Autoria: António Luciano (MEMec)
Perante uma vela que não ardia,
Havia quem desistia,
Mas tu não.
Tu sentiste a cinza do perfume,
Tu viste um mundo desfazer-se em lume,
Por um rastilho intacto na rama,
Sem clarão,
Sem rubro,
Sem chama.
E enlevaste no pressentimento,
De que a vela não arde pela química,
A vela arde por encantamento.
Então, procuraste os sábios, os magos, os eruditos, os escritores, …
E procuraste os poetas,
E procuraste os bispos,
E procuraste os filósofos,
E procuraste os músicos,
Foste até ao mais recôndito dos tutores,
Rogaste todas as suas orações,
E as orações que ninguém roga.
Cantaste todas as suas canções,
E as canções que ninguém canta.
E assim o teu temor se inflama,
Sem luz,
Sem calor,
Sem brama.
E acreditaste no sentimento,
De que se a vela não arde por obra de ninguém,
Só arde por teu encantamento.
Então, tentaste zéjel, rondelet, seguidilla e chant royal…
E tentaste glosas,
E tentaste odes,
E tentaste sonetos,
E tentaste elegias,
Foste até ao madrigal,
Tu tentaste todas as formas que sabias,
Da canónica à mais profana,
Em todos os tons, em todas melodias,
Poliste a tua voz até um silvo,
Numa nota afónica,
Sem volume,
Sem métrica,
Sem flama.
Pois perante uma vela que não ardia,
Havia quem tivesse a epifania,
Mas tu não.