SELF HELL- While She Sleeps (Crítica pouco séria)

Autoria: Ângela Rodrigues (LEFT) 

Nota introdutória: Existem alguns estigmas associados ao género de música metal. Penso que seja uma experiência comum a muitos metaleiros ouvir as palavras “Mas tu gostas disso? Isso não são só gritos?”. O metal vai muito além do estereótipo dos gritos. 

Não tendo qualquer formação musical, tentarei imitar, de forma ridícula, revistas dedicadas à música, para mostrar aos retrógrados e mentes fechadas que há muita diversidade neste género. 

Resumindo, não passa de uma crónica algo jocosa de uma aficionada musical sem qualquer tipo de competências para avaliar música (ou a minha tentativa desajeitada de ser a primeira alumna do Técnico contratada pela Kerrang!).

No dia 29 de março, os britânicos While She Sleeps lançaram o seu 6º álbum, “SELF HELL”, editado pela sua gravadora, Sleeps Brothers, em colaboração com a finlandesa Spinefarm Records. Tal como aconteceu com “Sleeps Society”, lançado em 2021, a produção esteve a cabo de Carl Brown e Sean Long, guitarrista principal da banda [1].

Tal como explicado por Loz Taylor, vocalista, e Sean Long, o título “SELF HELL” surge da necessidade de escrever self hel (adicionando um “l”, auto inferno) para escrever self help (auto ajuda), o que sugere que, para a chegar a bom porto, é inevitável passar por adversidades. De acordo com Loz, é preciso sair da zona de conforto, enfrentar os desafios, para poder voltar e descobrir quem somos e o que queremos mudar, o que parece resumir o ponto para onde a banda se dirige [1].

Isto leva os nossos críticos a crer que este álbum segue a temática da saúde mental e batalhas interiores com as vozes nas nossas cabeças, introduzida no álbum anterior em faixas como “EYE TO EYE” ou “THE ENEMY IS THE INNER ME”. (Por favor, não nos peçam para explicar a panca com a capitalização… e pensar que são artistas independentes, que criaram a sua gravadora por ansiarem por liberdade e não acreditarem numa visão capitalista [viram o que fiz aqui com capitalização e capitalismo? Desculpem, vamos já despedir o estagiário responsável por isto]).

O quinteto de Sheffield não se deixa definir por um género e este álbum vem, mais uma vez, mostrar que estão sempre prontos a quebrar as barreiras e a redefinir o seu som, misturando metalcore, hardcore, nu metal dos anos 00’s e eletrónica, sem se preocuparem com a opinião do público.

O álbum é composto por 12 faixas, analisadas detalhadamente em seguida.

1 – PEACE OF MIND

Antes de mais, não se deixem induzir em erro pelo título, estão a ouvir o disco correto, não se trata de “THE DEATH OF PEACE OF MIND”, dos Bad Omens.

Nesta primeira música, o ouvinte é quase levado a um momento gospel, começando por ouvir um coro. Mas podíamos querer uma faixa introdutória melhor do que algo que se assemelha a um coro a pedir inspiração aos deuses do metalcore, quais Tágides?

Caso restassem dúvidas quanto à relação entre self hell e self help, “I can do anything, you can do anything”, parece esclarecer o ouvinte.

I speak from experience even if glass half-full equals you’re/ empty-handed in the eyes of our establishment/ Stuck in the wrong place with the right mind should I feel like I’m/ knocking for are you thеre?

2 – LEAVE ME ALONE

Se houvesse questões sobre que banda estamos a ouvir, a primeira coisa ouvida é “We are While She Sleeps”. Com a sonoridade furiosa a que o público já está habituado, os rapazes de Sheffield mostram que não estão para brincadeiras e que receberam a inspiração pedida na faixa anterior. 

O ouvinte mais atento pode encontrar algumas influências de Linkin Park, tanto na letra como na forma, que poderia dizer-se ser quase uma irmã de “One Step Closer”, parecendo até que, após o primeiro refrão, entra um Mike Shinoda com sotaque britânico. 

A partir de 1:30, surgem elementos de eletrónica (sons de robots), que começam, em conjunto com a percussão de Adam Savage, a preparar o ouvinte para o chamado breakdown; assim que Loz Taylor grita “Leave me the fuck alone”, surge o instrumental de “ANTI-SOCIAL”, que transporta alguns dos nossos redatores a 2018, quando ouviram a banda pela primeira vez. 

Sejamos honestos, muitas vezes nem somos “anti-social”, somos “anti-bullshit”, e só ambicionamos um pouco de silêncio e que nos “Leavem” “the fuck alone” (não sabemos de onde estão a vir estas piadas, problemático, talvez tenhamos de despedir alguém).

Imagine there’s a doorway leading to wherever you need it to take/ For the days where you feel like you need to escape/ For the black clouds pouring over your endorphins (…) I let these things get under my skin/ It’s getting me nowhere/ I’m shivering with adrenaline

3 – RAINBOWS

Se a nossa redação pudesse utilizar uma palavra para descrever While She Sleeps, provavelmente seria: sons de robots, tentativa de contacto com vida extraterrestre, riffs soberbos, letra extremamente triste e depressiva a anteceder um breakdown gigante (Esperem lá, isto foi mais do que uma palavra). 

“RAINBOWS” adequa-se perfeitamente a esta descrição, combinando algo que poderia fazer parte do quarto álbum da banda, “You are We”, com a arte guitarrística a que o público já está habituada e com alguns elementos a retirar inspiração das músicas mais recentes de Bring Me The Horizon. 

A repetição de “black holes” e “rainbows” leva a nossa equipa a pensar que pode existir algum interesse da banda, até agora desconhecido do público, em Física, especialmente em fenómenos ondulatórios.

Don’t know what it is, don’t know what it wants/ Something’s wrong, the highlights of a lowlife leaving us/ Something’s gotta give, something’s got a break/ We all take the light for granted when we’re smothered in

4 – SELF HELL

A faixa que intitula o álbum foi a primeira a ser revelada, sendo conhecida desde setembro do ano passado. Há uma clara quebra, quando comparada com as músicas anteriores, quase como a antecipar uma mudança do metalcore depressivo a que o ouvinte está habituado para um nu metal a lembrar Limp Bizkit. De facto, assim que o instrumental começa é quase possível imaginar Fred Durst a dançar (aconselha-se ao leitor a visualização do videoclipe de “Rollin’”).

Baseando-nos nos comentários de muitos fãs, “SELF HELL” não foi do seu agrado, achando a letra ridícula, no entanto, os redatores deste mui nobre e conceituado jornal consideram a letra muito bem elaborada, com um caráter extremamente irónico, que talvez não seja compreendido por todos os ouvintes. Nas primeiras audições, uma das redatoras encontrou alguns paralelismos com a ironia de “vai ficar tudo bem” presente em “Happy Song”, de Bring Me The Horizon:

Let’s praise the love/ Take it as it comes, there’s enough misery for everyone
But if we sing a along, a little fucking louder to a happy song, maybe we’ll forget

Como o leitor já deve ter compreendido, esta redação adora entender que vem aí um breakdown (os outros amantes de metalcore sabem a que nos referimos) e “SELF HELL” não desaponta, com Loz Taylor a gritar “I DON’T GIVE A FUCK WHAT YOU SAY ABOUT ME”. Os rapazes de Sheffield já não estão preocupados em fazer o melhor metal possível, mas um metal que responda às necessidades dos ouvintes, que muitas vezes só querem ser ouvidos.

Para análise do videoclipe, recorremos ao nosso departamento de imagem e marketing: 5 homens perderam a cabeça numa loja de roupa em segunda mão, que, por acaso, tinha promoções em gel para cabelo e pessoas a dançar.

Never been so surrounded but felt so alone/ Never been so named but I’m still unknown/ I’ve been coughing up blood in case you didn’t know/ I don’t give a fuck what you think of me

5 – WILDFIRE

Agora que já ficou estabelecido que While She Sleeps não se importam com o que pensam sobre eles, a onda nu metal é cortada e surge uma melodia a relembrar os bons tempos de “So what?”, terceiro álbum da banda.

Não podemos parar de salientar a qualidade dos guitarristas Sean Long e Mat Welsh, que, em conjunto com o baixista, Aaran McKenzie, criam um ambiente perfeito para estabelecer contacto com vida extraterrestre ou com o sobrenatural, se analisarmos as palavras escritas banda e entoadas por Loz: “If I were a ghost/ Would you still look through me?”.

Há uma perdição por Long nesta equipa, pelo que é impossível não destacar o seu solo entre 2:22 e 2:42, cujo único defeito é não ser mais long(o). 

I dreamt that they we escaped here/ Left the surface and drifted away/ The heavy low was nowhere/ I couldn’t see, I couldn’t feel a thing

6 – NO FEELING IS FINAL

Esta faixa, a primeira das três colaborações presentes no álbum, em colaboração com Aether (um artista japonês de eletrónica, descoberto pela banda durante o confinamento) é perfeita para quem pensa que metal se resume a gritos. Porquê? Porque é apenas instrumental etéreo. Beijos para os 8ters.

(Pedimos a um dos redatores mais experientes para escrever isto e ele decidiu voltar ao seu auge nos anos dois mil. A equipa compromete-se a ser mais profissional.) 

7 – DOPESICK

“DOPESICK” é fruto de outra colaboração, desta vez com Fin Power, vocalista dos STONE, uma banda de Liverpool que mistura punk e rock de garagem com eletrónica.

Considerado um dos temas mais “calmos” no álbum, leva-nos numa viagem com um tom psicadélico por uma mistura de sentimentos depressivos, de aceitação deste estado (“I am getting high on feeling low”), mas também de vontade de o mudar (“I love the way down, I want the way out”).

Por volta do minuto 2:20, antes do solo de guitarra, são introduzidas mais sonoridades eletrónicas, possivelmente características da música de STONE (sim, a equipa está a fazer uma avaliação sem nunca ter ouvido esta banda).

But the loneliest place in the world’s your mind/ I want to set the world on fire but from where can we watch it burn?

8 – DOWN

“DOWN” resulta também de uma colaboração, desta vez com os seus conterrâneos Malevolence. Esta equipa gostaria de saber qual a fórmula mágica de Sheffield para existirem tantas bandas vindas desta cidade, como a dupla Wargasm (UK) e os também já referidos Bring Me The Horizon. 

Esta faixa começa com algo que se assemelha ao som de uma sirene, como se preparasse o ouvinte para o que aí vem: uma mistura da loucura e qualidade made in Sheffield. A música continua, utilizando a fórmula a que os fãs estão habituados (descrita em “RAINBOWS”), até ao minuto 3:20, quando Alex Taylor entra em cena. E aqui deixamos algum suspense.

A loucura transparece no vídeo, dirigido pela banda, que na verdade é uma montagem composta por 1175 fotografias, que envolvem 15 litros de tinta, 7 latas de tinta em spray, 1 caixa de fogo de artifício e 2 extintores. 

“I’m addicted to the pain/ And so are you/ A love that’s scorned (…) If time won’t heal us, destroy me while you have the chance/ Three strikes for the compliant, no silent ignorance”

9 – TO THE FLOWERS

A nona música é, para a nossa equipa, a mais tocante de todo o álbum. Apesar de inicialmente não terem a apreciado, achando que seria pouco impactante no resto do álbum, rapidamente entenderam que o seu primeiro julgamento estava completamente errado. 

“TO THE FLOWERS” não só tem uma letra lindíssima, como é dona do melhor riff do álbum (quem sabe do ano). Sabemos que já o fizemos diversas vezes, no entanto não é possível não realçar o fantástico trabalho de Sean Long e recomendar que vejam “To The Flowers – Official Guitar Run Through”, para ouvirem e verem a beleza desta sonoridade, conseguida à custa de mãos e pés. (Sean Long, os redatores vêm por este meio pedir-te em casamento)

Não vamos estragar a surpresa, esta é daquelas que têm mesmo de ouvir.

Sobre o videoclipe, também dirigido pela banda, só podemos dizer que aconselhamos a visualização desta obra de arte, mas que estejam preparados para derramar uma lágrima.

I miss the optimist who told me I need nothing/ Who said the consequence was equal to the moment/ I wish for the start while I pray for the end/ Let’s take it all for granted, I know nothing’s gonna change at all

(A decisão de uma passagem desta música levou a desentendimentos na redação. Retomaremos as avaliações dentro de momentos)

10 – OUT OF THE BLUE

Com um instrumental a pedir inspiração a Linkin Park, em que quase conseguimos imaginar o trabalho de Mr. Hanh, “OUT OF THE BLUE”, dá uma oportunidade ao ouvinte de se recompor após a carga emocional de “TO THE FLOWERS”, como se precisasse destes 3 minutos para conseguir terminar a viagem.

11 – ENEMY MENTALITY

Após restabelecida a paz interior com “OUT OF THE BLUE”, “ENEMY MENTALITY” volta a reviver as influências de nu metal, apesar de não ser propriamente memorável (talvez por comparação com “TO THE FLOWERS”). 

Se os ouvintes estivessem ainda perdidos nos seus pensamentos, por volta do minuto 3:25, surge uma sonoridade quase tribal que culmina num novo momento de eletrónica, como se mostrasse que a viagem ainda não terminou. Ainda há inimigos para combater.

And I know what I said/ But the damage is done/ Cuts like a fault line/ Straight to the nervous system/ Can you see the world is falling out of love with us?/ Misled minds, made up mine/ Now reap the consequence

12- RADICAL HATRED/RADICAL LOVE

É com “RADICAL HATRED/RADICAL LOVE” que a banda se despede; este tom de despedida está presente desde o início da música, com um instrumental quase melancólico, onde podemos identificar influências, muito subtis, de Linkin Park, e atinge o seu primeiro máximo nos refrões, com as guitarras acústicas e violinos.

Sensivelmente a meio da música, os violinos e guitarras acústicas deixam de ser exclusivos dos refrões, passando a acompanhar a voz de Loz Taylor sempre, quase a confirmar, que sim, o fim é aqui.

I know that I’m supposed to hate you/ But I don’t/ I know that you’re supposed to hate me too/ But you won’t/ Don’t say you’ll hold on if you’re letting go/ When all’s said and done, the hurt is half the fun

PS: Como ponto negativo, apontamos a falta de coesão do álbum em termos de transições entre as faixas. Adequado a fãs de Architects, Bring Me The Horizon, Linkin Park, metalcore, metal alternativo e nu metal.

Referências

[1] SELF HELL- The album story [Acedido a 31 de março de 2024]

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