Entrevista a Isaltino Morais: “Vai haver uma mudança significativa no Taguspark”

Autoria: Ângela Rodrigues (LEFT), João Carranca (MEIC-A)

Oeiras é hoje um dos concelhos mais dinâmicos do país. Para além de ser a casa do campus do Taguspark do Instituto Superior Técnico (IST), é um dos concelhos com estrutura de emprego mais qualificada. O Diferencial sentou-se com Isaltino Morais, Presidente da Câmara de Oeiras, para discutir temas como habitação, transportes e ensino superior, assim como a visão a longo prazo para o concelho.

Habitação e Residências Universitárias

No campo da habitação, que constitui uma das áreas que mais preocupações traz aos jovens nos dias de hoje, o concelho de Oeiras possui um conjunto de programas e iniciativas ativas que têm como objetivo reduzir a escala do problema. 

“Neste momento temos um programa na ordem dos 60 milhões de euros de recuperação de prédios degradados, temos também um programa de 1.900 casas, sendo que 500 delas são destinadas a famílias carenciadas e as outras cerca de 1.400 são destinadas a renda acessível. A essa renda acessível pode concorrer toda a gente.”

O valor da renda acessível pode variar entre os 280€ e os 880€, por mês, e a renda apoiada para famílias carenciadas pode variar entre 8€ e 380€, por mês.

Sobre residências universitárias, Isaltino Morais indica que há três projetos em curso atualmente. Um deles, sediado na Fábrica da Pólvora em Barcarena, envolve a construção de 50 camas para estudantes do polo de Oeiras do Instituto Superior Técnico e estudantes da Universidade Atlântica. Esta residência será “a primeira a arrancar”, seguindo-se depois um projeto de 50 camas no Dafundo e um projeto de 70 camas em Porto Salvo.

O projeto de expansão da atual residência universitária Ramôa Ribeiro, localizada em Porto Salvo, utilizada pelos alunos do campus do Taguspark não é da responsabilidade da Câmara de Oeiras, estando a cargo da Universidade de Lisboa. 

Fotografia tirada e disponibilizada pela Câmara Municipal de Oeiras

Ensino Superior

O atual Presidente da Câmara de Oeiras indica que há, neste momento, vários planos no âmbito da expansão das infraestruturas de ensino superior no concelho, a começar pelo próprio IST. 

“Nós temos terrenos reservados na zona do Taguspark, onde já está o Instituto Superior Técnico, que podem permitir não só a expansão do Técnico, mas também a instalação de novas universidades. Por outro lado, será instalada em Algés a Information Management School, que é uma faculdade da Universidade Nova de Lisboa que está atualmente em Campolide.”

A relocalização deste campus da NOVA deverá ter início em 2025 e prevê-se que todo o processo demore cerca de 2 anos e meio, estando pronto entre até ao início de 2028.

Atualmente a Câmara Municipal de Oeiras irá “investir entre as duas fases [de relocalização] à volta de 6 milhões de euros”. Este investimento de uma câmara municipal no Ensino Superior não é um caso único na Área Metropolitana de Lisboa (AML). Por exemplo, a Câmara Municipal de Cascais cedeu os terrenos para a construção da Nova SBE, enquanto que a Câmara Municipal de Sintra, numa fase inicial, cedeu terrenos para a construção da Faculdade de Medicina da Universidade Católica Portuguesa.

Isaltino Morais admite a hipótese de, com estes projetos e outros, nomeadamente de âmbito internacional, Oeiras ter “3 ou 4 instituições universitárias” num prazo de 10 anos.

“Eu acho que é fundamental criar uma boa articulação entre as instituições universitárias, é óbvio que a Universidade de Lisboa, hoje, e a Universidade NOVA são concorrenciais em muitos aspetos, mas ambas são excelentes universidades.”

O Presidente da Câmara de Oeiras referiu ainda que, na área do Ensino Superior, só em Bolsas de Estudo, já foram investidos 6 milhões de euros: “Em Oeiras, o acesso à universidade é universal, a todos os jovens que em Oeiras terminam o 12º ano, se não tiverem capacidade financeira, a Câmara Municipal paga as propinas”. Foi salientado o aumento do número de bolseiros, que, em 2017, eram apenas 33 e atualmente são 1200

Ainda no campo da Educação, estão previstos investimentos na ordem dos 60 milhões, nos próximos 6 anos.

Parques tecnológicos e perspectivas de mudança do Taguspark

“Vai haver uma mudança significativa no Taguspark”.

O Taguspark surgiu em 1992, “num contexto em que os parques tecnológicos eram ecossistemas que estavam vocacionados para sediar empresas oferecendo àqueles que ali trabalhavam uma qualidade de vida especial, do ponto de vista ambiental, de equipamentos: eram todos construídos 100% vocacionados para a atividade empresarial”. Esta visão fazia sentido com as necessidades dos trabalhadores das empresas e os parques tecnológicos como o Taguspark e o Lagoas Park não passavam de “uma espécie de dormitório ao contrário: durante o dia têm muita gente e à noite estão vazios”. Atualmente, o paradigma mudou e atualmente há “outra sensibilidade ambiental, [procura por] bom teatro, bom cinema, bons concertos. Houve uma mudança extraordinária nos últimos 20, 30 anos”. 

De modo a adaptar-se às necessidades dos trabalhadores, nos novos planos para os parques empresariais estão também incluídos planos para habitação e serviços. “O plano do Norte Caxias tem à volta de 60% de escritórios e 40% de habitação. No Taguspark, na segunda fase, que inclui os terrenos junto ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, vamos introduzir a função habitação dentro do parque”. A inclusão de edifícios para habitação e serviços tem como objetivo garantir o fornecimento de serviços essenciais à comunidade. Como explica o presidente da Câmara de Oeiras, “no fundo a ideia é criar condições para que as pessoas estejam a 5, 10 minutos da generalidade dos serviços”.

“Vai haver uma mudança substancial naquilo que é o conceito do parque empresarial, vai passar a haver mais vida, vai passar a haver melhores transportes”.

Fotografia tirada e disponibilizada pela Câmara Municipal de Oeiras

Protocolo com o IST e requalificação do polo de Oeiras

Em 2020, o IST assinou com a câmara de Oeiras um protocolo com vista a melhorar as condições do campus do Taguspark. Um dos projetos previstos neste protocolo é “uma intervenção na ordem dos 7 milhões de euros, que envolve uma intervenção paisagística e algum equipamento desportivo e de lazer”. Sobre ele, o Presidente da Câmara de Oeiras diz que o projeto já está elaborado e o plano será lançar o concurso ainda este ano. Está previsto iniciar-se a primeira fase da obra em 2025. 

Sobre que tipo de infraestrutura desportiva está prevista neste projeto, Isaltino Morais admite que não se tratará de polivalentes ou pavilhões desportivos que possam acomodar desportos coletivos como voleibol, futsal ou basquetebol. “Neste momento todas as infraestruturas previstas estarão a céu aberto. Portanto, não são indoor.”

Não está, no entanto, excluída a hipótese de, no futuro, construir infraestrutura deste tipo próximo do Taguspark. Está a ser equacionado o desenvolvimento de um complexo desportivo na zona, mas que, a ser construído, servirá não só a população escolar de instituições como o IST, mas também clubes desportivos da região e será focado no futebol.

Outro ponto previsto no protocolo é a construção de ciclovias conectadas ao Taguspark. Sobre isso, Isaltino Morais refere que “está tudo em andamento”.

“A ciclovia, neste momento, já vai da Estação de Paço de Arcos até ao Lagoas Park. Agora vai ser levada do Lagoas Park ao Taguspark. Entretanto, arrancou já uma outra ciclovia entre Vila Fria e Leceia que irá ser prolongada de Leceia ao Taguspark. Portanto, será possível ir de Paço de Arcos, à Quinta da Fonte, ao Lagoas Park, ao Taguspark, do Taguspark para Leceia, Leceia-Vila Fria-Porto Salvo, ligando novamente à Estação Paço de Arcos.”

Sobre os compromissos assumidos no protocolo do lado do IST, Isaltino Morais demonstra-se despreocupado:  “O Técnico cumpre sempre.”
Isaltino Morais também refere a importância da existência de cursos que satisfaçam a procura das empresas presentes no concelho, salientando a fábrica de medicamentos biológicos que será instalada em Talaíde, que necessitará de profissionais nas áreas da física, biologia e química, e multinacionais nas áreas dos sistemas de informação, com um grande recrutamento de engenheiros eletrotécnicos e de informática. Quando questionado sobre a sua posição quanto à abertura de mais vagas para o acesso a cursos tecnológicos, o Presidente da Câmara de Oeiras mostra-se favorável.

Olhando para o futuro, quanto à hipótese de expandir a oferta de cursos do polo de Oeiras do IST, Isaltino Morais refere que é algo que depende mais da vontade do próprio IST do que da Câmara Municipal de Oeiras.

“A política da Câmara Municipal traduz-se em atrair instituições universitárias ou em criar melhores condições. Claro que gostaríamos que o Técnico tivesse aqui mais cursos.uando [a construção do polo] começou havia um grande entusiasmo até porque havia financiamento comunitário para fazer a obra. Depois também depende das direções do Técnico. Houve direções que não gostavam muito no Taguspark que achavam que devia estar tudo concentrado na Alameda. Tudo isso cria alguma instabilidade. Quanto mais se apostar no polo do Taguspark, obviamente mais a Câmara Municipal está disponível para investir e naturalmente melhores condições infraestruturais e de oferta serão criadas.”

Isaltino aponta para a presidência de António Cruz Serra, entre 2009 e 2012, como uma fase de maiores “hesitações”. O Presidente da Câmara considera, no entanto, que as fases de instabilidade já foram ultrapassadas e que a relação com a atual direção do IST, encabeçada por Rogério Colaço, é boa.

Fotografia tirada e disponibilizada pela Câmara Municipal de Oeiras

Transportes

Um dos principais problemas apontados tanto ao campus do Taguspark como ao concelho de Oeiras na sua generalidade consiste na falta de oferta de transportes públicos eficientes e, especialmente, na falta de intermodalidade com as redes de transportes de outros concelhos na fronteira como Lisboa, Sintra ou Cascais. A ligação entre o campus da Alameda e o campus do Taguspark atualmente faz-se por via do Shuttle, um autocarro, cujos horários relativamente limitados já foram, no passado, alvos de queixas e críticas por parte dos alunos.

O projeto do antigo SATU (Sistema Automático de Transporte Urbano) está a ser “reciclado” para dar lugar a um sistema de BRT (Bus Rapid Transit), ou seja, um sistema bidirecional de autocarros que circularão em sítio próprio. O percurso previsto para este novo sistema é semelhante ao percurso antigo previsto para o SATU.

O ponto de partida será a estação de Paço de Arcos, passando depois pelo Lagoas Park e também pelo Taguspark.

“Há apenas uma dúvida de se o percurso terminará na estação do Cacém ou de Barcarena.” Independentemente da escolha, passará a haver uma ligação, através de BRT, entre as linhas de Cascais e de Sintra, atravessando duas das maiores zonas empresariais do país. Isaltino Morais garante que a infraestrutura construída no âmbito do antigo SATU “será aproveitada”.

Sobre tempos de viagem, refere que “o tempo de deslocação está a ser estudado para que se faça o percurso do Taguspark à Estação de Paço de Arcos entre 8 a 11 minutos. “ Não há ainda previsões concretas para os tempos totais de viagem entre Paço de Arcos e o destino final na Linha de Sintra.
Em relação à ligação a Lisboa e a outros concelhos, o Presidente da Câmara de Oeiras explica a estratégia do concelho e as maiores dificuldades que existem: “Nós temos consciência que a principal queixa, quer de professores, quer de alunos do Instituto Superior Técnico, é a questão dos transportes. O grande problema que Oeiras tem é que nós temos aqui uma situação única a nível nacional. Saem cerca de 50 mil pessoas de Oeiras para Lisboa todos os dias para trabalhar, mas vêm de Lisboa para Oeiras cerca de 45 mil. Nós temos um saldo negativo relativamente a Lisboa, mas depois temos um saldo positivo relativamente a todos os conselhos da área metropolitana. Quero dizer que vem mais gente de Cascais, de Sintra, da Amadora, de Loures, de Almada, para Oeiras do que daqui para esses concelhos. Os fluxos pendulares entre Oeiras e Lisboa ainda se podem resolver e vão melhorar. Agora, o problema está nas ligações aos outros concelhos, porque aí temos que articular.”

Apesar disto, Isaltino Morais garante que a Câmara fará o possível para colmatar falhas a curto prazo em ligações que estejam menos asseguradas. “Posso garantir que, em função do estudo de procura, que também já foi feito, nós vamos adaptar naturalmente o transporte. E, se necessário, a Câmara Municipal substituir-se à empresa metropolitana de transporte [Carris Metropolitana] ou reforçar-la-à.”

Apelo aos jovens qualificados nas áreas tecnológicas 

Quanto aos jovens formados em áreas tecnológicas, Isaltino Morais ressalta a elevada taxa de empregabilidade e de procura no concelho, e a mudança de paradigma relativamente aos salários.

“[Existe uma] flexibilidade na captação de quadros das empresas que faz com que os ordenados se equiparem e portanto trabalhar em Portugal ou em Silicon Valley ou noutro sítio qualquer, dentro de meia dúzia de anos será a mesma coisa”.

Ainda em relação à dinâmica empresarial dos jovens no concelho de Oeiras, o presidente da Câmara salientou que são gerados 34 mil milhões de euros por ano, sendo que a tendência é crescente. Em termos comparativos, “o Porto gera 18 mil milhões e todo o turismo nacional, que é fundamental do ponto de vista do emprego, gera 25 mil [milhões], cerca de menos 10 mil milhões do que aqui em Oeiras”. Além disso, foi também destacado que “um dos salários médios mais elevados do país é aqui em Oeiras, é onde há o maior número de licenciados, doutorados e investigadores” e que é uma das zonas do país em que “o salário das mulheres é mais próximo ao dos homens”.

Nota: A entrevista foi conduzida em março de 2024

Leave a Reply