolvidos, a medicina personalizada pode expandir o rifte entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento, em termos de acesso a cuidados de saúde.
Considerando que os benefícios ultrapassam os riscos, ou assumindo que é possível contorná-los, para tornar esta área viável é necessário começar por se estabelecer colaborações entre o mundo académico e o mundo empresarial, estimulando a participação do mercado privado na investigação deste campo. De grande relevância é, também, o desenvolvimento precoce de regulamentação que permita conciliar a proteção do paciente com o estímulo à investigação.
Concluindo, a medicina personalizada apresenta-se como uma esperança no combate às doenças que mais tememos na atualidade, uma esperança pela qual vale a pena lutar.
Referências:
- The Business Research Company. (12 de Fevereiro de 2020). The Growing Pharmaceuticals Market: Expert Forecasts and Analysis. Obtido de Market Research.com;
- Hamburg, Margaret A., and Francis S. Collins. “The path to personalized medicine.” New England Journal of Medicine 363.4 (2010): 301-304;
- Ginsburg, Geoffrey S., and Huntington F. Willard. “Genomic and personalized medicine: foundations and applications.” Translational research 154.6 (2009): 277-287;
- Laurence, Jeffrey. “Getting personal: the promises and pitfalls of personalized medicine.” Translational Research 154.6 (2009): 269-271;
- Sadée, Wolfgang, and Zunyan Dai. “Pharmacogenetics/genomics and personalized medicine.” Human molecular genetics 14.suppl_2 (2005): R207-R214;
- Ginsburg, Geoffrey S., and Jeanette J. McCarthy. “Personalized medicine: revolutionizing drug discovery and patient care.” TRENDS in Biotechnology 19.12 (2001): 491-496;
- Alyass, Akram, Michelle Turcotte, and David Meyre. “From big data analysis to personalized medicine for all: challenges and opportunities.” BMC medical genomics 8.1 (2015): 33;
- Personalized Medicine Coalition. (12 de fevereiro de 2020) Obtido de Personalized Medicine Coalition.