Autoria: Pedro Lima (MEIC-A)
O rosto denuncia-te a adrenalina
que arde no corpo
e, lávico, comunica com as letras mudas
dos olhos.
Como os créditos de um filme,
sussurra-me o vento,
e havendo palavras, desfá-las o ar,
ao que ficam, perdidas, frases por decifrar.
Parecemos entendidos em cinema,
mas não há fita na bobina.
Entrego-me à noite das pálpebras,
e no abraço do vento sul,
torno a abrir os olhos:
a ponte que nos ligava cortando o céu,
perco-me no que dela nunca se conheceu—
a busca nas águas de um reflexo que é o teu.
Com rapidez se salta para outro tempo,
o teto observando, inabalável,
é inverso do meu sentir.
Talvez pela indolência a que me entrego,
não sei bem dizer.
Tão só, aqui no meu quarto,
lembro-me do que não chegámos a viver
e sinto os ventos da saudade.
A porta leva-me a um museu,
foi onde dançámos pela primeira vez,
como dois pirilampos a luzir num frasco.
É aí que permaneço, no vazio dos teus braços,
tão perto que te consigo beijar a alma.
E, no entanto, não temos lábios,
somos rostos sem nada que dizer.
É então que desperto,
olhar confuso, de novo lembrando
o ruído de rodas sobre carris.
É sentir a realidade sem a ver,
o fruto que colho do pensamento.