Quebra no Índice de Procura das licenciaturas: crise no IST e nas engenharias?

Autoria: João Carranca (LEEC)

O Índice de Procura do IST, calculado com base nos dados do concurso nacional de acesso, está em queda há vários anos, tendo passado de cerca de 1.4 em 2018/19 para 1.15 em 2022/23, apenas 5 centésimas acima da média nacional. Outras faculdades de engenharia, como a FCT-NOVA (Faculdade de Ciências e Tecnologia da NOVA) ou a FCUL (Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa), também possuem índices de procura muito abaixo de outras faculdades das universidades a que pertencem sem perspectivas de melhoria futura. Quais as razões para este fenómeno?

Há décadas que os cursos de engenharia estão no topo dos índices de empregabilidade e primeiro salário. Por essa razão, historicamente, trata-se de uma área com grande procura e médias de entrada bastante elevadas. Faculdades como o IST ou a FEUP (Faculdade de Engenharia do Porto) sempre se notabilizaram pela sua capacidade de atrair e reter os melhores alunos do país. No entanto, o Índice de Procura, uma métrica calculada dividindo o número de candidatos em primeira opção a uma determinada instituição pelo número de vagas totais, está há vários anos em declínio no IST, encontrando-se atualmente no valor de 1.15, marginalmente acima da média nacional. É uma quebra notável, mas é também notável o facto de faculdades como a NOVA FCT (Faculdade de Ciência e Tecnologia da NOVA) ou a FCUL (Faculdade de Ciência da Universidade de Lisboa) já possuírem valores deste tipo há vários anos. 

A situação contrasta com a realidade em áreas como Direito ou Economia. A NOVA SBE (School of Business and Economics), por exemplo, em 2022/23 apresentou um índice de procura de 2.17. O ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão), pertencente à UL, apresentou um valor de 1.6. A FDUL (Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) apresentou 1.4. É verdade que as faculdades nestas áreas, por natureza, possuem uma oferta mais reduzida em termos de número de cursos e também de vagas. A título de exemplo, o IST apresentou em 2022/23, 1589 vagas na primeira fase de colocações, valor muito superior às 540 na FDUL. Apesar disso, há 5 anos, a ideia de cursos como Engenharia Electrotécnica e de Computadores não encherem as vagas na 1ª fase de colocações seria difícil de imaginar. 

Os números traduzem esta percepção: em 2018/19, a FDUL estava numa situação semelhante à descrita para 2022/23 com um índice de 1.5, enquanto o ISEG apresentava um valor de 1.2 para 431 vagas. O IST, por outro lado, apresentava índices de 1.5 para mestrados integrados e 1.4 para licenciaturas para 1438 vagas totais.

O desaparecimento dos mestrados integrados parece ter sido um fator decisivo, tendo talvez para muitos retirado apelo a alguns cursos. O presidente do IST, Rogério Colaço, aponta outros fatores que julga dificultarem a obtenção de valores fortes nos índices de procura atualmente.

“Nós, no ano passado, tivemos pouco menos de 60 mil candidatos ao ensino superior, no país todo. A nossa oferta global no país de vagas no ensino superior foram 55 mil, enquanto que há 10 anos tínhamos quase o dobro de candidatos para estas 55 mil vagas. O país tem uma capacidade instalada de oferta que cresceu sobretudo neste século, mas o número de candidatos está a encolher, porque o número de nascimentos está a encolher.”

Para além da demografia, o Presidente do IST aponta para a quantidade de oferta de ensino superior que há em Lisboa em comparação com outras regiões do país e para o elevado custo de vida da capital.

“As instituições da capital, como o Técnico, a Universidade de Lisboa no seu total, a Nova, o ISCTE, são, neste momento, fortemente penalizadoras para os seus estudantes, porque o custo de vida na cidade é muito elevado.”

Para tentar corrigir esta desvantagem, o IST tem tentado aumentar o alcances das bolsas que atribui, cobrindo atualmente cerca de 100 estudantes, um número que o Presidente gostaria de ver aumentar: “Se tivéssemos mais 100 ou 200 [bolsas], teríamos, com certeza, candidatos que as mereceriam muito.”

Admite, no entanto, que parece haver uma diminuição da procura pelas chamadas áreas STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics):  “Há uma redução do interesse por áreas da ciência e da engenharia. Estão a perder competitividade em termos de atração para as áreas de gestão e as áreas de humanidades. Não tenho uma boa explicação para isso, talvez nós estejamos a falhar um bocadinho na nossa motivação de pessoas. Não sei se é isso que está a falhar ou se são outros fatores, é difícil responder, mas é uma pergunta que surge na Europa por exemplo nos encontros das universidades.”

O motivo para a quebra de procura pela oferta de primeiro ciclo do IST é provavelmente uma concatenação de todos estes fatores e outros não aqui abordados. O problema ou conjunto de problemas neste âmbito não têm solução trivial pelo que caberá à atual administração e seguintes fazer os ajustes estratégicos necessários caso exista a intenção de tentar contrariar esta tendência.

Nota: As declarações do Presidente do IST aqui citadas provêm de uma entrevista conduzida pelo Diferencial em maio de 2024.

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