A quem cabe a diversificação do desporto português para além do futebol masculino?

Autoria: Francisco Ferreira (LEIC-T)

Há demasiados anos que o foco desportivo do país pode ser resumido em duas palavras: Futebol Masculino. Popularmente, diz-se que Portugal se baseia nos 3 F’s: Futebol, Fado e Fátima. Aos poucos, tenta-se sair dessa monotonia, para bem de todos nós. Mas afinal, a quem cabe trazer a atenção dos adeptos para outras modalidades?

Segundo o Instituto Português do Desporto e da Juventude, existem 58 federações desportivas nacionais, algumas com mais financiamento e relevância que outras. Mas o que pode trazer mais igualdade e uma melhor repartição do público entre todas estas instituições? O motor principal de qualquer ramo do entretenimento-  pessoas. Da mesma forma que um artista que não venda bilhetes para o seu concerto de estreia terá dificuldades em conseguir patrocinadores para uma próxima tentativa, também os desportos precisam de adeptos para atrair patrocinadores que possam financiar os eventos e competições.

Clubes de renome, como o Sporting Clube de Portugal e o Sport Lisboa e Benfica, podem ser a solução, puxando a sua massa associativa obtida através do desporto-rei para outras modalidades, mas a expansão destes clubes com alto poder financeiro para competições frequentadas por outros clubes modestos tem também os seus problemas. Como se explica que a equipa de basquetebol masculina dos Leões, quiescente durante 24 anos, tenha sido capaz de vencer a Taça de Portugal na primeira época de regresso e a Liga um ano depois? Ou que a equipa de futebol feminina encarnada tenha obtido uma média de 13 golos por jogo (atingindo um total de 452(!) golos) na sua época de estreia na II Divisão Nacional, batendo todos os recordes existentes e terminando a final de apuramento de campeão com uma vitória de 9-0? Será justo para as outras equipas, que apostaram nas modalidades mais cedo, terem o seu prestígio roubado por monopólios ecléticos? A verdade é que, apesar destes impactos a nível doméstico, as equipas referidas continuam a ter problemas em impor-se a nível europeu, por equipas já cimentadas há muitos anos nos maiores palcos de cada desporto.

Equipa de basquetebol do Sporting Clube de Portugal 18/19. Créditos: FPB, 2019

Equipa de futebol feminina do Sport Lisboa e Benfica 18/19. Créditos: SL Benfica, 2019

 

Mesmo assim, a entrada destes gigantes noutras modalidades, não só traz mais fãs que por si compram bilhetes, atraem patrocinadores e motivam os jogadores, como também dá aos jovens atletas outras alternativas na prática desportiva para além do futebol. A transmissão de desportos variados na televisão volta a dar esperança numa carreira desportiva a uma criança que seria outrora desmotivada pela existência de apenas uma opção no país.

No entanto, atirar a responsabilidade somente para os clubes  em si também está errado. Olhemos para o caso de Jorge Fonseca, atleta de 30 anos nascido em São Tomé e Príncipe, mas que atua por Portugal na categoria de -100kg de Judo. Nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 (realizados em 2021 por questões pandémicas, mas mantendo no seu nome o ano original), o judoca conseguiu uma medalha de bronze e após agradecer ao público português que assistia aos jogos de madrugada e à sua família, deixou algumas críticas: “Esta medalha vou dedicar à Adidas e à Puma, porque me disseram que eu não tinha capacidade para ser representado por elas. Gostava então de perguntar aos dirigentes destas marcas: Sou bicampeão Mundial e 3º nos Jogos olímpicos. Que estatuto preciso mais para merecer um patrocínio?”.

Importa também referir o caso mais recente de 6 atletas jovens do Gimnofrielas ADCSF, que após se qualificarem para o Campeonato do Mundo de Ginástica Acrobática por Grupos de Idade (realizado em Baku, no mês de Março), se viram sem condições económicas para poder representar Portugal no mais alto palco. Foi necessária uma petição criada pelo clube pelo qual competiam para que se pudessem suportar todos os encargos, para poder manter vivo o sonho dos jovens que treinam 6 dias por semana e querem chegar mais alto.

Estes problemas existem em Portugal, mas não são um caso exclusivo do nosso país: tem-se o exemplo recente de Brittney Griner, atleta da WNBA envolvida numa troca de prisioneiros com um traficante de armas russos. Segundo a Associated Press, mesmo após este caso tenso que agravou as relações entre Rússia e os Estados Unidos, 67 das 144 jogadoras da mais importante liga de basquetebol feminino continuarão a jogar simultaneamente nos EUA e no estrangeiro por questões financeiras. 

Ainda sobre o panorama mundial, mas mudando de desporto, a maioria dos portugueses estaria confiante ao responder à pergunta “Quem é o atleta com mais golos marcados a nível de seleções?”. Porém, a resposta Cristiano Ronaldo, com uns respeitosos 118 golos, está aquém da verdade, sendo este (apenas) o 8º atleta com mais golos. Qual a origem da desinformação? O facto de os 7 primeiros lugares serem ocupados por mulheres, com destaque para o primeiro lugar, Christine Sinclair, jogadora canadiana ainda no ativo que acumula uns espantosos 198 golos. 

É necessário um esforço conjunto para mostrar que o desporto é para todos, para apagar o mito de que apenas existe um desporto e para somente um género. É necessário mais financiamento por parte das autoridades competentes, mais esforço das televisões generalistas para trazer o espetáculo das competições às casas dos portugueses. É preciso mais do que tem sido feito. Felizmente, estamos no caminho certo, mas é essencial não perder o foco e continuar a lutar por algo que traga uma vitória a todos nós.

Referências:

[1] Gimnofrielas ADCSF organiza campanha para angariar fundos para jovens atletas (acedido a 9-12-2022)

[2] Adidas reage a Jorge Fonseca (acedido a 10-12-2022)

[3] Nearly Half of WNBA Players Still Playing Overseas (acedido a 10-12-2022)

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