Autoria: Filipe Valquaresma (LEAer) e Miguel Laurito (LEE)
Enquanto candidato único, o professor Rogério Colaço tem motivos para se sentir confiante quanto à sua eleição como presidente do IST. Resta, no entanto, saber se a pauta indicará que passou com 20 ou com nota mínima, dependendo da sua aceitação por parte da Escola e respetivos representantes nos órgãos competentes. Neste artigo, traçamos brevemente o perfil do candidato e analisamos a sua candidatura, bem como a audição à Assembleia de Escola aberta à comunidade no passado dia 22 de novembro, com especial foco na perspetiva dos estudantes.
É sabido desde o dia 8 de novembro que o atual presidente do IST, professor Rogério Colaço, é o único candidato às eleições para presidente para o quadriénio 2024-2027, tal como noticiou o Diferencial.
Rogério Colaço nasceu em Soure, Portugal, no ano de 1968. O seu percurso académico, que se desenrolou inteiramente no IST, tem início em 1986, tendo-se licenciado em Engenharia Metalúrgica e de Materiais em 1991. Obteve o doutoramento e agregação em 2002 e em 2012, respetivamente. É professor catedrático do Departamento de Engenharia Mecânica (DEM) desde 2014.
Conta com vários anos de experiência em cargos de gestão académicos. Entre 2005 e 2008 foi coordenador da Licenciatura em Engenharia de Materiais. Em 2009, tomou posse como membro do Conselho de Gestão do IST, sob a presidência de António Cruz Serra, enquanto responsável pelos Assuntos Académicos do IST durante os quatro anos seguintes. Em 2013 tomou posse como Vice-Presidente do IST para os Assuntos Administrativos e Financeiros.
Foi eleito membro do Senado da Universidade de Lisboa, entre 2013 e 2016.
Foi, entre janeiro de 2015 e dezembro de 2019, coordenador da área científica de Projeto Mecânico e Materiais Estruturais do Departamento de Engenharia Mecânica do IST. Foi membro do Conselho de Escola do IST entre janeiro de 2016 e setembro de 2019, altura em que solicitou a demissão para submeter a sua candidatura à presidência do IST. Tendo sido eleito, tomou posse no início de 2020, e recandidata-se agora a um segundo mandato.
O atual presidente do IST apresenta a sua candidatura sob o mote “Todos Somos Técnico: um compromisso com o futuro”. Ao lema de há 4 anos, “Todos Somos Técnico”, o candidato acrescenta “um compromisso com o futuro”, que assume perante a comunidade IST como forma de combater a habitual “tentação de um candidato incumbente” em debruçar-se excessivamente sobre o passado.
A audição à Assembleia de Escola do passado dia 22 foi aberta ao público, constituindo assim uma oportunidade para que qualquer membro da comunidade Técnico pudesse assistir à apresentação da candidatura e colocar uma questão ao candidato.
Ao longo dos 30 minutos de apresentação e 90 de discussão, Rogério Colaço abordou temas como a propina, a modernização administrativa e digitalização, a qualidade e os métodos do ensino, o regime fundacional, e a independência financeira.
Motivação e valores
Iniciando a apresentação pela sua motivação, Rogério Colaço afirma ter apresentado candidatura por considerar que reúne “as condições, a experiência, a competência, e a aceitação pela comunidade”, tal como consta no seu documento de candidatura.
Segundo Rogério Colaço, a sua candidatura está condicionada pelo Plano Estratégico 2030 (PE2030), aprovado recentemente. Na sua ótica, o Presidente, enquanto órgão estatutário, é uma das figuras principais na promoção do cumprimento deste plano, assumindo para si esta “responsabilização” pela sua concretização.
Segundo o plano eleitoral, por forma a fazer com que o Técnico se torne “uma escola de Engenharia, Ciência e Arquitetura líder na Europa”, o Técnico deve atingir cinco grandes objetivos:
- Melhorar as condições de estudo, trabalho e desenvolvimento de carreira de toda a comunidade do IST (…).
- Adequar o seu ensino (…) [às] profundas mudanças tecnológicas e sociais que atualmente vivemos (…).
- Reforçar e amplificar as condições para a prossecução da investigação no IST ao mais alto nível (…).
- Abrir o Técnico à sociedade e ao tecido económico e empresarial, quer através da promoção da investigação (…) e dos projetos desenvolvidos pelos núcleos de estudantes, quer através da rede de parceiros do IST (…).
- Dar continuidade ao plano de investimento na infraestrutura do IST, (…) modernizando-a e (…) tornando-a mais sustentável.
Quanto aos valores norteadores da sua candidatura, o candidato “ousou” algumas afirmações mais corajosas, talvez por, segundo o próprio, falar de uma posição de maior conforto derivada de ser candidato único.
A cultura do Técnico, bem identificável, assenta em alguns princípios basilares, segundo escreve o candidato:
- Cada um dos membros da comunidade do IST deve pautar a sua atuação pelos mais elevados padrões éticos, de profissionalismo e de civismo (…).
- O Técnico é uma instituição plural, abrangente, multicultural, que não discrimina nenhum dos seus membros (…).
- O Técnico reconhece a necessidade de promover o talento feminino (…) no sentido de diminuir o enviesamento ainda existente (…).
- A cultura do Técnico deve contribuir para o desenvolvimento de pensamento crítico na investigação, no ensino e na participação cívica (…).
- O Técnico deve procurar a excelência, (…) empenhando-se no progresso da Escola e da sociedade (…).
- O Técnico deve promover um ambiente que estimule a colaboração (…).
- O Técnico deve promover o bem-estar em toda a comunidade (…).
De entre estes, o candidato dedicou uma maior atenção no princípio da igualdade de género. Segundo Rogério Colaço, numa escola onde apenas 20% são mulheres, significa que “ainda há outros 30% da população a que não estamos a conseguir chegar”. Além desse motivo há um outro, “não tão evidente”, mas talvez mais importante: além de garantir um maior equilíbrio entre quantidade de homens e mulheres, esta meta permitiria também alcançar uma escola melhor gerida, por contar com mulheres em posições de liderança, além de diminuir os riscos de corrupção e de decisões machistas.
Ensino e pedagogia
O candidato defende que acabou a altura em que se podia ensinar matérias dos séculos XVIII ou XIX com pedagogia do século XX. Agora, em 2023, “tudo mudou”, e o ensino também tem de mudar.
Desde a sua implementação no ano letivo 2021/2022, tem havido um alargado debate sobre o novo Modelo de Ensino e Práticas Pedagógicas, mais conhecido pelo acrónimo MEPP. É portanto normal que este tenha sido um tema durante a audição: afirmando haver argumentos apaixonados de ambos os lados da discussão, a favor ou contra este novo MEPP, Rogério Colaço acusa que estes não são suportados por literatura científica, tratando-se maioritariamente de um debate baseado em “convicções”.
Acrescenta ainda a sua opinião enquanto docente, tendo este semestre voltado a lecionar após alguns anos afastado de funções letivas em virtude do cargo que ocupa. Enquanto professor responsável por Tribologia, do mestrado em Engenharia Mecânica, o candidato mostra-se favorável à redução de horas de contacto, opinando que “o que havia antes era uma aberração, [esta quantidade de horas de contacto] não se via em mais lado nenhum”. Afirma também que a qualidade do seu ensino melhorou significativamente pelo facto de poder ter o auxílio de Teaching Assistants (TAs).
Sobre a aceitação do novo MEPP por parte da comunidade estudantil, o candidato desafiou David Ferreira, membro da Assembleia de Escola eleito pelos estudantes e também presidente da Mesa da Assembleia Geral de Alunos, da AEIST, a que a Associação dos Estudantes voltasse a promover um novo referendo, idêntico ao realizado no passado mês de Abril. “Seria interessante”, segundo o candidato, perceber se (e como) mudou a opinião dos estudantes volvido um ano, prometendo “todo o apoio” para que tal se realizasse.
No seu documento de candidatura, e no sentido de dar cumprimento ao Plano Estratégico 2030 recentemente aprovado, é relevado o papel dos Teaching Assistants na melhoria da qualidade do ensino. Concretamente, menciona-se o ter já sido ultrapassada a meta de 1:2 para o rácio entre TAs e docentes de carreira até 2024, almejando que no próximo mandato este rácio se aproxime a 1 TA por docente de carreira. Confrontado com a questão sobre se a melhoria na qualidade do ensino passa pela aposta na contratação de TAs, Rogério Colaço não tem dúvidas de que sim.
Propina e financiamento
Sobre a propina, o candidato afirma ser frontalmente contra o atual estado de congelamento, tal como já havia manifestado em declarações ao jornal ECO, apelando à coragem política do governo para que o discutisse. Mais recentemente, na tomada de posse dos órgãos sociais da AEIST, ocupou boa parte do seu discurso debruçando-se sobre este tema. Nesse discurso, afirmou que o congelamento da propina permite “silenciar os estudantes”, uma vez que é uma medida temporária que permite desviar as atenções dos verdadeiros problemas dos estudantes e até do país: “numa pequena economia aberta como Portugal, o pior que nos pode acontecer é uma hemorragia de talento como a atual”, defende.
Na audição, reiterou o que tinha dito nessa ocasião, argumentando que este congelamento constitui uma “perpetuação da desregulação atual” do sistema, através do exemplo do ISEG, uma “escola irmã”, onde são cobradas propinas de “cerca de uma ordem de grandeza acima” dos 825€ (mínimos) que são cobrados no Técnico, em cursos de mestrado que são “menos lab-intensive” do que os lecionados no IST.
De facto, segundo as tabelas do ISEG, os valores das propinas de mestrado para alunos dentro da União Europeia variam entre 4950€ e 7900€ para o total dos dois anos do curso, (para os alunos que entram em 2023/2024), com o valor médio situando-se nos 6180€.
Para comparação, no IST, nas mesmas condições, a propina mínima para completar um mestrado de dois anos é de 1650€, enquanto a propina máxima alcança os 5000€, situando-se a média nos 2156,09€.
Quando questionado diretamente sobre que rumo tomariam as propinas de mestrado no IST caso fosse levantado o congelamento, o candidato apontou para uma “convergência” com os valores cobrados noutros cursos de engenharia, usando como exemplo a FEUP, a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (onde são cobradas propinas de 1500€ anuais, i.e. 3000€ totais, na maioria dos seus cursos de mestrado, aos estudantes nacionais e cidadãos da União Europeia).
Na opinião do candidato, o modelo atual que prevê uma “co-responsabilização” pelos encargos da formação no ensino superior entre o Estado e a família é “o mais equitativo”. Para ilustrar o seu argumento, recorre a um exemplo: “Imagine-se dois estudantes acabados de sair do 12º ano. Um deles vai diretamente trabalhar, enquanto o segundo ingressa diretamente no ensino superior”. O primeiro, segundo o candidato, “começa imediatamente a sua vida contributiva, enquanto o segundo permanece ainda alguns anos sem o fazer”.
Durante este período, argumenta, num modelo em que, sem propina, a formação no ensino superior fosse totalmente financiada pelo Estado, o primeiro estaria a financiar integralmente a formação do segundo, o que “não é justo”.
Em relação ao financiamento das Instituições de Ensino Superior, uma vez que a exigência de maior financiamento estatal “não tem dado resultado”, o candidato aponta para uma maior aposta na “diversificação das receitas”, particularmente através da procura de mais doações privadas por parte da comunidade de alumni e de empresas privadas na Rede de Parceiros, passando por uma maior abertura do Técnico ao tecido económico e empresarial.
Em relação à Rede de Parceiros, defende a realização de parcerias como o Técnico Innovation Center, que acredita ser uma fonte de visibilidade e impacto social para o IST, o que acarreta também uma responsabilidade social.
O candidato realça a capacidade do Técnico poder realizar estes grandes empreendimentos “sem se endividar”. De facto, através da ADIST, a Associação Para o Desenvolvimento do IST, existe uma maior flexibilidade em termos financeiros, uma vez que pode contrair dívidas e gerir o seu património de formas que não poderia através do IST como Instituição de Ensino Superior. Estes grandes empreendimentos são, portanto, feitos através de uma estrutura externa, embora ligada ao IST, numa tentativa de contornar algumas limitações impostas pelo regime público.
Saúde Mental
As declarações de Rogério Colaço enquanto presidente fizeram anteriormente manchete no Expresso, onde se lia que, no IST, a “missão é formar engenheiros, não é dar apoio psicológico”. Quando o assunto da audição passou por este tema, o candidato teve oportunidade de explicar à Assembleia e a todos os que ouviam o que pretendia dizer. Segundo o candidato, “apesar de não ser uma obrigação, uma vez que não recebemos financiamento, [o problema da saúde mental no IST] preocupa-nos há anos”.
Neste aspeto, diz Rogério Colaço, o IST foi pioneiro e encontra-se na linha da frente em termos de apoio aos estudantes no quesito da saúde mental, tendo sido inclusivamente a primeira Instituição de Ensino Superior a criar, há 30 anos, um gabinete de apoio psicológico, à semelhança do que havia afirmado no artigo do Expresso.
Autonomia Universitária
Num momento em que se tem alargado o debate sobre a revisão do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), o regime fundacional, e a independência constitucionalmente garantida às universidades, o candidato pôde expôr a sua visão sobre esta temática.
Em primeiro lugar, afirma ainda não se poder comprometer com qualquer tipo de mudança ou de iniciar um processo de revisão estatutária do IST. Isto porque, até terem terminado os trabalhos da comissão de avaliação do RJIES, “não faz sentido” o Técnico estar a produzir alterações à sua organização e funcionamento.
Questionado acerca da sua opinião quanto ao regime privado de contratações, por oposição à contratação em função pública, o candidato não expressa a sua posição como sendo liminarmente a favor de um regime fundacional (de direito privado) ou do que atualmente vigora no IST. Diz, sim, ser genericamente a favor do aumento da autonomia financeira das Instituições de Ensino Superior. Explica que estas são “um excelente exemplo”, uma vez que operam em condições financeiras muito desfavoráveis sem que as contas entrem no vermelho ou que se conheçam casos graves de corrupção, sendo portanto merecedoras de maior autonomia.
De acordo com o candidato e atual presidente, “todos os dias” chegam ao seu gabinete notícias de que “este diretor de obra ou aquele técnico superior saíram”, por motivos salariais. Atualmente, nada mais pode fazer, afirma, do que encolher os ombros: “o ideal seria dizerem-me: «as tabelas salariais são estas, mas é possível ajustar»” à realidade de cada IES. O principal motivo para assim ser é ideológico, aponta o candidato.
Esta flexibilização não passa apenas pela contratação ou por tabelas salariais. De acordo com o próprio, a quantidade de documentos que passam pela secretária do Presidente do IST pode ser medida “ao quilo”. A flexibilização, aponta, passa também por aqui: “toda esta burocracia torna o funcionamento mais lento e menos eficiente”, além de prejudicar a capacidade de arquivo.
Pouco mais de duas horas depois do início da sessão, o candidato cessou o uso da palavra, tendo terminado o tempo destinado para o efeito.
No final da audição, a Assembleia de Escola aprovou (com 29 votos a favor e 7 votos contra) um parecer favorável à eleição de Rogério Colaço como presidente, declarando que reconhece no candidato “mérito absoluto” para ser presidente do IST. A presidente da Assembleia de Escola, professora Ana Teresa Freitas, convidou o atual presidente a permanecer na sala durante a votação, tendo vários presentes congratulado o candidato após o apuramento dos votos pela Mesa.
O candidato prestou uma segunda audição, desta vez perante o Conselho de Escola, no dia 30 de novembro (sem participação do público). A eleição do presidente, também pelo Conselho de Escola, realiza-se nos dias 19 e 20 de dezembro.
Mais informações sobre o processo eleitoral, incluindo o calendário eleitoral e os documentos que suportam a candidatura do Professor Rogério Colaço, podem ser encontrados no website Eleições.