Crónica de Começo do Ano Letivo do Alfredo Malsaúde

Autoria: Alfredo Malsaúde (MEC)

Excelentíssimos, Digníssimos e outras palavras cerimoniosas terminadas em -íssimos,

Sejais, pois, muito bem vindos a mais um ano no grandiosíssimo e afamadíssimo Instituto Superior Técnico.

Se não me conheceis, exprimo o mais profundo desagrado com tamanha ingratidão… (Alfredo, tem um mínimo de decoro e pára com as tuas lamúrias, tens coisas importantes para contar e queres ser ouvido). Deixar-me-ei destas coisas, passando ao que me proponho fazer, qual Proposição d’Os Lusíadas: Eu, Alfredo Malsaúde, estudante de Mestrado em Engenharia Civil, manifesto a minha intenção de melhorar o bem-estar dos que estudam aqui, no Magnânimo Instituto. E como desejo fazê-lo? Pois bem, pelo meio que mais ajuda os estudantes, a entidade que maior representa os seus interesses: através da Associação de Estudantes.

Com isto, não venho apresentar a minha candidatura à presidência da Associação de Estudantes, nada temeis, bem sei que a coligação “Lista 1 e Malsaúde” atingiria mínimos históricos de abstenção, eu ambiciono apenas uma colaboração. Sabeis que um novo ano letivo implica grandes e importantes mudanças: novos artistas no afamado Arraial do Técnico, nova presidência da AE, descida das taxas de aprovação a Cálculo II… (Alfredo, cala-te, age como um cavalheiro progressista e conta aos excelentíssimos mais sobre as tuas ideias inovadoras.)

A minha primeira ideia prende-se, nem mais nem menos, com a criação de mais festas e churrascos, mas no TIC. No TIC, indagais? Só eventos de tamanho monumental, como o Campeonato Europeu de Futebol Masculino, é que permitem que este espaço esteja aberto após as 20h; com festas neste espaço, existiria a possibilidade de um malandro ou outro escapar-se para estudar para um MAP entre duas cervejas. Festas condicionadas pelos elementos? Não, não, deixai-vos embalar pela climatização do ar condicionado. Transporte? Os mais sóbrios ou aventureiros podem arriscar as bicicletas, os mais tocados podem sempre optar pelo metro do Saldanha, escusam de descer a Alameda aos tropeções. Bebidas e Comida? É apenas uma questão de criar um novo espaço de churrascos no Arco do Cego e de colocar as organizações a fazer uma perninha para fazer aumentar o horário do Jero—-. Não me peçam para escrever o nome da cadeia, não me pagam para fazer publicidade. 

Sejamos sinceros, já ninguém aguenta aquele cheiro a fermentação que se sente a caminho da Secção de Folhas.

Se faltassem razões para continuar a ler as minhas propostas, tal como explicado pelo estimado Bombarda, as novas limitações em termos de horários do Pavilhão de Civil podem levar a uma nova rúbrica mensal no nosso jornal, onde são apresentados os melhores cantos para urinar e as áreas que mais precisam de ser regadas. Por uma questão de saúde pública, não querereis que os estudantes urinem num canto escuro! Para urinar num beco qualquer já bastam as estações do Oriente e do Campo Grande. Como é que este contratempo pode ser resolvido? Nem mais, o TIC está equipado com instalações sanitárias. E é assim que, pela segunda vez, alguém escreve um termo associado a “urinar” neste jornal. (Alfredo, um pouco de classe, pode ser?)

Se esta proposta não fosse por si só excelente, nada temeis que Malsaúde volta a atacar.

No final de junho, foi divulgado que o abandono após o primeiro ano da licenciatura em 2022/2023 foi o mais elevado nos últimos oito anos, estando a descer consecutivamente há quatro. Umas semanas mais tarde, o Observatório Social da Fundação “la Caixa” divulgou o resultado do estudo Factores que influenciam o abandono no ensino superior, salientando a exaustão, maus resultados académicos e reduzido sentimento de pertença como fatores de riscos. 

A vós exalto: quem nunca pensou em desistir, que atire a primeira pedra. (Ao fundo, ouvem-se sons de pedras a serem arremessadas, partindo vidros.) Parece-me que há algum descontentamento das massas estudantis, pois bem, agora que as obras no pavilhão da Associação de Estudantes estão a terminar, realmente são necessários outros edifícios que condizam com o estado de espírito dos estudantes. Não estou certo de que os problemas de humidade nos anfiteatros do Central ou a falta de tomadas em Civil exprimam corretamente o estado de espírito dos estudantes.

(Alfredo, não agoires, assustas as crianças recém chegadas.) Meus caros, olhai bem para elas, ainda felizes, com a ânsia de aprender a brilhar nos olhos. Umas semanas e começareis a ver o desespero a apoderar-se delas, ao descobrirem que as sete semanas que constituem um quarter passam depressa, quando prefereis dedicar-vos a descobrir a recém alcançada liberdade.  

Se a minha primeira proposta já ia ao encontro de aumentar o sentimento de pertença, a segunda é mais inovadora, juntando saúde mental e integração. Diria até que é uma proposta um pouco mais empreendedora, como se me estivesse a preparar para o meu primeiro trabalho numa consultora. 

Caso não sabeis, serei mais uma vez a voz da razão que vos elucida: por vezes, no espaço dos churrascos, realizam-se convívios organizados por outras faculdades. Ó Alfredo, és tão sapiente, como é que tens acesso a tais informações? Um cavalheiro como eu está sempre bem informado, com convites da Alta Sociedade da Piela, que é como quem diz, sou frequentador destes convívios, o que na realidade significa que vejo o que é partilhado nas redes sociais por algumas damas e cavalheiros que conheço.

Agora que o contexto está dado, passo à proposta: alugar o espaço a diferentes faculdades, não só a Enfermagem e a Medicina. E porquê, perguntais? Se, por um lado, é promovida a integração entre diferentes faculdades, é também criada a possibilidade de criar pequenos estágios para alunos de alguns cursos. Passo a explicar, um aluno de Mecânica apresenta alguns problemas a nível da sua saúde mental, não dorme há três dias para conseguir entregar um projeto e, para além disso, o seu gato está com insónias. Antes de ir para casa, depois de entregar o projeto, passa por um churrasco de alunos de Psicologia. Chega, conversa com um, conversa com outra, e pronto, poupou 65 euros numa consulta de psicologia. No dia seguinte, passa por uma nova festa, desta vez de Medicina Veterinária, usa a mesma tática e sai do IST com a receita para tratar o Tareco. Na noite seguinte, ainda bem que já era sexta feira, entra no churrasco de Ciências Farmacêuticas, curiosamente ainda leva a receita dos medicamentos para o Tareco, e, no final da noite, já está na posse de tudo o que precisava. 

Assim poupa-se, que a vida em Lisboa está proibitiva, aumenta-se a integração e promove-se a saúde mental. 

Isto sim, seria o verdadeiro associativismo estudantil.

Bom ano, passem a Cálculo, não interessa a qual, de preferência a todos. 

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