Deixem os Estudantes Falar

Autoria: Inês Dias (MEMec)

No dia 11 de março de 2025, o governo minoritário da Aliança Democrática caiu, após ter sido rejeitada uma moção de confiança, apresentada no contexto de uma polémica relacionada com o atual Primeiro-Ministro, Luís Montenegro. Caso a moção de confiança tivesse sido aprovada (ou que não houvesse sequer necessidade da existência de uma), o governo atual teria sido viabilizado, assim como o Orçamento de Estado 2025 (OE 25), que tinha sido previamente aceite de forma generalizada no parlamento. Devido a este ‘percalço’, o país ficou dependente, mais uma vez, de novas eleições que se realizaram a dia 18 de maio, para que medidas significativas sejam propostas, aprovadas e aplicadas. O resultado destas eleições foi uma maioria não absoluta do Partido AD, que tomou finalmente posse no dia 5 de junho deste ano.

Até à concreta tomada de ordem dos trabalhos, campanhas e discussões para o próximo OE25 teremos o fim dos trabalhos em parlamento (atividade normalizada terminou no dia 15 de junho, podendo ser prorrogada) e, sem dúvida, muitas outras polémicas pelo meio.

Entretanto… para além de campanhas, discussões, debates e tomadas de posse, o que é que os cidadãos comuns fazem? E o que fazem os estudantes?

As preocupações dos estudantes do ensino superior têm-se mantido consistentes ao longo dos últimos 10 anos, passando pelas áreas-chave da Habitação, Educação, do Ambiente e, relacionada com as mencionadas, da Saúde Mental. Aliás, no passado dia 24 de março, Dia do Estudante, os estudantes portugueses fizeram-se ouvir em Lisboa (indo para as ruas), sobre todas estas áreas.

Situações económicas difíceis que, mesmo com o apoio de bolsas, dificultam o financiamento da vida académica, principalmente para alunos deslocados, levam a que muitos jovens do país optem por não prosseguir com os estudos, desistindo dos mesmos, ou a nem considerarem essa opção como uma hipótese. Para adicionar, a falta de controlo sobre as rendas e contratos de arrendamento (uma vez que as residências continuam a não ser suficientes) leva a que muitos jovens estejam dependentes da oferta externa, que chega a ser por vezes abusiva em termos das condições, do custo e da relação com o senhorio: desde relatos de casas sem quaisquer obras de manutenção, quartos minúsculos que não cumprem com os mínimos impostos por lei, assim como arrendamentos onde pedem o pagamento adiantado de meses de renda , o que se traduz em valores incompatíveis com a realidade da maioria.

Quanto ao tema da Educação, algumas instituições do ensino superior apresentam currículos desatualizados, professores já ‘ultrapassados’, ou em situação precária, e métodos de ensino esgotantes para os alunos. As queixas e as manifestações continuam. Algumas mudanças foram feitas (e.g.: construção da maior residência universitária do país em Lisboa), mas as queixas e manifestações continuam. Não serão esses esforços suficientes, ou talvez seja que a perceção da mudança que fica por parte desses esforços seja insuficiente?

O mesmo se aplica ao Clima e ao Ambiente. A pressão geral que notícias alarmantes do impacto das alterações climáticas, a falta de seriedade e de confiança que rodeiam as políticas aplicadas, assim como a geral inatividade dos líderes europeus, já é considerada como um tipo de stress

Todas estas áreas que surgem como preocupações, trazem ansiedade ao dia a dia do estudante, afetando a performance de estudo dos mesmos, o que também fomenta parte da decisão para a desistência dos estudos.

E toda esta parafernália de condições e stress alimenta o deterioramento geral da Saúde Mental no ensino superior: cerca de 50% dos estudantes universitários, de acordo com um estudo feito pelo Jornal Sol, sentem-se preocupados diariamente.

Caso o OE 25 tivesse sido aprovado, os estudantes do ensino superior poderiam ter recebido diversas benesses, que pretendiam responder a estas queixas e resolver parte dos problemas estruturais mencionados neste artigo. Para as medidas em concreto, recomendo a leitura de um outro artigo do Diferencial: ‘OE 2025 para Jovens: passes gratuitos até aos 23 anos e IRS Jovem até aos 35’

Com base em governos anteriores, a taxa de conclusão das propostas submetidas nos últimos 10 anos está aproximadamente entre os 40 e 60% no final do ano, sendo que depende, por exemplo, da diferença entre maioria absoluta vs. governo minoritário. Teria sido suficiente? Talvez sim, talvez não, mas de qualquer maneira, com a queda e nova reeleição do governo, esperam-se agora novas medidas e, preferencialmente, medidas que abranjam as áreas essenciais da Habitação, Educação e Ambiente (entre outras), que permitam responder às necessidades dos estudantes.

Mas depois em Setembro logo se vê, não é verdade? O povo escolheu os seus representantes democraticamente e espera que estes sejam capazes de pelo menos ajudar a resolver as problemáticas que consideram mais urgentes.

No que toca aos estudantes, a sondagem à boca das urnas (apenas a nível continental) efetuada pela Pitagórica revelou resultados semelhantes ao resultado final das eleições: entre os 18 e os 24 anos, a maioria dos jovens apoiou partidos de Direita (AD – 27%, Chega – 25% e IL – 10%), tendo a Esquerda continuado relevante (PS – 11%), especialmente o partido Livre (10%), enquanto que para a faixa etária dos 25 aos 34 o partido Chega foi a principal escolha (com 32%), enquanto os restantes partidos mencionados se mantiveram semelhantes (AD – 26%, PS –  12%, IL – 11% e Livre – 8%).Em 2022, sondagem idêntica revelou resultados distintos mas com algumas semelhanças: entre os 18 e os 24 anos o PSD foi a principal escolha (29%), seguida do PS (27%), IL (12%), BE (8%), CH (7%) e CDU (4%), respetivamente, enquanto que para a faixa etária dos 25 aos 34 anos PS ultrapassa com 30% dos votos, seguido pelo PSD (26%), CH (10%), IL (10%), BE (5%) e CDU (4%). 

Nas últimas votações, os estudantes têm votado maioritariamente à Direita, mesmo que moderadamente. Nestas eleições, confiaram mais nos partidos de direita. Estará esta ‘viragem’ dos estudante relacionada com, o nível de escolaridade, idade, acesso à informação, e/ou com alguma revolta com os anteriores governos? Apenas se pode ainda especular. Veremos como correm os, esperemos, 4 anos seguintes.

A verdade é que o País precisa de ação. Precisa que ouçam os seus futuros e atuais votantes mais ativos, que irão eventualmente e brevemente entrar no mercado de trabalho e que precisam de motivos para ficar no país que é a nossa casa.

Os estudantes precisam ser ouvidos. Então deixem-nos falar.

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