Inteligência Artificial: As Empresas [4/7]

A dimensão protagonizada pela Inteligência Artificial regista, na atualidade, impacto nos principais alicerces da sociedade, nomeadamente, na economia. Neste artigo, pretende-se expor algumas premissas importantes na adaptação das empresas a esta evolução económica.

Autoria: João Valério, MECD

O percurso que a Inteligência Artificial (AI) percorreu ao longo dos anos permitiu que, nos dias presentes, exerça influência nas principais bases sociais, em particular, na economia, carecendo de uma necessidade de adaptação por parte das empresas, por forma a acompanharem a recente corrente económica.

A economia é definida como “(…) o estudo da forma como as sociedades utilizam recursos escassos para produzir bens e serviços com valor e para os distribuir entre indivíduos diferentes.”. A AI tem o potencial de mudar drasticamente a economia (FURMAN, Jason; SEAMANS, Robert, 2018), permitindo recorrer aos recursos [1] da recente evolução tecnológica e efetivar bens e serviços inovadores a um nível que o ser humano sozinho não alcançaria. Face ao descrito, revela-se essencial nas empresas uma mudança de paradigma, uma vez que é necessário adotar uma estratégia interdependente homem-máquina, que permita acompanhar a potencial evolução do setor em que se inserem.

A título de exemplo, um estudo realizado pelo McKinsey Global Institute estimou que, até 2030, a AI poderá gerar um valor anual de 13$ triliões [2] no crescimento do PIB [3] dos EUA. Assim, projetando esta estimativa à escala global depreende-se que seria imprudente, principalmente por parte dos grandes monopólios, negligenciar os impactos da mesma. De acordo com o mencionado, delinear o passo estratégico para a inserção da AI revela-se importante e, igualmente, desafiador. No artigo AI Transformation Playbook, Andrew Ng sintetiza este processo gradual em cinco passos fundamentais.

  1. Executar projetos piloto para ganhar impulso.
  2. Criar uma equipa interna de AI.
  3. Fornecer conhecimento em AI nos diversos patamares da empresa.
  4. Construir uma estratégia de aplicação da AI na empresa.
  5. Desenvolver comunicações internas e externas. 

Ainda que esta sequência seja, aparentemente, bastante geral e teórica, aborda mais valias úteis com capacidade de adaptação aos diferentes tipos de empresas e setores. Por forma a complementar a informação exposta, exploram-se algumas bases de cariz relevante a considerar na elaboração de uma estratégia empresarial.

  1. Em primeira instância, tal como já foi aludido, para que os resultados sejam os ambicionados é fulcral existir uma visão global correta sobre AI nas diversas estruturas hierárquicas da empresa. Particularmente, Emma Martinho-Truswell sugere que existem “(…) três perguntas importantes a que qualquer membro da (…) equipa deve ser capaz de responder: como é que funciona a Inteligência Artificial? O que é que ela faz bem? E o que é que nunca deve fazer?”
  2. Adicionalmente, esta não apresenta a capacidade, ou não é totalmente adequada, para solucionar todo o tipo de problemas; é necessário ser realista quanto às suas competências ao nível técnico e às suas limitações de recursos, dado que “Qualquer economia tem uma massa limitada de recursos (…).”. Logo, o potencial da AI não desvirtua a contínua exigência dos três desafios de uma organização económica [4]. É poderosa, sim, mas não é mágica (BERINATO, Scott, 2017).
  3. Por conseguinte, revela-se vital a existência de uma associação entre os setores de negócios e de engenharia, por forma a que a simbiose destes permita exponenciar os resultados, através dos pontos comuns entre o que a AI pode fazer (Technical Diligence [5]) e o que é valioso para a empresa (Business Diligence  [6]). Para além do referido, as implicações éticas da gestão [7] (Ethical Diligence [8]) também devem apresentar um peso significativo nas tomadas de decisão neste ramo. 
  4. Por fim, tendo em conta a sua diferenciabilidade enquanto campo científico, a inovação que transporta consigo incitará, certamente, ruturas em algumas filosofias inerentes ao modelo empresarial. Contudo, tal como é constante nas grandes empresas, é necessário compreender o que o seu carácter evolutivo pode acrescentar.

Para além dos conceitos mencionados, compreender as diferentes formas de melhorar os resultados algorítmicos (outputs) é essencial para o sucesso da empresa. De um ponto de vista geral, existem três pontos que permitem obter melhores proveitos:

  1. Melhorar o algoritmo, tornando-o mais sofisticado.
  2. Adicionar mais e melhores dados, em função do objetivo pretendido.
  3. Aumentar a velocidade de teste, para que os resultados surjam mais rapidamente.

Assim, por razões técnicas ou de limitação de recursos, a solução do primeiro ponto nem sempre é a mais viável, ainda que intuitivamente possa parecer. Por exemplo, Joaquin Candela, uma figura importante na Meta [9], obteve resultados bastante positivos ao entender, em 2012, que a decisão mais fiável para a empresa passaria pela combinação das restantes opções (2 e 3). Contudo, este tipo de visão apenas é possível com o adequado conhecimento da área e pragmatismo na análise, características que Candela possuía.

Ainda que não seja objeto de discussão deste artigo, denota-se que a inserção da AI numa empresa ultrapassa as razões e consequências económicas. Por exemplo, uma das grandes preocupações sociais abrange a questão da empregabilidade, que, à semelhança das anteriores revoluções industriais, continua a sofrer modificações. Portanto, a sua integração é um exercício para ser efetuado com total abrangência de consciência social.

Por fim, a significativa influência económica da Inteligência Artificial na atualidade continua a aumentar, exigindo a constante adaptação por parte das empresas; no entanto, ressalva-se que as suas influências sociais superam as razões económicas, requerendo no seu íntimo uma total adaptação social consciente visando valores éticos e morais.


Referências:

[1] Os recursos referidos são, essencialmente, capacidade computacional, dados e computação em nuvem.

[2] Equivalente a cerca de 11.8€ triliões, à data de publicação do presente artigo.

[3] O PIB é um acrónimo indicativo para produto interno bruto. Este representa, durante um período de tempo, o valor total produzido de bens e serviços num determinado país.

[4] Os três desafios de uma organização económica são “(…) escolher entre diferentes conjuntos de bens potenciais (‘o quê’), selecionar entre as diferentes técnicas de produção (‘o como’) e decidir, no final, quem deve consumir os bens (‘o para quem’).”

[5] Technical Diligence representa a parte do projeto em que se pretende compreender alguns pontos de cariz técnico, como por exemplo: a possibilidade de atingir um determinado nível de resultados, a quantidade de dados necessários, a capacidade computacional requerida e o tempo de desenvolvimento.

[6] Business Diligence, por sua vez, diz respeito à fase do projeto na qual são abordadas questões no campo negocial, tais como: os custos no seu desenvolvimento, as possíveis futuras receitas ou benefícios e os desenvolvimentos do mercado.

[7] Ramo da ética que analisa os problemas e dilemas criados pelas práticas de gestão, como, por exemplo, as responsabilidades sociais da empresa, os limites adequados à competição aceitável, o equilíbrio entre as obrigações incompatíveis para com os acionistas e os clientes e a extensão e limites da lealdade empresarial (BLACKBURN, Simon, 1997).

[8] Ethical Diligence pretende preservar o conjunto de princípios e valores morais de um grupo ou individuo.

[9] Empresa anteriormente denominada por Facebook.

Bibliografia:

  • BLACKBURN, Simon (1994) – The Oxford Dictionary of Philosophy. 1ª ed. Oxford: Oxford University Press. Pág. 145.
  • SAMUELSON, Paul; NORDHAUS, William (2010) – Economics. 19ª ed. New York: The McGraw-Hill.
  • SERRANO, Maria et al. (2013) – Um retrato das Instituições Sociais na Sociedade Contemporânea. Évora: Reprografia da Universidade de Évora.
  • BRYNJOLFSSON, Erik; MCAFEE, Andrew (2017) – The Business of Artificial Intelligence. Massachusetts: Harvard Business Review.
  • BERINATO, Scott (2017) – Inside Facebook’s AI Workshop. Massachusetts: Harvard Business Review.
  • CHUI, Michael et al. (2018) – Notes from the AI frontier: Insights from hundreds of use cases. Washington, D.C.: Mckinsey Global Institute.
  • MARTINHO-TRUSWELL, Emma (2018) – 3 Questions About AI That Nontechnical Employees Should Be Able to Answer. Massachusetts: Harvard Business Review.
  • FURMAN, Jason; SEAMANS, Robert (2018) – AI and the Economy. Volume 19. Chicago: University of Chicago Press Journals. Pág. 185.
  • OLIVEIRA, Arlindo (2019) – Mentes Digitais: A Ciência Redefinindo a Humanidade. 3ª ed. Lisboa: IST PRESS.
  • NG, Andrew (2020) – AI Transformation Playbook. California: LANDING AI.

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