Autoria: João Mendes (LEIC)
2022 foi um ano. E eu joguei muitos jogos lançados em 2022. Aqui estão os meus 15 jogos favoritos de 2022, bem como uma estimativa de quanto tempo demoram a “acabar” e o seu preço.
15. Lil Gator Game
4 horas
20 €
Em Lil Gator Game jogas como um pequeno jacaré numa pequena aventura para convencer a tua irmã mais velha, que está a ocupada com um projeto para a faculdade, a vir brincar contigo como faziam quando eram mais pequenos. Antes de tudo, vais ter que encontrar equipamento digno de um herói – uma espada, um escudo e um chapéu – e encontrar novos amigos para se juntarem a um jogo que cobre uma ilha inteira. Será que tudo isto é suficiente para convencê-la?
Em termos de jogabilidade, Lil Gator Game comporta-se como um mini Breath of the Wild: podes explorar esta ilha ao teu ritmo, saltando, escalando, deslizando e derrotando monstros (de cartão). A banda sonora, como tudo neste jogo, é extremamente fofa e varia dinamicamente enquanto exploras a ilha, refletindo o estado de espírito de cada área, até mudando para uma versão mais melancólica quando encontras fantasmas das aventuras que tiveste com a tua irmã.
Lil Gator Game é estupidamente fofo (até o nome é fofo) e é também o jogo mais relaxante desta lista.
14. Scorn
6 horas
40 €
Scorn é um jogo que te obriga a encarar em primeira pessoa puro terror biomecânico. O jogador é levado numa viagem perturbadora por desertos vermelhos e fábricas arruinadas. Com a “ajuda” de um parasita humanóide que cedo no jogo se agarra às tuas costas, vais ter que gerir recursos limitados enquanto monstruosidades te perseguem, e interagir com máquinas de propósito demasiado complexo para simples mentes humanas entenderem, enfiando as tuas mãos em qualquer compartimento vagamente compatível na esperança de atingir algum objetivo vago que nunca é atingido, num final que te deixa com mais perguntas do que respostas.
Scorn transcende os quadros e esculturas de H. R. Giger e Zdzisław Beksiński em que se inspira, explorando a interface entre carne e máquina, criando uma experiência única e nojenta a que estive colado até ter finalmente acabado.
13. Neon White
17 horas
23 €
Neon White é um first-person shooter em que em cada nível tens que matar todos os demónios utilizando armas que podes “descartar” antes de ficarem sem munição para usar uma habilidade especial que varia de arma para arma (por exemplo, a habilidade especial da pistola é fazer um duplo salto) . É um conceito simples, mas onde Neon White se destaca é como empurra o jogador para completar os níveis cada vez mais rápido, utilizando um sistema de mestria, em que à medida que vais completando o nível mais rapidamente vais desbloqueando dicas de atalhos, um playback do teu melhor tempo e uma leaderboard global. Adoro como Neon White torna acessível a experiência de speedrunning, bloqueando deliberadamente mecânicas para não sobrecarregar o jogador até este demonstrar experiência suficiente.
Quanto à história, quanto menos for dito melhor: não é horrível, mas as personagens e as interações entre elas são extremamente irritantes, inspirado-se em tudo o pior que anime e a cultura da internet têm para oferecer, pelo menos oferecendo uma distração para desligar o cérebro e descontrair entre níveis. Mesmo assim, a jogabilidade de Neon White é tão sólida que merece um lugar nesta lista.
12. Teardown
20 horas
20 €
Quase todas as missões de Teardown têm a mesma estrutura – roubar ou destruir certos objetos conectados a um alarme. O jogador tem o tempo que quiser para se preparar e, como todos os níveis deste jogo são completamente destrutíveis, tem à sua disposição várias ferramentas, armas e explosivos para criar um caminho no nível que o deixe chegar aos objetivos o mais rapidamente possível. Depois de o alarme ser acionado, o jogador tem apenas 60 segundos para completar os seus objetivos e fugir.
Teardown é muito leve em termos de história, mas onde este jogo brilha é na expressão criativa que os níveis completamente destrutivos oferecem e na catarse de concretizar um plano complexo e fugir do nível no último momento. Não estava à espera de encontrar em Teardown a melhor tradução de um heist movie para videojogo.
11. Potionomics
30 horas
25 €
Em Potionomics jogas como Sylvia, uma bruxinha acabada de sair da universidade de poções que herda a loja de poções do tio e a sua extensa dívida. Com a ajuda de um mocho muito falador com um chapéu estiloso e os conselhos de negócio dos teus novos amigos, vais ter que arranjar alguma maneira de pagar a tua dívida em 50 dias, ou arriscar perder a alma.
Potionomics é um jogo de gestão de tempo, mas, no seu cerne, é um deck-builder em que constróis um baralho de cartas com os conselhos de negócios que recebes quando melhoras a tua relação com cada uma das personagens. Este baralho depois é usado quando regateias com clientes na tua loja para aumentar o interesse nas tuas poções e, consequentemente, o preço.
É um prazer ver este jogo em movimento: as animações das personagens parecem saídas de um filme da Pixar, são tão expressivas e fofas; e a música, tocada por uma orquestra ao vivo, traz tanta personalidade a cada uma das personagens. Potionomics é perfeito para quem gosta de um bom puzzle de otimização de tempo e quem sempre sonhou estar profundamente endividado.
10. The Case of the Golden Idol
6 horas
18 €
Em cada um dos seus doze casos interconectados, The Case of the Golden Idol leva o jogador para o momento em que uma pessoa morreu (às vezes mais do que uma) . Inspecionando o cenário, os pertences de cada pessoa e a última coisa que disseram, cabe ao jogador descobrir quem são cada uma das pessoas presentes, descobrir o que é que aconteceu, quem morreu e quem matou, utilizando palavras encontradas no cenário, em objetos ou falados para preencher os espaços em branco do “ecrã do pensamento”.
Com visuais únicos e assombrantes e uma banda sonora perturbadora, The Case of the Golden Idol desafia o jogador não só a desvendar cada um dos seus casos, mas também a sua narrativa abrangente de um ídolo dourado com propriedades mágicas e de pessoas, partidos políticos e cultos dispostos a fazer tudo para o possuírem.
Recomendo avidamente para fãs de The Return of the Obra Dinn.
9. Sifu
14 horas
40 €
Sifu é um beat ‘em up mas há uma melhor maneira de o descrever: um filme de artes marciais jogável. A história é o que é de esperar deste tipo de filmes: encontrar e matar as 5 pessoas responsáveis pela morte do teu pai.
Para simbolizar a sua perpétua busca por vingança, Sifu usa uma mecânica muito interessante: sempre que morres voltas-te logo a levantar rejuvenescido mas exponencialmente mais velho – à medida que envelheces os teus ataques vão ficando cada vez mais fortes mas vais ficando cada vez mais frágil. Quando chegares aos 70 anos tens de começar o nível de novo. O jogo tem 5 níveis e podes começar cada nível com a idade mais baixa com que conseguiste chegar a esse nível o que encoraja a repetir os primeiros níveis para poderes começar os próximos mais novo.
Às vezes o que é mesmo preciso num jogo é uma desculpa para andar à porrada, enquanto te sentes um deus do kung fu, mas atenção, Sifu é difícil: o jogo exige a destreza e perseverança digna de um mestre de artes marciais. Se estiveres disposto/a a jogar Sifu nos seus termos vais encontrar o jogo mais satisfatório de 2022 (atualmente tem opções de dificuldade portanto deve estar mais acessível) .
8. Who’s Lila?
5 horas
10 €
Hoje é um dia muito especial na vida de William porque uma rapariga da tua escola, Tanya Kennedy, desapareceu e, de acordo com os teus amigos, tu foste a última pessoa a vê-la, mas tu sabes que não lhe fizeste nada, certo, William?
Who’s Lila? é um jogo point-and-click em que em vez de escolheres opções de diálogo para avançar a história, tens que manipular os músculos da tua cara manualmente para exprimir a emoção que achares mais apropriada.
Adoro como o jogo tem um espaço específico no ecrã para a apresentar a cara da pessoa que está a falar e que mesmo quando não estás em diálogo tens sempre o William a olhar para ti e como os músculos dele se movem sozinhos quando estás a tentar fazer uma cara, o que torna sempre impossível fazeres uma expressão que pareça minimamente humana.
Inspirado nos filmes de David Lynch, Who’s Lila? é um jogo muito perturbador que explora quem tu és, em que é que consiste a consciência e o que vive por detrás da máscara.
7. I was a Teenage Exocolonist
10 horas
25 €
I was a Teenage Exocolonist é um jogo extremamente solarpunk em que jogas como um membro da primeira geração de crianças nascidas fora da Terra ao longo dos 10 primeiros anos da primeira colónia extrasolar humana desde os teus 10 aos teus 20 anos de idade. Tens estes 10 anos para assegurar a segurança da colónia e dos teus entes queridos, divertires-te com os teus amigos e encontrar a tua vocação enquanto és assolado com visões de possíveis futuros.
No início de cada mês tens que escolher em que é que te vais focar durante esse tempo para subir as skills associadas (por exemplo, ir a aulas de engenharia para subir engineering e reasoning) pois certas ações estão bloqueadas se não tiveres uma certa skill suficientemente alta (para teres aulas de engenharia primeiro precisas de ter pelo menos 5 de reasoning). Ao longo do jogo também vais “colecionando” memórias marcantes que podem ser usadas em desafios como cartas num minijogo parecido com póquer.
I was a Teenage Exocolonist é o único jogo desta lista que eu comecei do início logo depois de ter acabado e por uma boa razão – quando voltas a jogar, como a tua personagem retém algumas das suas memórias, podes usar esse conhecimento para mudar o curso da história e evitar a maior parte dos desastres. Nunca soube tão bem jogar um jogo pela 2ª vez.
6. Pentiment
19 horas
20 €
Pentiment é um jogo de investigação e mistério que se passa durante o século XVI nos alpes bávaros numa altura atribulada da história do Sacro Império Romano-Germânico em que a invenção da imprensa prolifera novas ideais no povo e as scriptoria dos mosteiros, onde até aí grande parte dos manuscritos eram transcritos, começam-se a extinguir. Jogas como um artista chamado Andreas Maler que está a trabalhar na sua obra-prima no sciptorium da abadia de Kiersau e que se vê envolvido na investigação de um assassinato para salvar a vida de um amigo, suspeito do homicídio. Infelizmente não há tempo para seguir todas as linhas de investigação visto que tens apenas 3 dias para encontrar um suspeito plausível – vais deixar que tua perceção enviesada dos acontecimentos dite a história desta abadia e da vila vizinha de Tassing?
Pentiment significa a “reemergência de uma imagem que foi pintada por cima numa pintura” e tem origem na palavra italiana pentimento, arrependimento. Com visuais magníficos inspirados nas ilustrações da época, Pentiment é um jogo de histórias pintadas por cima e de uma vida de arrependimentos.
5. Immortality
10 horas
17 €
Em 1999, uma atriz chamada Marissa Marcel desaparece misteriosamente durante as filmagens do seu 3º filme: Two of Everything. Em 2022, é lançada uma coletânea de pedaços de filmagens, entrevistas e behind the scenes dos três filmes nunca antes lançados em que Marissa participou intitulado Immortality para finalmente responder à questão – O que é que aconteceu a Marissa Marcel?
A jogabilidade de Immortality é muito simples, consiste apenas em carregar em elementos do cenário para fazer match cut para encontrar outra cena que contenha esse elemento. À medida que vais jogando vais-te começar a deparar com elementos mais sinistros, sons estranhos e filmagens sobrepostas e, com sorte e alguma atenção, encontrar as cenas secretas para ver o que se passa por detrás da cortina, a história dentro da história.
É interessante como foi preciso um videojogo para eu verdadeiramente apreciar todo o trabalho que que implica a produção de um filme. Immortality começa como uma simples celebração do cinema com três estilos diferentes de cinematografia e gradualmente transforma-se numa história sobre o custo da arte, a relação entre artista e visualizador/jogador e a única maneira de atingir verdadeira imortalidade.
Recomendo jogar este jogo com comando (sim, a sério).
4. Elden Ring
100 horas
60 €
Olha, um jogo que eu conheço! Elden Ring é um jogo de action rpg em que jogas como um Tarnished chamado de volta para as Lands Between depois de ser exilado para reparar o titular Elden Ring e se tornar no novo Elden Lord.
Não há muitos jogos que conseguem incutir no jogador uma alegria tão grande na exploração de um mundo novo. Sem mini-mapas, linhas ou setinhas para seguir; só tu e a tua curiosidade num mapa que parece tão grande durante as tuas primeiras horas em Limgrave e que nunca pára de aumentar. Não é por nenhuma razão que um dos meus momentos favoritos em jogos nos últimos tempos foi uma certa viagem de elevador em Limgrave…
Mas não é só no open world que Elden Ring se destaca; as legacy dungeons, como o material promocional do jogo gosta de as chamar, oferecem algumas das áreas com o melhor design que a FromSoftware já produziu, Leyndell sendo a minha favorita alguma vez criada por esta equipa.
Elden Ring pode não ser tão focado como os seus antecessores e a reutilização de conteúdo pode não lhe fazer muitos favores, mas sem dúvida que merece todos os elogios que tem vindo a receber.
3. Signalis
10 horas
20 €
Em Signalis jogas como Elster, uma Replika, andróides feitos para replicar humanos que herdam as idiossincrasias dos humanos em que foram baseados, por exemplo um desejo compulsivo de ouvir um tipo específico de música, e que enlouquecem quando as suas idiossincrasias não são satisfeitas. Elster acorda depois da nave em que passou as últimas centenas de anos à procura de um planeta apto para colonizar faz uma aterragem de emergência num planeta desconhecido e a sua única colega a bordo, Ariane, desaparece inexplicavelmente. À medida que desces pelas profundezas duma colónia mineira desesperadamente à procura de Ariane e a tua sanidade gradualmente deteriora, vais ter que gerir um espaço de inventário limitado, lutando ou evitando Replikas enlouquecidas, resolvendo puzzles crípticos enquanto realidade e sonho se interligam e memórias de outra vida vêm à superfície.
Signalis é o jogo com o leque de influências mais variado que eu alguma vez joguei – desde videojogos, a anime, pinturas, filmes e literatura – tira um pouco de muitos sítios criando a sua própria identidade, um sucessor legítimo das raízes do survival horror do virar do século com estilo e substância.
2. Tunic
16 horas
29 €
Tunic é um jogo de aventura e ação isométrico inspirado nos primeiros The Legend of Zelda em que jogas como uma raposa fofinha que acorda numa ilha misteriosa repleta de segredos para descobrir. No entanto, uma coisa que a tua raposinha vai encontrar muito cedo no jogo é uma página de um livro sagrado, que parece ser o manual do jogo que estás a jogar, escrito nalgumas partes numa língua que consegues perceber (português, inglês, etc.) mas a maior parte escrito numa língua rúnica proveniente deste mundo, com alguns rabiscos extra feitos nas margens das folhas pelo seu antigo dono.
É isto que torna Tunic num jogo tão único: enquanto colecionas as ferramentas e as chaves que já se espera de um jogo destes, vais também colecionando as páginas do manual, decifrando o seu conteúdo a partir das imagens e do que consegues ler, descobrindo novas maneiras de interagir com o jogo que estiveram sempre disponíveis mas que não sabias que existiam.
Adoro como emula a minha experiência de infância, quando não sabia inglês, a tentar perceber o que é que tinha de fazer num jogo com a ajuda do manual. A banda sonora, composta por um casal (que fofo), espelha perfeitamente estes sentimentos com uma sonoridade etérea e estranhamente nostálgica.
1. Citizen Sleeper
9 horas
20 €
Em Citizen Sleeper jogas como um Sleeper, uma cópia de um ser humano vendida pelo próprio a uma empresa e inserida num corpo artificial para servir como mão-de-obra escrava. O jogo começa com a tua personagem a fugir desta empresa e a chegar a uma estação espacial arruinada onde passarás o resto do jogo. Com o pouco tempo que tens terás que escapar à deteção da empresa que te quer de volta, criar amizades e tentar sobreviver, uma tarefa que se torna mais complicada do que pode parecer, pois o teu corpo não foi feito para sobreviver longe dos teus donos…
Citizen Sleeper funciona à volta de skill checks, ou seja, quando fazes alguma ação tens que somar a tua proficiência nesse tipo de ações com o valor aleatório de um dado (neste caso de 6 lados). No entanto, todos os dados que podes usar num dia são lançados no início desse dia ao contrário de ser no momento da ação, que é o que normalmente acontece em jogos com sistemas deste tipo; tu tens depois liberdade para escolher em que ações utilizas cada dado. Esta simples e engenhosa mudança elimina a frustração com a aleatoriedade que muitos role-playing games tendem a causar.
É impressionante como Citizen Sleeper fez-me importar tanto com este mundo e os seus habitantes, tendo em conta o ponto de vista completamente afastado da ação que o jogador tem. É a escrita extremamente evocativa, o sound design e a banda sonora que soa ao mesmo tempo metálica e fria, quente e aconchegante que preenchem os espaços em falta na imaginação. Este jogo é tanto sobre a procura de significado num mundo sem sentido como sobre a felicidade na monotonia da rotina e dos pequenos momentos. Citizen Sleeper é um jogo incrivelmente vivo, tem a minha banda sonora favorita de 2022 e, claro, é também o meu jogo favorito de 2022.
Que a vida seja longa e haja tempo para jogar!