“We are often asked why improve the system that has been ranked as top quality in the world. But the answer is: because the world is changing. We have to think and rethink everything connected to school. We also have to understand that competencies needed in society and in working life have changed.” – Irmeli Halinen, Finnish National Board of Education
Autoria: Mª Inês Xavier, MEBiom (IST)
Os últimos meses do semestre são sempre uma altura crítica para qualquer estudante universitário. Desde projetos, relatórios, frequências e laboratórios, que, mesmo à distância, não deixam de dar o ar da sua graça, somos bombardeados com algo novo e complexo todas as semanas. Afinal tudo o que nos diziam acerca da universidade é verdade: um grau de dificuldade superior e um volume de trabalho muito elevado quando comparado com os outros níveis de ensino. Mas será que este postulado levou à normalização de todo este nível de complexidade e rigidez, ao ponto de não nos questionarmos se poderia ser diferente?
A universidade é um processo tortuoso uma vez que exige adaptação e moldagem a diferentes situações, tornando-se, portanto uma das alturas mais importantes para o nosso crescimento em todos os níveis da vida adulta. São os anos que nos preparam para enfrentar o mundo real: alguns aprendem a viver sozinhos, conhecemos uma panóplia de pessoas dos mais diversos meios sociais, ingressamos em todo o tipo de atividades, e claro, temos que nos adaptar a um método de ensino muito distinto do ensino secundário, cujo objetivo é a preparação para o mundo do trabalho. Mundo este cada vez mais acelerado, onde o tempo se contrai e a impaciência se expande. Assim somos forçados a incluir-nos neste mundo: formatados para saber os conteúdos de forma rápida e eficiente, para depois sermos avaliados, esquecermos o que aprendemos e retermos mais conteúdo, repetindo o ciclo. É privilegiada a memorização e mecanização em detrimento da compreensão e da curiosidade, o que leva a que cadeiras ou conteúdos que podem, numa primeira fase, parecer interessantes, acabem por ser apenas mais uma obrigação, uma vez que não nos é possibilitado mergulhar completamente nesses mesmos conteúdos. O resultado é visível: pouca capacidade de interligação entre os diferentes conteúdos, perda da capacidade de resolução de problemas diferentes dos normalmente apresentados nas frequências e da noção dos conteúdos, não como um contínuo, mas sim como entidades separadas. Tudo isto num curto espaço de tempo, o que nos deixa com pouca disponibilidade para descobrir outras atividades que gostamos e que podem ser igualmente úteis no mundo do trabalho, pois ajudam a desenvolver as tão faladas soft skills, bastante valorizadas como forma de distinção. Aprendemos então a ser máquinas funcionais da sociedade e não seres humanos.
Uma aprendizagem sólida, que sirva como bom fundamento para conteúdos mais complexos, trata-se de um processo moroso, mas que a longo prazo tem um melhor resultado na sedimentação de conteúdos, no desenvolvimento de um gosto genuíno por aquilo que se está a estudar e que poderá levar a um melhor aproveitamento escolar e a uma menor incidência do stress nos estudantes. No entanto é incompatível com um mundo cada vez mais rápido e exigente. O que é que podemos então fazer? Uma das possibilidades que está largamente a ser estudada é a flexibilização dos currículos universitários. Mantendo uma base sólida por forma a não descaracterizar o curso, mas incluindo um conjunto de créditos dedicados a outras unidades curriculares dentro ou fora do âmbito do curso, permitiria aos estudantes descobrir outras áreas de interesse fora da sua área de estudo, algo que não seria de todo tempo perdido.
Regemo-nos pela estrutura de aulas que sempre vigorou durante todas estas décadas e que não acompanhou o desenvolvimento tecnológico. Os professores competem com um inimigo invisível, as redes sociais, pela atenção dos estudantes e é uma batalha difícil de ganhar. Aqui a resignação dos professores poderia dar azo ao dinamismo e talvez usar esse mesmo inimigo para promover atividades dentro da própria aula, de modo a que esta se tornasse mais apelativa e interativa e de forma a que a nossa maior conquista não seja um desenho irónico numa das mesas dos auditórios do Pavilhão Central. Aliás, foram já realizados diversos estudos no âmbito da aprendizagem por interação que comprovam isso mesmo. Faz-se, no entanto, uma salvaguarda aos professores que, para subirem na sua profissão ficam sujeitos à realização de diversos projetos, encurtando o tempo disponível na preparação das aulas.
Outro dos pontos em que também nos podemos focar é a falta de uma componente prática mais exacerbada e próxima da vida real. Passamos vários anos dentro do mesmo curso, fechados na universidade, e nos últimos tempos em casa, sem saber de que forma é que o que aprendemos se aplica à realidade, fora dos ambientes controlados de um laboratório ou simulador, e acabamos por perder aquele fio motivador que nos faz olhar para o que podemos ser no futuro. Aqui, o ensino politécnico, tantas vezes desvalorizado, acaba por talvez ganhar pontos, ao oferecer desde cedo aos seus alunos, estágios obrigatórios que estabelecem uma boa ponte entre o ensino e o mundo do trabalho.
Claro que nós, como alunos, temos também que tentar ao máximo cultivar o interesse na aprendizagem, não desanimando à primeira dificuldade e tentando sempre que possível ver a beleza do conhecimento, do descobrir o porquê das coisas e fenómenos em nosso redor, que muitas vezes escapa e que ainda se torna mais ténue face à metodologia adoptada. A chave para uma boa aprendizagem passa, portanto, pelo fino equilíbrio entre a nossa capacidade de esforço para ultrapassar a dificuldade da incompreensão de algo novo e a forma como o próprio ensino superior nos dá tempo para superar esse mesmo estorvo inicial.
Torna-se assim importante questionar: será que é desta forma que queremos educar as pessoas que vão ter no futuro uma maior responsabilidade no país? Sem capacidade de criatividade e de pensamento próprio? Incapazes de inovar e de se adaptar? Portugal tem uma das instituições de ensino superior mais antigas do mundo, mas não é razão para nos mantermos antiquados e resistentes à mudança.
NOTA 1: A frase citada no início do texto foi escolhida precisamente porque o sistema de ensino finlandês, assente nos valores de cooperação ao invés de competição, no investimento da formação dos professores ao invés da sua precariedade e na diversificação de métodos de ensino, ao invés da standardização, é constantemente visto como um sistema exemplar, ainda que pouco generalizado.
NOTA 2: É também importante referir que o Técnico já se encontra a trabalhar numa nova abordagem curricular, que resolve alguns, ainda que não todos, os problemas que referi acima. Estão disponíveis neste link os documentos com as principais diretivas desta nova reestruturação. O Diferencial procurou também, neste artigo, simplificar e desburocratizar as novas medidas, para aqueles que procuram uma explicação mais direta.
Correção feita a 04/07/2020: Foi realizada uma alteração após a publicação do texto, que referia, por lapso, o sistema de ensino superior de Portugal como o mais antigo do mundo, quando na realidade se trata da Universidade de Tunes, na Tunísia (737). A Universidade mais antiga da Europa é, por sua vez, a de Bolonha (1088).
“Portugal tem a instituição de ensino superior mais antiga do mundo (…)”. Se isto é verdade, então qual é? A Universidade de Coimbra não é mais antiga do que, por exemplo, a de Salamanca e Pádua.
Obrigado pela chamada de atenção; já fizemos a correcção.
A informação de que Portugal tem a universidade mais antiga do mundo é pura invenção, se puderem corrijam.
Obrigado pela chamada de atenção; já fizemos a correcção.
Inspiradora Inês, felizmente a arte não está em suspenso. Há que observar que os melhores ex-alunos do IST não estão dentro dos muros da Alameda.
Hoje importa observar o espaço preparado, para nós e o SARS-CoV-2.
O Prof. Arquiteto Porfírio Pardal Monteiro aprendeu e aplicou as lições do Prof. e Doutor Ricardo Jorge. O mesmo não aconteceu com os seus sobrinhos.
Durante a “Gripe Pneumónica”, injustamente conhecida por “Gripe Espanhola”, a primeira médica de “La Sapienza” ensinou quase em silêncio, através das mãos. Na segurança do ar livre e do sol de Roma e Barcelona.
Esta foto ilustrativa já é de 1932:
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