Autoria: Ângela Rodrigues (LEFT)
A 24 de maio, os Sheffieldianos, Sheffieldienses, pronto, a banda de Sheffield, Bring Me The Horizon lançaram o seu oitavo álbum POST HUMAN: NeX gEn, anteriormente com lançamento planeado para 23 de setembro de 2023. Produzido entre outros pelo vocalista Oliver Sykes, é o último a contar com a participação de Jordan Fish, após este ter deixado a banda no final de 2023.
Este álbum seria a continuação do EP POST HUMAN: SURVIVAL HORROR, lançado em 2020, em plena pandemia, sim, o título é por causa disso [1]. Para quem possa não conhecer a banda, depois deste (excelente) EP, as expectativas estavam altas; os fãs tinham ficado desanimados com o rumo tomado no sétimo álbum (amo, é mesmo o nome do álbum), enfim, gatekeepers habituais, ouvem algo que não é só gritos e desatam a chorar “MaS iStO nÃo É mEtAL”. Como irão ver, este poderá ser o nome de uma das próximas músicas da banda, assim que o nosso brasileiro Sykes dominar o português, ele gosta de usar assim variações de maiúsculas e minúsculas.
Citando a única coisa dita na 1ª faixa do álbum, “[ost] dreamseeker”: “Let’s begin”.
NeX GEn parece levar-nos numa viagem por uma série de relações (tóxicas) vividas por Oliver Sykes, não sendo sempre fácil compreender e distinguir a quem são as letras dirigidas. “YOUtopia” começa por apresentar uma visão autocentrada e semi-positivista da vida, mostrando a vontade do vocalista em melhorar e atingir uma melhor versão de si, quase utópica (percebem, daí o título “YOUtopia”), apesar de estar ciente do longo caminho pela frente “There’s a place I wanna take you/ But I’m not quite there myself”. Talvez seja o ponto de partida para explicar todas as relações tóxicas consigo próprio, mas também para com os fãs, explicadas ao longo das outras faixas.
Quase sem percebermos, passamos para “Kool-Aid” que, numa clara referência ao culto em Jonestown, apresenta algo que poderia ser uma conversa entre os fãs e a banda, que ora se mostram quase devotos à banda, ora os criticam devido aos diferentes elementos que introduzem nas suas músicas: “My hands around your throat, I love the way you choke/ ‘Cause I am yours and you are mine, I’ll never let you go”.
O sentimento iniciado em “YOUtopia” é novamente retomado, de modo mais realista, em “Top 10 staTues tHat CriEd bloOd”. (Um pequeno aparte para a banda: tentem ser consistentes na utilização de maiúsculas e minúsculas, por favor. Isto assim é difícil para quem tem de escrever os títulos, e, como na redação não temos estagiários, tenho de ser eu a verificar uma série de vezes se não me enganei, etc, etc. Fim do aparte.) Talvez num sentimento demasiado dramático, Sykes reflete sobre os problemas que tem sofrido ao longo da vida e, numa perspetiva emo “ninguém quer saber de mim, estou sozinho no mundo” percebe que tem de ser ele a enfrentá-los. Ao mesmo tempo, talvez numa tentativa de ajudar um ouvinte que se sinta como ele, deixa alguns pensamentos sobre a importância do amor próprio ou sobre a capacidade de superação das adversidades: “‘Cause I know that you’re low/ But once you hit the bottom/ At least there’s nowhere to go but up”. Mas isto tudo sempre com uma mistura de sons típicos de hyperpop, o que se traduz num género de consulta de psicologia num salão de jogos, no espaço, em que o psicólogo é um robot alienígena.
Diminuindo os sons (ligeiramente irritantes) de robots, voltamos a soltar o emo interior, mais Chino Moreno, desta vez numa colaboração inesperada com AURORA (outra que gosta de maiúsculas), onde parece ser abordada novamente uma relação entre o que somos e o que gostaríamos de ser, apesar de estarmos constantemente a ser postos à prova. (Não vou falar mais sobre esta, se quiserem, vão ouvir). “Darkside” parece fundamentar a minha tese sobre a faixa anterior (finalmente escrevo algo com sentido), apresentando um tom mais fatalista sobre as adversidades que nos impedem de atingir o nosso verdadeiro potencial (ui) e momentos em que sentimos que nuncas as seremos capazes de ultrapassar: “I picked the stitches, now I can’t stop bleeding […] Don’t give a fuck if my heart stops beating”.
“A bulleT w/ my namE On”, colaboração com Underoath, parece voltar a trazer o positivismo de top 10 estátuas que choraram sangue (não é tão giro quando traduzimos os títulos das músicas?). Apesar de ter alguma dificuldade em interpretar isto, parece-me novamente uma conversa entre o eu-existente e o eu-ambicionado, onde há uma tentativa de acabar com o primeiro, misturada com duas ou três referências bíblicas que preparam o ouvinte para as faixas seguintes: “For my part in this, God forgive me.”
Em “[ost] (spi)ritual”, somos transportados para a escuridão de uma sala onde, secretamente, se realiza um ritual em que são enumerados, de modo quase impercetível, os nomes de quatro apóstolos, voltando à ideia de culto introduzida em “Kool-Aid”. Como se não tivéssemos acabado de sair de um ritual, mudamos de cenário para algo sério, uma reunião dos narcóticos anónimos, em que Oli Sykes revela que os seus problemas com drogas estão de volta: “Hi, my name’s Oli and I’m an addict”. Um coletivo de vozes, provavelmente a representar o que Oli pensa que os fãs ou mesmo os outros membros da banda diriam, responde acusatoriamente: “Hello, Oli, you fucking knob head, yeah!/ Did you think you had us fooled?” Perante isto, Sykes tenta desculpar-se, apresentando, para além dos seus sentimentos auto repulsivos (e algo suicidas) sobre a recaída, um género de um pedido de desculpas: “And, baby, I know that I told you I was out of the woods/ But I still left a key under the mat for the wolves”.
No que talvez seja uma tentativa de elevar os humores depois das desgraças da música anterior, “LosT” volta ao hyperpop, mas basta atentarmos na primeira parte da letra para compreendermos que o instrumental “animado” contrasta com o cantado: “My dog just died, my friends hate me/ I saw myself on MTV/ And my ego is not my amigo“ (pois, pensavam que nos enganavam). “Ah, mas isto pode ser só o começo, talvez fique mais animado no refrão!” Não, “Why am I this way?/ Stupid medicine not doing anything/ What the hell is fucking wrong with me?” não é mais animador. Acham que o videoclipe é semelhante a uma ala psiquiátrica porquê? Falta de budget?
A música seguinte “sTraNgeRs” não vem acrescentar muito mais às duas faixas anteriores. A relação tóxica Oli-Oli continua, ele sabe que tem de fazer melhor, etc. etc. não há muito mais a dizer.
Num novo momento de viragem, em “R.i.p (duskCOre Remix)”, Sykes mostra as suas intenções de terminar a relação tóxica com algo, talvez personificado como alguém (numa teoria mais rebuscada, pode simbolizar a substituição do eu-existente pelo eu-ambicionado), como o ouvinte se pode deparar em “In a bit, mate, it’s been fun/ In a near-death kind of way/ But it’s people like you, darlin’/ That give humans a bad name”. Terminando em tom de funeral (por favor ouçam esta transição) e mantendo as intenções de cortar as relações com este alguém, surge “AmEN!”, colaboração com Lil Uzi Vert e Daryl Palumbo, que mantém, além do tema, o nível de lírica elevada, como é o caso claro de versos como “suck a dick, heretic”. A repulsa em relação ao alguém com quem Oli quer terminar o contacto é de tal modo grande que é afirmado “I don’t really want me/ As my own enemy”. Não percebo bem como, passamos novamente para uma cerimónia mais religiosa, sendo pedidas orações, santificando e purificando, o que volta a lembrar a ideia de culto introduzida em “Kool-Aid”. Por favor vejam o videoclipe, calculo que tenham sido tomadas muitas drogas para todo o pensamento por trás dos anjos biblicamente corretos que dançam no varão.
Depois do completo (mas bom) devaneio que é “AmEN!”, “[ost] p.u.s.s-e” é claramente propaganda para o ouvinte se juntar a um culto e não é muito mais do que isto: “Quer juntar-se aos milhões de pessoas que já ascenderam à YOUtopia? O que é que seria capaz de fazer para isso?”. A resposta é dada pela faixa seguinte: “DiE4U”. A penúltima música, num tom novamente com influências hyperpop (para disfarçar a seriedade do que é dito, só pode), parece responder à pergunta anterior com “You know that I’d die for, I’d cry for/ You know that I’d die for you/ You know that I’d breathe for, I’d bleed for/ You know that I’d breathe for you”, apesar de Sykes estar ciente da toxicidade do que se demonstra disposto a fazer e da contradição “You know you’re everything I hate/ Wish I could escape/ Did you know I would die for you?”.
Em tom de conclusão, “DIg It” transparece os medos e pensamentos de Oliver que são aligeirados ao longo do álbum. Voltamos aos sentimentos de culpa em relação à recaída (“Sorry that I let you down”), às dificuldades em recuperar (“‘Cause everyone’s too scared to heal”), mas também aos sentimentos contraditórios (“I hate my fucking guts right now”, “And I just don’t know how to deal anymore”, “I don’t wanna lose myself again”). O álbum termina com cerca de um minuto e meio de silêncio entre as palavras de Oli e as de M8 (têm de ouvir para saberem quem é), um silêncio necessário para assimilar e ponderar as palavras de Sykes. Se os dois leitores quiserem saber mais sobre o silêncio, há umas teorias sobre simbolizar estar na “campa” que Oli diz ser cavada ao longo da música e umas coisas assim do género.
CONCRETE JUNGLE [THE OST]
Também no final do mês de maio, os norte-americanos Bad Omens lançaram uma reedição do seu álbum “THE DEATH OF PEACE OF MIND”, que pode ser dividida em três partes, de acordo com as faixas que as separam: BEATDEATH, FINDPEACE e CLEARMIND.
Em BEATDEATH, são apresentadas músicas inéditas, à exceção de “Hedonist”, presente no álbum de estreia, sendo seis das nove colaborações com diferentes artistas, entre os quais Poppy, WARGASM (UK) e HEALTH. FINDPEACE não é mais do que algumas das faixas do aclamado álbum reinventadas por outros artistas, por exemplo uma versão lofi de “Bad Decisions”. E por último, CLEARMIND, consiste nas versões ao vivo de algumas das músicas de “THE DEATH OF PEACE OF MIND” e de “V.A.N”, a colaboração com Poppy que deu muito que falar por Noah Sebastian, vocalista da banda, não participar vocalmente. (Na versão ao vivo, podem ouvi-lo a rugir)
É curioso, “Concrete Jungle”, música que nomeia o novo álbum, não consta nem nas versões ao vivo, nem nas reimaginadas.
Referências:
[1] – Fonte? Não sei, cerca de 87,3% do que escrevo aqui não tem qualquer fonte ou fundamento, sabem que isto não é muito sério.