Crónica de verão

Autoria: Francisca Branco (LEAer)

Julho e agosto são sinónimos de descanso. Acabou o interminável e sofrido semestre e as férias de verão afinal não eram o oásis que tanto pareceram. Está, finalmente, na hora de transitar das salas do pavilhão de civil para o areal branco e trocar o som de dois colegas de grupo a acabar um projeto, que deixaram para a véspera, pelas ondas do mar a rebentar na areia – abençoadas praias portuguesas. 

Chegar, escolher um lugar suficientemente longe da água, para que o nosso protagonista não tenha de se mexer quando a maré subir, mas suficientemente perto de modo a que não sinta que está a caminhar numa chapa de metal ao atravessar a praia sempre que quer ir dar um mergulho. Abancar. Construída a banquinha, finalmente estende a toalha do CR7 e deita-se ao sol. E agora o que fazer?

Há quem seja o jogador profissional de cartas, que se recusa a jogar com outro baralho que não o seu, já com as manchas das cartas memorizadas, pronto para desmascarar quem tenha a manilha de trunfo. Já outros reveem-se mais no atleta olímpico, que, assim que vê os amigos a montar o chapéu, começa logo a desenhar os limites do campo de futebol de onde não vai sair a tarde toda, nem quando os colegas de equipa lhe deixarem de passar a bola por o terem confundido com um turista inglês, dadas as semelhanças dermatológicas. Felizmente, neste grupo de amigos havia os dois.

Escolhidas as vítimas prontas a acompanhar os mais conservadores no que toca às suas rotinas na praia, o nosso amigo pode lembrar-se do livro que tem na mesa de cabeceira, que comprou na feira do livro do ano anterior, mas que com o aperto da faculdade não teve tempo para acabar. Devia tê-lo trazido. Decide experimentar a cadeirinha que o Miguel trouxe e não usou, por ter sido arrastado para o torneio de sueca, e vê que até é jeitosinha. Fica por lá uns breves momentos a mirar as gaivotas e a tentar ler as mensagens que as avionetas mostram no ar, lutando com os raios de sol que batem em Carcavelos às quatro da tarde e que encadeiam qualquer um que ouse pousar os óculos de sol. 

Começa a sentir o calor e levanta-se da cadeira para ir molhar os pés. Avança com confiança para o mar, ao aperceber-se que está a ser alvo de uns bons olhares por parte de outros banhistas. Devem estar a reparar nos resultados da sua inscrição no ginásio no mês passado, e não na tatuagem que o sol imprimiu na sua pele com o formato das costas da cadeira – confia, amigo. 

À medida que se aproxima do mar, começa a sentir o ambiente mais fresco. Afinal nem está assim tanto calor, vai só molhar os tornozelos e regressa já à cadeira para deixar o sol terminar o seu trabalho. Quando ganha coragem para avançar na água, chegam os maratonistas, que se devem ter perdido da Ponte 25 de Abril, e que estão dedicadíssimos a chegar ao Brasil a nado. Quais maratonistas quais quê, eram os amigos a vingar-se do nosso protagonista ter conseguido escapar ao 5×5 do Pedro, que já devia estar a começar a ganhar sotaque britânico pelo andar da carruagem. Lá lhes chama uns nomes por o terem enchido de água gelada, mas parece que foi o suficiente para o fazer regular a temperatura corporal. Regressa, então, à toalha.

Que fome, ein? Sabia que devia ter ouvido a avó, que lhe disse para fazer uma sandes de pasta de atum, que era a sua favorita quando ele era pequeno e que se preparava num instante. Chama os amigos para o acompanharem numa bola de berlim e numa cerveja – música para os seus ouvidos universitários. Lá acabam todos o banquete, rindo-se dos vestígios de açúcar que guardam nos lábios para comer mais tarde. 

Com isto, já começa a levantar-se uma brisa, veste a camisola de curso. Lá concorda em substituir o Henrique no jogo de futebol, que passou para futevólei e, por muita insistência do nosso amigo, acabou a transição para voleibol. Começam o jogo, e o Pedro já começa a dizer que o campo adversário é mais pequeno. Isto vai correr bem. No meio de uns reflexos que se lembra de educação física do secundário, lá consegue trazer uns pontos para a sua equipa, mas sem nunca antes passar por um processo de negociação com o Pedro. Nota-se logo que era aquele que reclamava quando tinha de escolher uma rapariga para a sua equipa e que fez um abaixo assinado para educação física contar para a média.

Findo o jogo, lá se reunem os amigos prontos para apanhar o comboio de regresso. No meio de planos para o jantar, começam a planear uma viagem à costa vicentina, sabendo muito bem que assim que outro tema de conversa for puxado nunca mais ninguém se lembra da roadtrip. Iniciam a longa reta até à estação a comentar o fim dos domingos a um euro dos 100 Montaditos e acabam a comparar o tempo que demoram a chegar às suas terras natal a partir de Lisboa – uma troca de tópicos casual. Chegam à estação e conseguem passar a cancela dois a dois, já que àquela hora o pica fecha os olhos bem fechadinhos por não ganhar o suficiente para se preocupar. Aliás, até já sabia qual o destino dos nossos amigos. Chegam à plataforma e ouvem a maravilhosa cantiga: o comboio foi suprimido.

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